Por que é dever de todos cobrar uma agenda de conservação da natureza consistente para o Paraná?

Não estar atento, representa um risco cada vez maior de incremento nas consequências da gestão inadequada e insuficiente de nosso patrimônio natural

Quando o estado do Paraná receberá uma agenda consistente na área da conservação de seu patrimônio natural? Quando políticos, grupos setoriais, empresários, a população em geral, erguerão seus olhos para perceber que não podemos continuar a tratar esse tema como algo a ser administrado com base em ações de menor expressão que, em absoluto, permitem um enfrentamento adequado ao desafio que se mostra tão aparente?

A perda excessiva e, portanto, além dos limites aceitáveis, de nossas áreas naturais, potencializada pelo advento das mudanças climáticas, já apresentam indicadores concretos dos efeitos negativos decorrentes da inconsequência com a qual administramos nosso território ao longo da história recente. As crises ambientais, na forma de eventos extremos que nos atingem, são potencializadas de forma expressiva a partir da inexistência de remanescentes naturais em proporção e distribuição adequada. Estamos proporcionando prejuízos econômicos e sociais incalculáveis a toda a sociedade. Não estar atento a esta realidade incontestável representa um risco cada vez maior de incremento nas consequências da gestão inadequada e insuficiente de nosso patrimônio natural.

A história dos órgãos ambientais no Paraná é relativamente recente, com o surgimento das primeiras instâncias no final da década de 1970. Nessa época, foram constituídas autarquias com finalidade e qualificação técnica para atender a agenda ambiental, num movimento acompanhado pela maioria das unidades da federação. O surgimento dos órgãos ambientais garantiu um fator de enorme relevância e permitiu uma fase de avanços sem precedentes, acompanhados da evolução da legislação, ancorada em boa parte pela Constituição de 1988.

No Paraná, a origem destas autarquias ocorre a partir de desdobramentos de instituições ligadas à agricultura. Foi nesse período que o governo investiu amplos recursos originados por empréstimos internacionais para atender o combate à erosão, causado pelo uso inapropriado dos solos e do excesso de desmatamento, em especial nas regiões oeste e sudoeste. Um trabalho de excelência, que incluiu o surgimento de práticas de plantio direto, revolucionou o campo neste particular, gerando resultados expressivos de controle e diminuição dos efeitos da erosão.

A despeito do inegável sucesso desta complexa empreitada voltada estritamente ao tema da conservação de solos, muito pouco, ou quase nada se fez, em relação à agenda da conservação de áreas naturais. Ao contrário, dentro de um perfil de cultura madeireira fortemente arraigada e influente em todas as gestões públicas passadas, além de um gigantesco passivo no que se refere ao cumprimento do Código Florestal, o Paraná negou-se a cumprir as normas do Decreto Federal de proteção da Mata Atlântica de 1993.

Esta postura dos órgãos ambientais de se contrapor a uma determinação legal, mantendo o licenciamento para a exploração de nossas matas nativas do planalto, permitiu a exploração de forma determinante das últimas poucas áreas naturais ainda remanescentes, com foco mais direcionado ao ecossistema Floresta com Araucária. O poder público sustentou essas práticas até o ano de 2006, quando foi finalmente promulgada a Lei da Mata Atlântica, 

Mesmo com o acatamento desta legislação federal, nos últimos 15 anos continuaram os processos de destruição de áreas naturais, de forma ilegal, pela falta de estruturas adequadas de controle e de fiscalização e também a partir de processos contestáveis de licenciamento que seguiram ocorrendo, de formas variadas. A constatação desta realidade não foi nunca expressa a partir de levantamentos locais, cabendo a instâncias externas, a avaliação dos seguidos processos de supressão das últimas áreas bem conservadas ainda existentes. São ações continuadas promovidas pelo INPE e pela SOS Mata Atlântica que qualificam, sem nenhuma contestação possível, o estado do Paraná como o campeão de desmatamento entre os estados onde ocorre o Bioma Mata Atlântica. 

Cabe ressaltar outro aspecto que permite um melhor entendimento sobre a dificuldade em se estabelecer uma agenda mais robusta no campo da conservação. Ao longo dessas últimas décadas toda a estrutura dos órgãos ambientais foi diminuindo em termos de capital humano, uma vez que novas contratações não ocorreram faz mais de 30 anos. Tal cenário pode ser, em parte, explicado por uma visão míope, na qual as restrições impostas pela legislação e pela efetiva atuação destas autarquias, representa um empecilho ao desenvolvimento do estado. As contínuas pressões políticas impostas a partir de intervenções veladas de grupos setoriais, impediram, em última instância, uma evolução adequada e melhor direcionada dos órgãos ambientais em nosso estado.

O desprestígio ainda mais reticente neste período de cerca de 40 anos foi a falta de apoio para um setor específico dentro da agenda ambiental renegado sempre a último plano: a gestão de nosso patrimônio natural, onde se insere uma rica variedade de ambientes naturais, sua fauna e sua flora. O antigo DIBAP (Diretoria de Biodiversidade e Áreas Protegidas), hoje denominado Diretoria do Patrimônio Natural, sempre se manteve formado por um grupo extremamente pequeno de colaboradores, contou com orçamentos irrisórios e atuou dentro de um escopo de limitações extremas para realizar suas atividades.

Impossível, portanto, dentro das condições estabelecidas pelas gestões públicas responsáveis pela agenda ambiental, que um resultado mais expressivo pudesse ser alcançado na agenda da conservação de nossos ambientes naturais, a despeito da qualificação dos poucos funcionários destacados para essa função. Se compararmos as estruturas existentes no Estado do Paraná com o que São Paulo realizou neste campo de atuação, no mesmo período, em especial através da Fundação Florestal, podemos ter uma ideia de quanto ainda necessitamos evoluir e recuperar o tempo perdido.

Num momento de recrudescimento das polarizações entre os diversos setores da sociedade que temos observado, segue sem mudanças a política vigente, na qual o patrimônio natural não se encontra dentro das prioridades. Mesmo com um atraso evolutivo muito grande e passivos a serem atendidos emergencialmente, seguimos no Paraná sem uma visão diferenciada que assuma uma agenda para enfrentar o que deixamos de realizar até aqui.

Precisamos como nunca de mudanças efetivas que permitam a incorporação de uma nova postura nas próximas gestões públicas. Não podemos seguir com um comportamento que se mostra incapaz de perceber as enormes oportunidades que ainda podem ser aproveitadas ao posicionarmos o nosso patrimônio natural como um parceiro do desenvolvimento econômico e social, e não uma enganosa restrição. 

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