STJ decide se Engie pode seguir instalando linhas de energia nos Campos Gerais

APA da Escarpa Devoniana foi recortada pelas obras de implantação de mais de 2.118 torres de transmissão

Por Bruna Bronoski, do OJC

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) vai analisar no dia 20 de outubro um recurso apresentado para reverter as últimas decisões que autorizaram a continuidade das obras da Engie em 27 municípios dos Campos Gerais. O tema seria analisado nesta quarta-feira (6), mas foi adiado para ser julgado junto com outro pedido de suspensão de liminar que já estava pautado para o dia 20.

Somente em caso da Engie perder nas duas decisões, poderá haver paralisação das obras.A Área de Proteção Ambiental da Escarpa Devoniana foi recortada pelas obras de implantação de mais de 2.118 torres de transmissão de linhas de energia elétrica. Para instalar as torres, a empresa conseguiu licenciamento ambiental que permitiu o corte de 4 mil araucárias, entre outras árvores, por cerca de mil quilômetros.

O Observatório de Justiça e Conservação (OJC) e o Ministério Público (MP) entraram com pedidos de liminar contra as obras do “Sistema Gralha Azul”. Ironicamente, a empresa derrubou ao menos 4 mil araucárias, árvore que provê alimento para a gralha azul, pássaro símbolo do Paraná e hoje ameaçado de extinção. 

Torres alteraram a paisagem da região de São Luiz do Purunã. Foto: Andrea Viatroski

Segundo o OJC, o MPPR e o MPF, a Engie entrou com pedido de vários licenciamentos ambientais para a instalação das torres, pulverizando o processo de autorização da obra de modo a diminuir, no papel, seu impacto global. “Houve fracionamento de um licenciamento que é materialmente e contratualmente uno, minimizando os reais impactos ambientais”, afirma a advogada do OJC, Camila Maia.

Decisões

O pedido de liminar do OJC, atendido pela Justiça Federal em outubro de 2020, conseguiu suspender por três meses a licença de instalação dos trechos 1 e 2 da obra. A Engie recorreu, mas o Tribunal Regional Federal da 4ª Região confirmou a decisão. Com novo recurso, a Engie conseguiu derrubar a liminar em dezembro, por decisão monocrática do Presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Humberto Martins.

Paralelamente, o MPPR e o MPF também entraram com pedido de liminar, desta vez para suspensão dos licenciamentos de todos os trechos do empreendimento, sete no total. Da mesma forma, a liminar foi derrubada pela presidência do STJ em março deste ano e a Engie voltou a ter autorização para instalar as torres. Os recursos a favor da continuação das obras foram apresentados, além da Engie, pela União e pelo Estado do Paraná.

Com o caso na pauta do STJ, a Corte Especial pode rever a suspensão da liminar, ou seja, retirar novamente a autorização da empresa de fazer intervenções no traçado das linhas, mesmo com a obra em fase avançada de implantação, até a decisão da Justiça Federal.

Paisagem Alterada

As torres de linha de transmissão deverão cruzar a APA da Escarpa Devoniana e propriedades privadas. 

Dona de um sítio em São Luiz do Purunã, Andrea Viatroski acompanha o andamento da instalação, que já chegou a 80% do previsto. “Aqui na região, existe o turismo por causa da natureza, não sei como permitiram que levantassem as torres. Está mudando muito a paisagem”, conta Viatroski.

Ainda há torres sendo instaladas na região, informou o presidente da Associação de Moradores de São Luiz do Purunã, Murilo Milleo. “Nós tentamos evitar as obras da Engie, não conseguimos. Depois tentamos conversar com a empresa para pedir uma compensação ambiental, um dinheiro que fosse revertido para as questões ambientais daqui. Mas depois que eles ganharam o recurso na Justiça em março, nunca mais apareceram. Não conseguimos dialogar”, conta Milleo.

Mesmo que a decisão do STJ seja favorável à interrupção da instalação, o prejuízo ambiental já é considerado irreversível. Houve expressiva supressão da vegetação e implantação de torres de até 68 metros de altura, que mudaram a paisagem da Escarpa Devoniana. “Nosso pôr-do-sol não é mais o mesmo”, afirma Milleo.

Impactos ambientais irreversíveis

A pedido do Observatório de Justiça e Conservação, um grupo multidisciplinar de especialistas fez um estudo do processo de licenciamento. Os pesquisadores e técnicos responsáveis apontaram uma série de irregularidades no estudo de impacto ambiental. A área afetada na região alcança 218 hectares.

Segundo o estudo, para chegar ao local de instalação das torres, 400 quilômetros de estradas teriam de ser abertas, causando desmatamento. Além disso, 28 comunidades rurais, sendo 12 delas tradicionais (entre Terras Indígenas e quilombos), foram diretamente impactadas.

Ao todo, as torres da Engie alteraram a dinâmica de 845 propriedades privadas, com impacto de inviabilização econômica de parte delas. 

O processo de licenciamento foi considerado juridicamente inválido. A Engie deixou de apresentar avaliação adequada das áreas úmidas e ações de proteção nessas áreas. Faltou mapeamento de nascentes e áreas alagáveis, além de estudos de impacto sobre degradação do solo, das cavidades naturais, risco de queda das torres, declínio da população de aves, vulnerabilidade frente à incêndios, comprometimento do potencial turístico, entre outros. A lista da falta de estudos por parte da Engie é extensa.

O que diz a Engie 

Entramos em contato com a multinacional Engie sobre a quantidade de árvores derrubadas até agora, o impacto ambiental gerado na região de extensão das linhas e a possível compensação aos municípios afetados. Até o momento da publicação não tivemos retorno.

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