Isolamento social dia 93

Querido diário: no prédio da frente tem uma luz que não apaga. Não sei se é num quarto ou num corredor, mas o abajur dele tá sempre ligado. Inventei razões pra isso:

  • tem uma criança na casa e ela tem medo do escuro;
  • o Feng Shui demanda luz naquele cômodo, senão a energia vital dos moradores será sugada pra outra dimensão;
  • ninguém mora ali, isso tá sempre ligado e a gente só vê de noite;
  • é uma espécie de santuário em homenagem a Copel (é a empresa de energia aqui do estado).

De qualquer maneira, eu a chamo de “janela da Esperança”. Por favor não confundir com “Porta da Esperança”, um antigo programa de televisão em que um milionário humilhava pessoas mais pobres, atendendo seus pedidos quando ele achava empresas que quisessem fazer doações como propaganda no canal.

A “janela da Esperança” é o lugar que nunca apaga. Por que todos nós ficamos todos os dias sonhando com o fim da quarentena, né? Cada papo de vacina, cada especulação sobre um novo remédio, a gente começa a tirar o tênis de correr do armário e vai pra perto da porta, na esperança de que estejamos todos seguros.

O problema de manter luzes acesas é que elas, eventualmente, queimam a lâmpada. Aí vem a escuridão e nela começamos a achar que nunca vai acabar, que estamos fadados, que a cura não virá, se vier tanto faz porque não importa. Nós sabemos o que há na escuridão, porque ela existe independentemente de nós. A sombra sobre nossas cabeças está sempre ali, rondando, à espera da nossa lâmpada queimar.

Cada um de nós tem que preservar pelo menos uma “janela da Esperança” por quadra, pra inspirar nossos vizinhos e que eles continuem a acreditar no futuro da comunidade. Caso a lâmpada queime, acenda você a próxima janela. Porque eu espero que, ao contrário do velho programa de televisão, quando a janela se abrir sempre tenha alguém pronto a te ajudar com aquilo que você precisa.

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