OAB-PR pode ter sua primeira presidenta mulher; oposição chama a chapa de “feudo”

Marilena Winter será a primeira mulher candidata às eleições para a presidência da entidade em toda a história

A tradicional chapa XI de Agosto leva quase todas as eleições da Ordem dos Advogados do Paraná (OAB-PR) desde a década de 1970. Ao todo, foram 15 mandatos presididos por advogados do mesmo grupo – todos homens e brancos, assim como os demais presidentes do órgão ao longo da história. A novidade é que a atual vice-presidenta da entidade, Marilena Winter, deve sair candidata pela chapa no próximo pleito, tornando-se a primeira mulher a disputar o cargo máximo da Ordem no Paraná.

“Como o processo eleitoral ainda não foi deflagrado, é uma pré-candidatura pelo grupo XI de Agosto”, confirmou Marilena ao Plural. Solicitamos entrevista, mas ela disse que não pode se manifestar, por enquanto, em respeito às regras do processo eleitoral. A pré-candidata se dispôs a conversar com a reportagem quando for oportuno. Marilena é procuradora do município de Curitiba e professora da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).

A chapa de oposição será a Algo Novo, que disputou as eleições da OAB pela primeira vez em 2018 e saiu com 32% dos votos. “Lançamos uma chapa com 50% de mulheres. Algo até então inédito, mas que para nós era inegociável. Foi um dos motivos pelos quais a oposição se organizou”, afirma um dos participantes, o advogado Ramon Bentivenha.

Este ano, eles prometem trazer outro homem para a disputa do cargo. O pré-candidato da vez será Marcelo Trindade, sócio-fundador do escritório Trindade e Arzeno Advogados Associados. Thais Takahashi será a candidata à vice-presidência pela Algo Novo. Ela é sócia administradora da Takahashi Advogados Associados e vice-presidenta da Associação Brasileira dos Advogados Previdenciários.

Marcelo Trindade, pré-candidato à presidência pela chapa Algo Novo. Foto: divulgação

De acordo com a assessoria da OAB-PR, as eleições da Ordem estão previstas para a segunda quinzena de novembro. “A data, no Paraná, ainda não está definida, mas deve ser na semana de 22 a 26 de novembro”, adianta. “O edital de convocação deve ser publicado 45 dias antes. A partir dessa publicação, por 15 dias, as chapas podem se inscrever. Assim, só teremos candidaturas oficiais no mês de outubro.”

Procurado pelo Plural, Marcelo topou falar. Em entrevista, ele antecipou os planos de campanha da chapa e fez críticas à atual gestão, que em sua visão não representa mais a categoria.

Plural: O que vocês podem nos adiantar sobre a chapa Algo Novo? 

Marcelo: Nós ainda não temos uma chapa pronta, é algo que o movimento está construindo, inclusive porque a campanha só deve se dar no início de outubro, provavelmente, pelo calendário da OAB. Mas esse é um movimento que foi constituído em 2018, antes das eleições. Na época, nós participamos com esse mesmo nome e obtivemos mais de 30% dos votos. Nesta eleição nós viemos com mais organização e com mais força. As ideias, salvo algumas mudanças decorrentes da própria conjuntura, não mudaram de lá pra cá.

O que vocês trazem de novo para a discussão?

Nós entendemos que a OAB precisa de uma mudança, porque tem o mesmo grupo na direção há quase cinquenta anos, né? Não há uma alternância de poder, é um pessoal que acabou se distanciando das necessidades dos advogados e que hoje não representa aquilo que pensam os advogados e as advogadas do Paraná. A OAB deixou – não só no Paraná, em outros lugares também, mas no Paraná em especial – de ser uma referência como entidade para a sociedade, não só pros advogados. A OAB é fundamental na defesa da constituição e do estado democrático de direito, mas há algum tempo já não cumpre mais esse papel. E, com isso, perdeu seu protagonismo, deixou de ser respeitada. 

Na prática, que críticas são essas que vocês fazem à atual gestão?

A OAB tem questões que dizem respeito à defesa da categoria dos advogados, à demanda econômica, enfim, questões até simples. A OAB do Paraná é uma das que têm anuidade mais caras do país. No início do ano, quando foi feita uma campanha para que reduzisse esse valor, considerando a pandemia e a queda de rendimento dos advogados, a OAB não teve a sensibilidade de analisar a questão, simplesmente disse que não poderia fazer e assim ficou. Não há transparência na forma como são utilizadas essas verbas. A OAB tem um orçamento de mais 60 milhões no Paraná e não há transparência em relação a isto. Não significa dizer que tenha algo de ilegal na forma como é feito, mas sim de dizer que a OAB precisa, num momento como este, utilizar o orçamento de forma mais adequada, de maneira a poder reduzir a anuidade e dando retorno aos advogados. Qual foi a assistência que a OAB deu aos advogados durante a crise sanitária? Muito pouca coisa a OAB respondeu. Não que ela fosse suprir todas as necessidades que os advogados passaram a ter por conta da pandemia, mas no Paraná são mais de 70 mil advogados e não se percebeu nenhuma medida efetiva no sentido de apoiar a categoria. 

Que ações ela poderia ter feito, na sua visão?

A OAB tem prédios grandes e luxuosos por todo o estado. Nós vimos, nesse período, os advogados fechando escritórios, reduzindo seus espaços por absoluta falta de condições econômicas. Os advogados deveriam ter acesso a esse espaço, utilizando a estrutura de informática e os escritórios para atender clientes, ou seja, a gestão poderia racionalizar esse espaço todo que existe para que os advogados possam usar aquilo que pertence a eles, mas não é o que acontece hoje.

Você mencionou, no início, que a OAB deixou de ser respeitada pela sociedade. O que te causa essa impressão?

Os advogados hoje são desrespeitados diariamente em delegacias de polícia, por juízes, e o que a OAB faz com isso? Em ano eleitoral, principalmente, a OAB faz sessões de desagravo. O que são essas sessões? São eventos em que ficam sabendo dos advogados – e olhe lá, alguns advogados, tá? Nós vimos, dias atrás, um advogado do Paraná, aqui em Curitiba, ser preso, algemado por policiais militares, e o que a OAB faz com isso? Há uma manifestação de repúdio ao que ocorreu, mandam um ofício pra autoridade que praticou o ato e nada mais acontece. O que a OAB faz, de fato, para que isso não aconteça? É preciso cobrar responsabilização pra quem pratica esse tipo de ato, porque só assim é que eles vão deixar de ocorrer. E como fica a sociedade, né? As pessoas que necessitam de advogado, quando veem que os próprios advogados não são respeitados, que eles são tratados dessa maneira…

Vocês também levantaram uma discussão sobre gênero nas eleições passadas. Isso continua?

O Conselho Federal da OAB aprovou a política de cotas. Ao menos 50% de todos os órgãos da OAB devem ser compostos por mulheres e 30% por negros. Nós já defendíamos – e fizemos isso efetivamente na nossa chapa – que 50% do total dos integrantes da chapa fossem mulheres, independente de haver cotas. Mas qual foi a postura dos dirigentes da OAB em relação a essa questão? Eles vêm tentando, de tudo que é maneira, já que fica muito feio dizer que é contra, impedir que a regra seja aplicada nessa eleição. A OAB-PR questionou o Conselho sobre a aplicação nestas eleições. Ou seja: diante da impossibilidade de impedir que isso ocorra, coloca-se empecilhos. Pega mal dizer que é contra. A OAB, hoje, é controlada por um grupo pequeno de advogados. A maioria dona de grandes escritórios. A grande massa de advogados – principalmente os jovens – está distante e não tem acesso não só aos conselhos, mas também às decisões sobre os destinos da entidade. As últimas 15 gestões, exceto a do triênio 91-93, todas foram da XI de Agosto. A OAB precisa, sim, ser devolvida aos advogados e não ser um feudo de um grupo pequeno de advogados como ela é hoje.

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2 comentários em “OAB-PR pode ter sua primeira presidenta mulher; oposição chama a chapa de “feudo””

  1. Advogado virou piada no Brasil. Ninguém respeita. Acredito na importância de ter mais de uma chapa. E é verdade que os advogados são desrespeitados e é feito até chacota todos os dias e a OAB n faz nada. Também em delegacias a situação é pior ainda sem falar em órgãos da administração indireta como caixa, banco do brasil, etc também atende muito mal o advogado. Delegados deveriam ter experiência jurídica em advocacia antes de virar delegado, ou seja, ter pré-requisito em atividade jurídica pra fazer concurso para delegado. Também muito importante ter porte de arma para advogados. Nessa eleição vou apoiar oposição a chapa atual talvez mude algo.

  2. Não são “quase” todos os mandatos. São todos, sem exceção. Então a Drª Marilena só “poderá” ser a primeira mulher presidente se não for confirmada sua candidatura. Caso contrário, não “poderá”, mas SERÁ a presidente. A XI de Agosto é um feudo que representa absolutamente tudo o que a OAB deveria combater. Aliás, a OAB como um todo, em todo o Brasil, representa tudo o que a OAB deveria combater.

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