É preciso frear Elon Musk

Dono do Twitter quer interferir no Supremo Tribunal Federal e pede impeachment de Alexandre de Moraes

A biografia que Walter Isaacson escreveu conta que Elon Musk interferiu de modo decisivo na guerra entre Rússia e Ucrânia. Quando os russos cortaram o acesso da Ucrânia à Internet, ele decidiu que sua empresa, a StarLink, entregaria milhares de kits para acesso a seus satélites, a custo zero. Mas quando a Ucrânia foi usar os kits para bombardear um navio russo, ele cortou o acesso na região.

Estamos falando aqui não só de um dos homens mais ricos do mundo. Trata-se de alguém que tem a capacidade de interferir numa guerra entre duas das maiores nações da Europa – de decidir, em última instância, as chances que um país tem de sobreviver a uma guerra. (No caso do atual homem mais rico, dono da Louis Vuitton, isso não acontece, e portanto o problema não é a riqueza em si.)

Agora Musk, incomodado com as decisões do Supremo Tribunal Federal do Brasil, disse que não vai mais obedecer ordens para suspender contas do Twitter/X. Disse mais: sugeriu a renúncia ou o impeachment do ministro Alexandre de Moraes, caracterizado por ele como censor. Houve festa entre o pessoal que tentou o Golpe de Estado em janeiro do ano passado – são eles os alvos de Xandão que tiveram as contas bloqueadas.

Musk quer mandar no Brasil, decidir como deve ser a política e quais devem ser as leis do país. Quer decidir quem pode e quem não pode ser ministro do STF. Ora, se ele pôde determinar as ações de Rússia e Ucrânia numa guerra, por que não?

A fortuna de Musk chega perto de R$ 1 trilhão. Quase metade da arrecadação do Brasil com impostos – e isso que a nossa carga tributária segue sendo criticada como muito alta. O dinheiro dele é maior do que o PIB de muitos países. A Zâmbia, vizinha da África do Sul onde Musk nasceu, precisa de seis anos para criar tanta riqueza.

Daron Acemoglu e James Robinson são autores de dois livros excelentes sobre democracia e o mundo atual: “Por que as nações fracassam” e “O Corredor Estreito”. Os livros são cheios de boas histórias que ilustram nossos problemas.

A certa altura, eles mostram que as dez maiores empresas dos EUA no início do século 20 tinham um valor de mercado equivalente a 1% do PIB americano. Era muito. Logo os donos das petroleiras e das ferrovias – gente como os Rockefeller – seriam mais poderosos que o Estado. Por isso, presidentes como Theodore Roosevelt, Taft e Woodrow Wilson, embora fossem de ideologia diferente, começaram a forçar essas empresas a vender parte de seus ativos, e a se fragmentar.

Hoje, as dez maiores empresas americanas somam seis vezes aquele valor: 6% do PIB do país. E além disso são empresas de áreas muito mais sensíveis: Apple, Amazon, Google… E ninguém fala em frear o poder dessas pessoas, que hoje são capazes de decidir o que vemos, o que sabemos, o que conhecemos sobre o mundo.

Musk é um homem sem limites. Sua biografia conta atos repulsivos cometidos por ele ao longo dos anos. Deixar que uma pessoa sozinha interfira no destino de países simplesmente em função de seu poder econômico, sem mandato popular para isso, já é algo imensamente triste. No caso de uma pessoa como ele, trata-se de algo inconcebível.

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