“Projeto Origem” mostra na dança a força dos migrantes

O corpo de baile do espetáculo estão bailarinos brasileiros, venezuelanos, haitianos e sírios; a coreografia fala das angústias envolvidas em se recriar num novo território

O espetáculo de dança “Projeto Origem”, estreia para curta temporada gratuita, do dia 1º a 12 de novembro, no Teatro Zé Maria em Curitiba. A obra parte de registros, inscritos e escritos, que pulsam no corpo ao longo da experiência de se recriar em um novo território. A direção e a coreografia são assinadas por Patrícia Machado, os bailarinos são brasileiros, venezuelanos, haitianos e sírios.

“Projeto Origem”

A diretora conta que, a partir de estudos biográficos e ficcionais, o espetáculo também foi criado pelo próprio elenco. Ela buscou o que havia em comum a estas pessoas sem espetacularizar essas narrativas, mas com um olhar para a cena como lugar de mistura. “Ao longo de todo o projeto a preocupação foi conhecer esses artistas e trabalhar a partir do conhecimento de dança, trabalho corporal e desejos artísticos deles. São muitas as diferenças, pois eles têm diferentes origens, com cultura e a própria relação com o corpo bem distintas”, explica Patrícia sobre a proposta de ter bailarinos brasileiros e artistas em situação de migração e refúgio juntos em cena.

“Mundialidade”

O espetáculo de dança inédito, aborda o conceito de “mundialidade” de Edouard Glissant, que investigou o que há de poético nos êxodos humanos. O conceito de comunitário enquanto fazer junto está ao lado da pedagogia de fronteira, com o estético e o ético presentes na necessidade de aprender, criar e inventar uma humanidade que está por vir. 

Migrantes e refugiados 

Para o imigrante venezuelano que vive em Curitiba há quatro anos, Franscisco Rodriguez, conhecer o projeto foi importante para retomar, junto com sua esposa, o contato com a arte e com a dança. “Na Venezuela, eu fazia dança tradicional e folclórica, vontade que surgiu por eu ter uma herança afro-indígena, além de estudar teatro e dramaturgia; desde a imigração me afastei das artes, pois temos que correr atrás de trabalho para sobreviver, e ter a chance de poder trazer toda a minha família para o Brasil”, diz Rodriguez.

A haitiana Cassandre Pierre, ficou sabendo das audições em um grupo de WhatsApp, e viu ali uma oportunidade de ter contato com a dança novamente. “Desde a minha infância, sempre gostei da arte e da música, são ferramentas de expressão corporal e emocional que me ajudam a estabelecer o equilíbrio em meus pensamentos e sentimentos. Estar no espetáculo e poder mostrar a minha relação com a dança de uma maneira autêntica é muito bom”, fala Cassandre.

Origem de Patrícia Machado

O espetáculo é parte de um projeto maior da bailarina, coreógrafa e performer Patrícia Machado, que estuda práticas artísticas com pessoas em situação de deslocamento forçado, como migrantes, refugiados e apátridas. A ideia veio após ela ter passado alguns anos trabalhando em outros países, e sentindo na pele o que é ser uma migrante. 

Patrícia, aos 17 anos de idade, ganhou uma bolsa de estudos em uma companhia de dança em Portugal e morou em diferentes países durante sete anos. Foi a partir dali que a temática do não pertencimento surgiu para ela. 

“Entre um contrato de trabalho de dança e outro, me vi em situação ilegal; ser imigrante durante esse período e me perceber como pessoa ilegal em parte dele, me trouxe incômodos e questionamentos sobre os corpos em trânsito e em situação de deslocamento forçado”, diz a coreógrafa que, ao retornar para o Brasil, passou a trabalhar como voluntária em grupos que recebem imigrantes em Curitiba. 

Foi nessa fase que ela percebeu as práticas performativas como uma ferramenta de pertencimento, mais forte que muitas políticas. “É evidente que existem diferenças entre estar imigrante e estar refugiado, e são inúmeros os motivos que levam uma pessoa a deixar seu país, como guerra civil, catástrofes naturais, conflitos religiosos, entre tantos outros”, finaliza a artista.  

Espetáculo de dança “Projeto Origem”

Do dia 1º a 12 de novembro, terças, quartas, quintas e sextas-feiras, às 20h. Sábados e domingos, duas sessões, às 18h e às 20h, no Teatro Zé Maria (Rua Treze de Maio, 655, São Francisco). Ingressos gratuitos, distribuídos a partir de 1h antes de cada espetáculo. Classificação indicativa livre, com duração de 50 min. Outras informações aqui.

Equipe: Criação e direção de Patrícia Machado; dramaturgia de Laura Haddad; colaboração artística de Ane Adade e Maira Lour; dançado e criado em colaboração por Ane Adade (Brasil), Anamile Bolívar (Venezuela), Cassandre Pierre (Haiti), Francisco Rodriguez Tayupo (Venezuela), Guille (Venezuela); Myria Tokmaji (Síria), Nayara Santos (Brasil), Romec (Brasil), Vitor Rosa (Brasil); cenografia de Fernando Marés; iluminação de Anry Aider; figurinos de Eduardo Giacomini; sonoplastia de Sérgio Justen. 

Projeto realizado com recursos do programa de apoio e incentivo à cultura – Fundação Cultural de Curitiba e da Prefeitura Municipal de Curitiba.

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