Lamentável – mas não dá pra esquecer

Diante de tantas notícias ruins e episódios que pareciam sepultados de vez, tanto aqui como lá fora, só resta atualizar a Guimarães Rosa: viver é cada vez mais perigoso

Nos anos 60, o Uruguai rompeu suas fronteiras e ficou conhecido não apenas pelo seu belo futebol (tinha sido campeão do mundo em 1950), mas como a Suíça da América Latina, isso devido aos benefícios sociais estáveis, educação gratuita e democracia. A distante Suíça era como um paraíso na Terra. Mas, agora, outros tempos, e bota outros nisso, temos um vizinho com problemas, o Chile. Gabriel Boric, um político de esquerda, derrotou o direitista José Antonio Kast, domingo passado, tornando-se o presidente mais jovem do Chile.  

Boric teve quase um milhão de votos a mais do que o seu oponente. E o novo governo terá pela frente uma série de desafios: a unificação do país, após uma campanha marcada pela polarização, a inflação e a implantação das regras da nova Constituição chilena, que começou a ser elaborada este ano para entrar em vigor em 2022.  

Tempos (altamente) cruéis  

Por conta dos incidentes no Chile, há que se voltar na história, até porque, como reza o ditado popular, “nada está tão ruim que não possa piorar”. A ditadura chilena foi implantada no dia 11 de setembro de 1973, quando o presidente Salvador Allende foi deposto por um golpe militar liderado pelo general Augusto Pinochet. E o Chile se tornava mais um país sul-americano a ser comandado por um ditador. Durante 15 anos, Pinochet, é claro, governou com mãos de ferro, sempre implacável contra seus opositores.  

Crime(s) e castigo(s)  

Em 1988, Pinochet sofreu uma derrota por conta de um plebiscito, no qual 56% dos eleitores rejeitaram a sua continuidade no poder. Logo após o fim da ditadura, os militares acusados de crimes contra os Direitos Humanos foram julgados e condenados à prisão.  

Fugindo da Redentora de 64  

Vale ressaltar: o Chile sob o comando de Salvador Allende foi o país que mais acolheu brasileiros que se exilaram após o golpe (civil-militar) de 1964. Vários políticos e professores saíram do Brasil por causa da perseguição nos primeiros anos da ditadura e encontraram abrigo em solo chileno. Fernando Henrique Cardoso, José Serra, entre outros professores, puderam lecionar em universidades ou concluir seus estudos de pós-graduação naquele país.  

CIA (sempre) em ação  

Como o modelo de governo desagradou parte da elite econômica chilena, ela procurou vários meios para sabotá-lo. Allende enfrentou a sanção norte-americana e a queda do preço do cobre chileno no mercado internacional. Já a oposição ao governo recebeu apoio da CIA, agência de inteligência do Tio Sam, para sabotar as reformas propostas pelo governo. Dessa forma, a economia chilena mergulhou em crise, causando problemas até no abastecimento de mercadorias. Então, militares se organizaram para derrubar Salvador Allende.  

Um trágico esporte  

O Estádio Nacional de Santiago tornou-se palco dos horrores praticados por Pinochet. Mais de 20 mil pessoas ficaram presas, sendo torturadas, e muitas foram mortas por causa da violência sofrida. Apesar de o governo tentar esconder, a violência praticada naquele estádio foi denunciada por opositores que conseguiram fugir das arbitrariedades do governo de Pinochet. O Chile juntou-se a outros países sul-americanos que se tornaram ditaduras militares alinhadas com os Estados Unidos. Na década de 1970, esses países organizaram a Operação Condor, por meio da qual os governos militares “trocavam informações sobre opositores e táticas de tortura para que os presos políticos entregassem seus colegas”.  

De Pinochet:  

– Não temos prisões políticas. Temos exilados internos políticos.  

Médico e político marxista chileno, Salvador Allende foi fundador do Partido Socialista e governou o país de 1970 a 1973. Até ser deposto por um golpe articulado pelo seu chefe das Forças Armadas, isso mesmo, Augusto Pinochet.  

– Não basta que todos sejam iguais perante a lei. É preciso que a lei seja igual perante todos.  

Salvador Allende  

– Exportamos couro e cobre, e não revolução.  

Salvador Allende  

– Viver é muito perigoso… Porque aprender a viver é que é o viver mesmo.  

Guimarães Rosa  

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