Por que eu voto em Lula (mesmo isso parecendo estranho)

Motivos não me faltam para justificar meus votos. E, mesmo assim, tenho amigos de vários espectros políticos. Nossas posições políticas não impedem nosso amor

Costumo ouvir que não tenho o estereótipo de quem vota na esquerda. Moro num bairro nobre de Curitiba, meu carro e meu apartamento estão quitados. Tenho plano de saúde estendido à minha filha e ao meu sobrinho. Estudei em instituições de ensino particular, falo línguas. Não sou funcionária.

Minha empresa é próspera, recolhe tributos e paga seus fornecedores. Gero ainda alguns empregos indiretos. Vou ao mercado, escolho o que quero comer e consigo pagar a conta. Visto o que gosto e viajo sempre que posso.

Tá! Então por que seu voto é sempre na esquerda? Por que você tem posicionamentos tão enfáticos? Porque aprendi com a vida que devemos fazer o bem sem olhar a quem, que devemos amar ao próximo.

Sendo assim, votei novamente no Lula pelas pessoas que morreram de Covid sem ter oportunidade de tomar vacina.

Pelos 33 milhões que passam fome. Fome = dor de estômago vazio.

Pelos 10 milhões de desempregados.

Pelos desalentados, que desistiram de procurar trabalho.

Pela preservação das demarcações indígenas e seu povo.

Pelos povos originários.

Pelas mulheres, pela comunidade LGBTQIAP+, pelas minorias.

Pela imagem internacional do Brasil.

Pela perda de controle de armas e munições circulando no país.

Pelos Direitos Humanos.

Na verdade, poderia citar um único argumento para meu posicionamento, que não é só meu: é da minha mãe, da minha irmã caçula e da minha filha.

Meu pai, jornalista, foi preso político. Perseguido e torturado. Ele era buscado em casa e minha avó via a saída dele e não sabia se ele voltaria algum dia. Esta rotina se repetiu várias vezes para desespero de uma mãe. Preso no Presídio do Ahú, um dentista comovido teve a ideia de arrancar um dente para que ele pudesse ser transferido para a enfermaria e assim respirar um pouco.

Depois foi banido das redações e perdeu a fonte de renda da família toda. Trabalhava com pseudônimos e ganhava quase nada. Tudo isso porque falava o que pensava. Sim. Era proibido pensar diferente.

Eu nasci em 1976, em plena ditadura militar. Na minha escola não se falava nada. Mesmo depois de 1985, a narrativa era de um país que passou por um período “atípico”. Nunca ouvi falar na escola sobre censura, torturas até mesmo de crianças, pessoas desaparecidas. A censura ainda era um fantasma.

Motivos não me faltam para justificar meus votos. E, mesmo assim, tenho amigos de vários espectros políticos. Nossas posições políticas não impedem nosso amor. Política não é sobre ódio. Seguiremos vizinhos, amigos, conhecidos da escola, colegas do Pilates. Nada muda.

Viva a democracia!

Sobre o/a autor/a

2 comentários em “Por que eu voto em Lula (mesmo isso parecendo estranho)”

  1. Elisete Ponchirolli

    Olá.
    Será que precisamos nos justificar pelo nosso voto?
    Minha situação é semelhante à sua.
    Os motivos, parecidos com os seus.
    Enfrento meu grupo de amigos e familiares com cabeça erguida, e principalmente, apostando na minha escolha.

  2. Carolina, continuando o que sua Bisa Catulina fazia. A Bisa sempre tinha no portão de nossa casa uma pequena fila de desassistidos , chamavam-na de vó , ali recebiam comida, vestimentas e alento. Vó Catulina escrevia semanalmente pelas mãos da filha Zilda ( ela sabia escrever só o básico) ao Presidente Getúlio e cobrava assistência aos pobres, doentes, negros …, e pasmem , ele respondia respeitosamente suas cartas, talvez por algum assessor , mas o fazia. Independente de quem foi o presidente ou ditador que passou por sua vida ela não deixou de assistir aos menos favorecidos. Qdo da sua morte eu vi e ouvi o choro sentido de muitos pobres que passaram por sua vida. Continue Carolina , vc que sempre está com a mão estendida pedindo algo para aliviar a vida de alguém . Te amo . ❤️

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