Da fadiga à queda de cabelo: sequelas pós-Covid

Quanto mais grave o quadro do paciente, maiores as chances de desenvolver outras doenças

Definitivamente não é só uma gripezinha. Um estudo recente da Universidade de Leicester, no Reino Unido, mostrou que, passados cinco meses desde que receberam alta, 7 a cada 10 pacientes internados por causa da Covid-19 não se recuperaram totalmente. A pesquisa analisou um grupo de 1.077 pessoas hospitalizadas entre março e novembro de 2020 – e só 29% disseram se sentir totalmente curadas.

Quando a doença chegou a Curitiba, em março do ano passado, o médico Gibran Avelino Frandoloso ajudou a abrir as unidades de atendimento do Grupo Marista (Hospital Marcelino Champagnat e Hospital Universitário Cajuru) e do Complexo Hospitalar do Trabalhador. De lá pra cá, como clínico, ele também acompanhou centenas de pacientes lutarem contra as chamadas sequelas. Em entrevista ao Plural, ele divide um pouco de sua experiência.

Plural: O que determina as sequelas que uma pessoa pode ter?

Gibran Avelino Frandoloso: O tipo de sequela que a pessoa vai ter no pós-Covid depende muito do quanto ela sofreu durante o evento agudo. Um organismo que sofreu uma agressão intensa muitas vezes leva meses para se recuperar. Alguns pacientes têm ficado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) por meses, outros de uma a duas semanas. Outros apresentam quadros leves a moderados e não precisam de internação. Então, varia bastante.

Que tipos de sequelas vocês observaram no último ano?

Do ponto de vista comportamental e neurológico, a gente tem visto alterações de memória, pessoas que percebem menos concentração, outras com distúrbios de sono, outras com alterações comportamentais como transtornos de humor, depressão ou mais comumente a ansiedade.

No aparelho respiratório, que é um dos mais afetados, a gente vê a persistência de fadiga e tosse. Algumas pessoas têm quadros de dependência de oxigênio prolongado, com áreas de hipoventilação ou mesmo de fibrose pulmonar que podem, em parte, resolver, mas às vezes são sequelas definitivas.

No aparelho cardiovascular, a gente vê diminuição da capacidade de contração do coração e arritmias. No digestivo, alterações hepáticas como uma elevação transitória das enzimas do fígado. Muitos que ficaram muito tempo internados também persistem com sequelas no aparelho renal. Muita gente faz insuficiência renal, a maioria volta à normalidade mas alguns ficam com sequelas.

E a perda de olfato e paladar?

Nem todo mundo chega a desenvolver, mas os que desenvolvem levam algum tempo para recuperar. É muito variado, alguns pacientes voltam a perceber cheiro e sabor em duas semanas e outros levam meses. 

Também já conversei com pessoas que perderam a mobilidade dos pés, por exemplo. É comum?

Não é exclusividade da Covid, mas é uma consequência. Se a pessoa ficar na UTI por muito tempo, ela pode desenvolver uma doença chamada neuropatia do paciente crítico, aí pode ter perda muscular e motora. A recuperação muitas vezes é lenta, com Fisioterapia. É similar ao paladar e ao olfato, porque é uma questão de recuperação do neurônio. 

Quanto à perda de cabelo, acontece muito?

A perda de cabelo também não é uma exclusividade da Covid, mas acontece. Toda vez que você tem um estresse catabólico alto, o organismo tende a concentrar a produção proteica e lipídica nas áreas nobres – função renal, cardiovascular e respiratória – e deixa de lado transitoriamente outras funções menos nobres, como produzir unha e cabelo. O cabelo fica rarefeito. Por vezes, o paciente fica com pouco ou nenhum cabelo, mas sem marcas históricas. Já na unha, podemos ver um sulco transverso que marca o período de maior catabolismo. 

Assim como o tronco da árvore pode marcar os traumas que a árvore sofreu ao longo da vida, algumas partes do nosso corpo também mostram isso, como a pele e as unhas. Mas isso acontece com pessoas que desenvolvem a forma grave da doença. 

Qual foi o sintoma mais persistente que você observou?

O que mais persiste é a fadiga. E os sintomas respiratórios que progressivamente vão se tornando mais leves, às vezes estabilizam, mas não desaparecem. Viram o novo 100% da pessoa.

Com tantas sequelas, cuidar do pós-Covid se torna um desafio também. Como vocês estão trabalhando com esses pacientes?

Estão surgindo ambulatórios de cuidado pós-Covid, tanto no sistema público quanto no sistema particular, que serão importantes para a reabilitação. Vale ressaltar a importância dos cuidados nutricionais, da Fisioterapia e do apoio psicológico nessa fase. Os ambulatórios têm surgido com essa visão multidisciplinar.

Sobre o/a autor/a

1 comentário em “Da fadiga à queda de cabelo: sequelas pós-Covid”

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

O Plural se reserva o direito de não publicar comentários de baixo calão, que agridam a honra das pessoas ou que não respeitem níveis mínimos de civilidade. Os comentários são moderados por pessoas e não são publicados imediatamente.

Rolar para cima