Sobre a expulsão de alunos: uma reflexão

Professor há décadas, há mais de 15 anos não tiro nenhum aluno da sala de aula

Professor há décadas, há mais de 15 anos não tiro nenhum aluno da sala de aula. A última vez tratou-se de um jovem que começou a gritar e eu pedi para o funcionário de corredor para encaminhá-lo para a enfermaria. Antes disso, tirei alunos que não demonstravam comportamento adequado para a aula. Hoje não faço mais isso. Converso com eles. Peço. Uma vez conversado e pedido, relevo e ignoro. Meus alunos são jovens. Eles devem ter a chance de assumir a responsabilidade pela continuação de seus atos. Se eu interrompo e os retiro, eles nunca vão saber se seriam capazes de parar por si mesmos.

Trabalho com turmas grandes, com 200, 250 alunos. O meu nível de atenção é de 60% a 80%, dependendo da época do ano, do horário e do assunto. Nunca há uma atenção absoluta, como, aliás, em lugar algum. Fale para uma plateia de 10 pessoas, por 45 minutos, e cinco minutos depois alguém vai olhar pro lado, vai comentar algo com o vizinho, vai dar uma espiada no celular, vai viajar para seu imenso mundo interior. Uma fala dirigida é algo que exige um grau de reconhecimento e de intimidade que nunca se alcança em uma sala de aula com um ou dois encontros por semana.

A questão que implica os professores na sua atividade cotidiana é: qual o limite entre o propósito do seu trabalho e esse grau de entropia que se estabelece na sala de aula após o início da atividade? Sempre acreditei que o aprendizado do silêncio devia ser um conteúdo escolar, o primeiro e mais fundamental deles. Uma vez compreendida a importância do silêncio, a escola precisaria trabalhar a importância da escuta da fala do Outro. Também precisaria exercitar a arte de formular perguntas. E, por fim, a difícil habilidade de responder com o propósito de contribuir para o aprendizado comum e não para vencer o outro.

Esses conteúdos, porém, estão ausentes tanto na escola como na maioria das famílias contemporâneas, pois exigem um trabalho frequente, intenso e longo. Quem tem tempo para?
Cabe então ao professor, pelo seu exemplo, apresentar, minimamente, as bases dessas habilidades civilizatórias. Não é tarefa fácil, pois não é prevista na grade curricular, interessada em conteúdos que esquecem que sem forma não há aprendizado que se mantenha. Aliás, a palavra esquecer quer dizer, exatamente, “cair para fora”. Esquecemos porque não sabemos a razão de reter aquele algo que me falam. Por que guardar o que não fui capaz sequer de escutar e mesmo que tenha escutado não tive tempo para pensar em sua importância pois logo outras falam se amontoaram a esta?

Aí temos mais uma questão importante para refletir: se não somos capazes de levar um aluno a apreender e compreender, retirá-lo de sala de aula ou mesmo da escola é o caminho mais adequado para quê? Para que ele apreenda ou compreenda? Não parece fazer muito sentido.
Penso que a escola e a família travam uma amarga disputa com o tempo. O mundo acelerou tudo e não há tempo para nada. Porém, a Educação é impossível sem tempo, como a dor não passa sem o período da cura. O que resta, portanto, é a punição sem a oportunidade de conhecer o que, de fato, é o seu objeto. É como se, ao punir, admitíssemos os nossos próprios fracassos em não elaborarmos uma forma de contato mais oportuna e construtiva com essa criança, com esse jovem.

Como contraponto, lembremos o paradoxo de Popper: “a tolerância ilimitada leva ao desaparecimento da tolerância”. Porém, não me refiro aqui a tolerar. Pelo contrário, toda a ofensa, toda a violência não pode ser ignorada. Mas não me parece que simplesmente eliminar, fazer sumir do horizonte a fonte da ofensa e da violência seja a solução, tanto para a origem – o jovem agressor – quanto para os efeitos da ação reprovável. A saída está em compreender e em aprender. E essa não é uma tarefa só para o agressor. É uma tarefa para todos nós. E urgente.

Sobre o/a autor/a

4 comentários em “Sobre a expulsão de alunos: uma reflexão”

  1. Na lição dos doutos em educação a Escola deve ter o aluno como centro do processo ensino aprendizado e de inclusão. Mas a verdade, é que, não diferente de outras coisas públicas, estão ali para servirem aos seus operadores e profissionais. Tem que implementar um controle externo da gestão pública na escola, formado por notáveis em educação fora da escola gerida, sob pena de institucionalizar a mediocridade, como vem acontecendo com toda coisa pública.

  2. Tem sido bastante difícil estar e manter-se em sala de aula. Física, emocional e profissionalmente. Também acho que a retirada ou a exclusão não solucionam os problemas, nem amenizam as tensões. Todavia, o exercício da Educação tem encontrado cada vez obstáculos maiores e mais difíceis de serem contornados. Em alguns ambientes realmente a opção tem sido o distanciamento e um certo isolamento, pois lutar e lutar se mostra de pouca eficácia.

  3. Todos os alunos que se manifestaram de maneira fascista, racista e nazista naquelas escolas de elite de Curitiba DEVEM ser expulsos imediatamente.
    Eles são CRIMINOSOS e o status de uma escola de elite os fazem criminosos extremamente perigosos.
    Os pais e mães desses alunos devem ter a guarda dessas crianças removida e esses adultos devem responder pela educação nazi-fascista que deram à seus filhos.
    As escolas de elite também devem responder criminalmente por terem permitido as manifestações e comportamentos que culminaram nas manifestações nazi-fascistas.
    O Vaticano tem que se pronunciar sobre essas escolas de elite de Curitiba que permitiram as manifestações nazi-fascistas e que mantém os alunos envolvidos matriculados e sem expulsá-los. Três das quatro escolas envolvidas eram Católicas e isso indica um problema grave na interpretação do que é catolicismo e como o catolicismo está sendo usado como etiqueta de marketing por escolas particulares que lucram com isso – seja financeiramente ou por prestígio, ou por ambos.

  4. Sou professor de ensino médio da rede pública do Paraná e também já pensei assim um dia. Pensei assim no começo da minha carreira em instituições que me deram apoio sempre que precisei lidar com situações complicadas em sala de aula e com alunos em geral com um padrão de vida razoável. Mudei completamente de opinião quando precisei lidar com alunos que me desrespeitavam e a colegas meus verbalmente de forma continua e não davam ouvidos nem mesmo à equipe gestora. Nesses casos, retirar o aluno da sala de aula é uma necessidade. Caso contrário, não há aula, não há aprendizado, não há convivência que se sustente.

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