Um projeto de lei confuso que promove pelo menos cinco grandes mudanças no cálculo do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) de Curitiba corre o risco de ser votado no próximo dia 5 na Câmara sem nem ter sido lido direito pelos vereadores da capital. A iniciativa do prefeito Rafael Greca (PSD) tramita em regime de urgência na Casa apesar de não haver razão para tal e o texto ser extremamente complexo.
Os dados apresentados pela prefeitura de Curitiba à Câmara são incompletos, contém inconsistências e altera o padrão de dados anterior, dificultando qualquer análise mais aprofundada do assunto. Mas o Plural conseguiu averiguar que o aumento de receita prevista com a arrecadação será de 60% em quatro anos. Para efeito de comparação, de 2019 a 2022 a receita do IPTU na cidade aumentou 33%.
Ainda segundo as informações da própria prefeitura, as unidades residenciais em condomínio horizontal terão o maior aumento médio: 46% de 2022 a 2024. Para os edifícios residenciais o reajuste será de, em média, 30%. Esse percentual, porém, pode ser enganoso. Uma análise superficial dos valores por metro quadrado da nova Planta Genérica de Valores Imobiliários (PGV) apontou reajustes de 156%.
A prefeitura diz que o projeto precisa ser votado porque se trata de uma atualização da PGV, que tem prazo definido por lei para ser atualizada. A proposta, porém, vai muito além disso. Ela altera significativamente cinco elementos da legislação do imposto imobiliário:
- Atualiza a PGV e a adapta ao novo Zoneamento estabelecido em 2019
- atualiza as faixas de valores e alíquotas do imposto
- muda a regra de redução do valor venal do imóvel para proprietários idosos
- altera o cálculo da taxa coleta de lixo
- altera os coeficientes de ponderação no cálculo do imposto
Mudança impede comparação
Um dos maiores problemas na análise do projeto de Greca é que ele muda o formato da planilha dos Valores por Metro Quadrado. A planilha vigente indica o valor pela indicação fiscal e inscrição imobiliária, o que permite a análise por imóvel. A prefeitura, porém, agora alega que essas informações – muito embora não atreladas a identidade dos proprietários – não podem ser divulgadas por conta da nova Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).
A nova planilha, anexada ao projeto, informa o valor do metro quadrado por microrregião, zoneamento e bairro. Isso dificulta a comparação entre os valores em vigor e os que a prefeitura está propondo. E se não há como analisar os dados, como os parlamentares poderão tomar uma decisão informada sobre o projeto?
Valores divergentes
Uma análise feita pelo Plural também identificou divergência entre os valores da Planta de Valores Imobiliários anexados ao projeto. A nova redação proposta do art. 37 da lei complementar no. 40 de 2001 para:
Art. 37. Os valores relativos ao metro quadrado de lotes ou terrenos, compatíveis com os valores praticados no mercado, correspondente às microrregiões relativas a cada polígono, delimitado em cada bairro, pelos eixos, zonas e setores especiais, em conformidade com a lei de zoneamento, uso e ocupação do solo, com observância aos respectivos parâmetros de uso e ocupação, e às características próprias de desenvolvimento da região, estão relacionados nos anexos I e II, compreendendo mapa e quadro de valores, respectivamente.
No entanto, os anexos não apresentam valores compatíveis. O Plural comparou os valores por metro quadrado de terrenos e lotes ou VUKT por indicação fiscal e não encontrou nenhum com valores semelhantes, nem há na proposta explicação para a divergência. Algumas das indicações fiscais pesquisadas foram:
- Imóvel no Xaxim na Zona de Transição da Linha Verde (ZT-LV):
- No anexo I (Mapa): R$ 1.126,00
- No anexo II (planilha): R$ 788,00
- Imóvel no Portão na Zona Residencial 3 (ZR3):
- No anexo I (Mapa): R$ 1.419,00
- No anexo II (planilha): R$ 993,00
- Imóvel no Batel na Zona Residencial 4 (ZR4):
- No anexo I (Mapa): R$ 6.237,00
- No anexo II (planilha): R$ 4.365,90
- Imóvel no Mossunguê no Eixo Nova Curitiba (ENC):
- No anexo I (Mapa): R$ 3.520,00
- No anexo II (planilha): R$ 2.464,00
- Imóvel no Bacacheri na Zona Residencial 4 (ZR4):
- No anexo I (Mapa): R$ 1.435,00
- No anexo II (planilha): R$ 1004,50
- Imóvel no Atuba na Zona de Serviços 1 (ZS1):
- No anexo I (Mapa): R$ 814,00
- No anexo II (planilha): R$ 569,80
- Imóvel no Centro na Zona Central (ZC):
- No anexo I (Mapa): R$ 6.237,00
- No anexo II (planilha): R$ 4.365.90
Não são diferenças insignificantes. Comparados com os valores da tabela vigente, o aumento pode ser de 45% ou 107%, no caso do imóvel no Mossunguê. Ou 8% ou 89% no caso do imóvel no Eixo Conector do Portão.
Novas faixas de valores e alíquotas
Uma das principais ações da proposta do Executivo é a atualização das faixas de valores dos imóveis e suas respectivas alíquotas, que estavam extremamente defasados. A atual tabela para imóveis residenciais começa em R$ 38 mil reais. A nova começa em R$ 160 mil. Há uma redução no número de faixas e a alíquota máxima foi reduzida de 1% para 0,80%.
Pode parecer uma boa notícia, mas não é. É que essa nova atualização deve aproximar os valores venais da realidade do mercado. Segundo o Tribunal de Contas do Paraná estima-se que o valor utilizado pelos municípios do estado como base do IPTU “corresponde, em média, a 30% do valor real dos imóveis”.
Os vereadores aprovaram mesmo sem ler. Essa é a pior câmara de vereadores que Curitiba já teve.