Desenvolvimento, clima e biodiversidade precisam andar juntos

Já passamos da fase de projetos demonstrativos que geram mídia e reconhecimento, embora ineficientes para atender aos desafios em curso

O que há muito tempo representa uma obviedade para aqueles que atuam na área ambiental, passa agora a representar uma questão incontestável para os setores da sociedade que sempre foram relutantes em considerar o equilíbrio da natureza como variável significativa para a agenda social e econômica. Ao longo das últimas décadas falharam as justificativas técnicas e científicas que sinalizaram para os riscos existentes a partir de avanços excessivos voltados à degradação da natureza e, concomitantemente ao incremento das emissões de gases de efeito estufa.

Até aqui, cabe reconhecer uma hegemonia do poder público e de grupos setoriais mais influentes, que proporcionaram um abafamento bastante efetivo na implantação de ações que representassem de forma efetiva, um enfrentamento destes problemas, que deixaram de ser uma ameaça para transformar o nosso dia a dia num cenário de constante insegurança e instabilidade. E de uma coletânea sem precedentes de prejuízos de ordem econômica que atingem, de forma mais direta, justamente, as frações da sociedade que vivem em situação de risco. 

A frustração só não é maior pelo fato de que as evidências hoje falam por si. Se até aqui não fomos capazes de reagir às mudanças impostas pelas nossas próprias atitudes, cabe colocar em discussão se faz algum sentido manter o comportamento tradicional que segue apostando na manutenção do atual cenário que nos fragiliza de forma bastante contundente. Ou se chegou a hora de admitirmos que devem ocorrer mudanças capazes de nos posicionar de forma mais propositiva, reconhecendo a relação direta entre a agenda de proteção do meio ambiente e nosso próprio futuro. 

As resistências por mudanças de comportamento ocorrem em todas as situações em que alterações de cenário se confrontam com práticas usuais, em especial, se implicam em novas demandas na forma de investimentos, públicos e privados, até aqui relegados a último plano. Mudar sempre é um grande desafio, mas, muitas vezes, gera um retorno que justifica todas as dificuldades envolvidas. As perdas substanciais na agricultura observadas recentemente devido à seca sem precedentes e o excesso de chuvas que atinge o Sul do Brasil neste momento não são tão somente fenômenos esporádicos e que não vão mais se repetir. As regras do jogo agora implicam em situações similares com maior frequência e maior intensidade. 

Além de uma ampla agenda em busca da diminuição de emissões, das mais variadas formas, o que em parte pode ser obtido com o estímulo à implementação de novas tecnologias e a redução ou eliminação de práticas que exacerbam na geração de gases de efeito estufa, com uma maior colaboração, especialmente, entre governos e corporações, uma pauta voltada à proteção de remanescentes naturais e a ampliação significativa de ações voltadas à restauração de áreas degradadas precisa ser urgentemente implementada. Há premência em recusar a manutenção de ações demonstrativas, muitas vezes, sem foco em prioridades e que não alteram cenários, para um esforço mais qualificado que permita gerar resultados em escala para o enfrentamento do atual cenário.

Iniciativas pontuais e isoladas, por mais interessantes que possam parecer, não tem qualquer tipo de justificativa a não ser representar exemplos que podem ser assimilados como novas políticas públicas capazes de grande amplitude e aderência de toda a sociedade. Já passamos da fase de projetos demonstrativos que geram mídia e reconhecimento, embora francamente ineficientes para atender aos desafios em curso. Estamos muito lentos em responder aos sinais que já são bastante evidentes e apenas uma articulação em cadeia pode representar uma alteração de rumos que nos proteja de maiores prejuízos sociais e econômicos.

Sem descartar o papel da iniciativa privada, que deve estar já mais sensível e interessada em relação aos temas clima e biodiversidade, em especial aqueles que sofreram prejuízos mais significativos, o poder público tem uma grande oportunidade de demonstrar consistência com suas prerrogativas de defender os interesses maiores de toda a sociedade e estruturar-se a ponto de demonstrar que está disposto e tem condições de dar uma resposta a altura para reverter o quadro atual. Nas diferentes instâncias de governo são necessárias mudanças de rumo determinantes, no sentido de garantir lastro suficiente que, historicamente, nunca foi oferecido por não ser reconhecido como uma prioridade.

No caso do Governo do Paraná, o pleito de melhor estruturação dos órgãos ambientais já vem de algumas décadas. No entanto, o que se observou até aqui, embora as agendas tenham se multiplicado em amplitude e complexidade, é um contínuo enfraquecimento destas estruturas, que são fundamentais para dar respostas no amparo da agenda ambiental. A diversificação de frentes aliada a pouca estrutura gera inconsistências crônicas que permitem o avanço da degradação ambiental. E mesmo com todas as sinalizações da necessidade de mudança de atitude, fortes pressões políticas seguem impedindo uma evolução positiva neste particular.

É fundamental que a gestão presente perceba a importância de aproveitar a oportunidade do atual momento, no qual a sociedade se mostra, ao menos, um pouco mais inclinada a prestar apoio ao fortalecimento da agenda ambiental. Há premência por uma atitude determinante, com o anúncio de iniciativas que passem a ser implementadas no curto prazo e possibilitem a atração de mais investimentos externos, dada a abertura existente para as instâncias que estejam dispostas a protagonizar mudanças demandadas globalmente. Se o Paraná sempre foi uma referência em iniciativas inovadoras, cabe uma resposta a altura na construção de um arcabouço que nos permita enfrentar a crise ambiental com competência e responsabilidade.

Uma primeira medida de caráter administrativo é bastante evidente, com a criação do “Instituto de Conservação e Clima do Paraná”, em complemento às ações já muito pressionadas do atual Instituto Água e Terra, que atua principalmente no tratamento da chamada agenda marrom e nos crescentes processos de licenciamento. Em parceria com o BPAMB (que demanda a criação de seu segundo Batalhão) e instâncias como o IBAMA e o ICMBIO, além das secretarias municipais, o novo Instituto poderá assumir a agenda do Clima e da Biodiversidade de forma mais efetiva e dinâmica, ampliar a gama de atividades e garantir investimentos adicionais de fontes diversas para conservar e restaurar o patrimônio natural do Paraná. Reiterando que estas são medidas prementes para enfrentar os efeitos da crise climática e da perda da biodiversidade, de efeito sinérgico e devastador. 

Esse movimento não depende nada mais do que de um entendimento do atual governador de sua grande oportunidade de fazer história. De dar uma resposta à altura do desafio existente para todos nós e se transformar numa referência de amplo espectro. Está em suas mãos fazer o que todos os governantes que lhe antecederam não conseguiram ou não quiseram: assumir uma agenda ambiental mais ampla e completa e estruturar uma nova instituição capaz de dar um retorno qualificado à sociedade paranaense. Um primeiro passo para que o Paraná tenha condições concretas de mitigar os efeitos das alterações ambientais vigentes

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