Guilherme Weber fala um pouco sobre “Tudo”

Peça do ator e diretor curitibano Guilherme Weber tem pré-estreia no Festival de Curitiba com ingressos esgotados

Estado, arte e religião. Sobrou algo ou seriam essas todas as questões contemporâneas?! “Tudo”, dirigida por Guilherme Weber, leva ao palco três fábulas de moral amargas, que conversam com o nosso tempo ao tornar risíveis os impasses da sociedade.

Assim, a primeira fábula questiona o motivo de todo Estado se tornar burocracia. Em seguida, a segunda pergunta por que a arte se torna negócio. Por fim, a terceira investiga por que qualquer religião se torna superstição. O texto é do argentino Rafael Spregelburg.

A peça tem apresentações na sexta (1º) e no sábado (2), no Festival de Curitiba 2022. Mas está com ingressos esgotados.

Lição de inteligência

Para Weber, a fábula é sedutora. O que se dá por “estar de acordo com um certo arquétipo, um certo pensamento, entre a fábula e uma verdade universal, mas também entre a fábula e a experiência de cada um”, diz o ator e diretor curitibano.

“Não é apenas o conteúdo da história que constitui a sua força, mas também o fato de ser contada no momento certo. É um conto de moralidade popular e também uma lição de inteligência, de justiça e de sagacidade.”

Essencialmente, uma comédia

Weber cita a frase de Gil Vicente – “Rindo se castigam costumes” – para explicar que o espetáculo “é essencialmente uma comédia”. Para ele: “O humor é sempre o melhor caminho, o mais arguto, mais demolidor, mais incorreto e, talvez, o mais duradouro caminho de transformações.” 

O interesse pelo texto de Rafael Spregelburg nasceu da pesquisa sobre dramaturgia latino-americana, que já ocupa um longo tempo da carreira de Weber.

Ele conheceu Spregelburg e depois criou, com Felipe Hirsch, o espetáculo “Antes que a definitiva noite se espalhe em Latinoamérica”, com textos de vários autores sobre o momento obscuro pelo qual passávamos (isso, em 2018). “[Momento] que estamos vivendo ainda, mas que vivíamos naquela época às vésperas da eleição, e o Rafael foi um dos que escreveu um texto especialmente para a gente”, diz Weber. “Ele acabou se tornando um amigo próximo”.

Fantasmas do continente

Weber continuou investigando a obra do argentino e encontrou “Tudo”, de 2009, criada para a comemoração dos 20 anos da queda do Muro de Berlim, na Alemanha. Nasceu a vontade de ressignificar as fábulas apresentadas com um olhar brasileiro. “O Brasil, pelo tamanho e pela complexidade, acaba sempre sendo uma lente de aumento dos fantasmas do continente”, diz. “Às vezes, a gente esquece que somos também latino-americanos.” 

Além da possibilidade de “pensar o continente”, os dramaturgos da América Latina estão conquistando o encenador pela qualidade. “Fazem uma dramaturgia duradoura e incômoda”, explica. “Eles são muito jovens, entre os 40 e 50 anos, e produzem dramaturgia de personagem, o que demanda um talento e uma mão de obra muito sofisticada.” 

Eis as questões

O diretor afirma que os elementos do teatro contemporâneo estão no palco, mas não para tornar o espetáculo mais “pop”. Pois são recursos que “já estão escritos no DNA de dramaturgos, no DNA de quem escreve”. Contudo, as questões em debate fazem da peça algo acessível, são pontos reconhecidos por todos. “Estado, arte, burocracia, religião, superstição são questões da vida de todo mundo”, diz.

A montagem radicaliza sugestões de linguagem do texto, com momentos praticamente desprovidos de cenários e adereços. “Tudo é contado e constituído no e a partir do corpo”, escolha que Weber já testou em sua última direção, na peça “casamento”. “O corpo dos atores é a arena onde o embate acontece, é também um perfume quase clownesco, quase circense, onde esses bufões estão autorizados a demolir valores universais”, diz.

Curadoria e maturidade

Com uma trajetória bem-sucedida, Weber também foi curador do Festival de Curitiba. Sobre atuar, ele afirma que se trata de um prazer: “É muito sedutor estar em cena, fazendo do seu corpo, do seu tempo, da sua metafísica veículo para ideias.” A passagem para a direção veio com a maturidade profissional como possibilidade para mobilizar outros artistas no impulso da criação. “Poder compor, ‘partiturar’ os personagens, junto com os atores é um exercício muito fascinante”, explica. 

Contudo, foi na curadoria que ele diz ter vivido um profundo aprendizado.: “Você trava contato com artistas e define um pensamento que vai afetar uma cidade, deixar uma marca numa cidade.”

A parceria envolvida na atividade permite lidar com artistas próximos e distantes do seu pensamento, segundo Weber. “Os cinco anos em que fiquei como curador do Festival foi um dos momentos mais prazerosos e importantes da minha trajetória e acho que, junto com Márcio Abreu, a gente conseguiu deixar uma marca no Festival e em Curitiba”, diz.

Felipe Hirsch

E, por falar em parceria, o diretor de “Tudo” termina a entrevista falando sobre Felipe Hirsch, com quem trabalhou ininterruptamente por 23 anos. Weber classifica a relação com Hirsch como algo mais forte que uma influência, “é uma comunhão de criação de repertório mesmo”.

Os dois parceiros se encontraram ainda no teatro amador, quando tinham só 16 anos, e definiram seus códigos de trabalho juntos. “A gente conquistou isso junto, a gente conquistou o nosso estilo e a gente conquistou a nossa linguagem, o nosso humor, as ideias com as quais a gente vem trabalhando”, diz. 

Enfim, isso é “Tudo”. 

Festival de Curitiba

Para conferir a programação completa e comprar ingressos on-line, acesse o site oficial do evento (aqui). Também é possível comprar ingressos na bilheteria do Festival de Curitiba, no piso L3 do Shopping Mueller. A programação tem ainda vários espetáculos gratuitos e outros em que você paga o que puder ou quiser.

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