Orçamento 2024: como a Vila Audi União foi deixada para trás

Área conseguiu entrar no Orçamento da Cidade e garantir R$ 3,5 milhões. Mas a prefeitura só gastou R$ 263 mil

Curitiba entrou na reta final da definição do orçamento anual municipal para 2024. Para a população da Vila Audi/União, a Lei Orçamentária Anual de 2024 é mais um capítulo de uma história em busca de um lugar decente para viver. Ocupação urbana formada nos anos 1990 numa área de proteção ambiental Rio Iguaçu a região abriga, segundo dados de 2012 da Cohab, 3,1 mil domicílios e 15 mil moradores.

Uma revisão dos Relatórios de Prestação de Contas e dos Comparativos da Despesa Autorizada com Despesa Realizada de 2017 a 2023 mostra que a prefeitura reservou no período R$ 3,5 milhões para a região. Mas disso, apenas 8% foram efetivamente gastos, ou seja, R$ 263 mil.

Agora no Orçamento de 2024, a prefeitura novamente se propõe a investir R$ 4.508.000,00 nas obras de urbanização do local. Esse valor, aponta o Plano de Trabalho, deve garantir a continuidade as obras de exercícios anterior e a estruturação das obras de deságue no Bolsão Audi União.

No Orçamento Anual de Curitiba a Vila apareceu em 2017 com a previsão de R$ 663.439,94 para Urbanização de Assentamentos. Ao fim do período o relatório de Prestação de Contas da Prefeitura apontou que foram gastos só R$ 263.439,94. Apesar dos 400 mil que “sobraram”em 2017, a vila desapareceu dos orçamentos municipais nos anos de 2018, 2019 e 2020.

A região só foi reaparecer no Plano de Trabalho da prefeitura e na LOA em 2021, quando foram previstos R$ 20.472,64, que segundo o relatório de prestação de Contas da prefeitura nunca chegaram a ser gastos. No ano seguinte a LOA previu R$ 2.383.000,00 para Urbanização de Assentamentos Precários na Vila Audi/ União. Novamente nada foi gasto.

As obras de urbanização da área voltaram ao orçamento em 2023, dessa vez com previsão de R$ 383.000,00. Ainda não há dados sobre o percentual de execução desses valores, mas o relatório parcial de execução orçamentária aponta que dos R$ 33 milhões previstos para o item habitação urbana (dentro do qual estavam os investimentos previstos para a Vila Audi/União), só R$ 17 milhões foram gasto entre janeiro e agosto de 2023.

Outras vilas na mesma situação

O relatório Comparativo de Despesa Autorizada com Despesa Realizada de 2022 mostra que a Vila Audi União não é um caso isolado. Naquele ano a Prefeitura de Curitiba deixou de gastar R$ 582 milhões previstos na Lei Orçamentária Anual para obras na cidade. Deste total:

  • R$ 1 milhão deixou de ser gasto na regularização fundiária de obras de infraestrutura de construção de casas e equipamentos comunitários e de recuperação ambiental
  • R$ 1,6 milhão deixou de ser gasto nas obras de habitação e infraestrutura da Bacia do Ribeirão dos Padilhas
  • R$ 4,2 milhões não foram usados nas obras de habitação e infraestrutura da Bacia do Rio Formosa
  • R$ 13,9 milhões deixaram de ser gastos em obras de saneamento, proteção, recuperação ambiental, contenção de erosão e recuperação de margens em bacias hidrográficas
  • R$ 18,8 milhões não foram usados na realização de obras de drenagem de bacias hidrográficas
  • R$ 53,9 milhões deixaram de ser gastos em obras de drenagem e de prevenção de riscos naturais
  • R$ 4,7 milhões não foram usados na desapropriação de áreas para obras de drenagem e de prevenção de riscos naturais

Relevância social e ambiental

A atuação em áreas como a Vila Audi é importante não só pelo impacto social, mas porque são áreas próximas a fontes de captação de água para a capital. O perfil da área está detalhado na tese “Da Lama ao Caos: a Urbanização de Curitiba vista do Bolsão Audi-União”, de Luiz Belmiro Teixeira, de 2019.

A história da área “começa em 1998, quando um movimento de ocupação irregular em terras até então desocupadas no bairro do Uberaba deu origem ao complexo de ocupações Bolsão Audi-União. A área com um total de 1,3 milhão de metros quadrados se encontra na bacia hidrográfica do rio Iguaçu, dentro de sua Área de Proteção Ambiental (APA), e durante décadas foi local de extração de areia para a construção civil. Quando cessaram as lavras, a região foi abandonada e sobraram apenas as cavas, sendo que muitas delas se transformaram em lagoas, devido às chuvas e às cheias do rio. As ocupações se deram ao longo do rio Iguaçu, entre a BR 277 e o ramal ferroviário Engenheiro Bley, próximo à divisa com o município de São José dos Pinhais, pelo ramal ferroviário e pela Avenida Comendador Franco que faz a principal ligação de Curitiba até o aeroporto”, diz Teixeira.

Incluída no Programa de Aceleração do Crescimento 1 (PAC 1) em 2011, a região recebeu obras de infraestrutura e prevenção de enchentes no valor estimado de R$ 38 milhões. A área é extremamente suscetível a alagamentos por conta da proximidade com as cavas do Iguaçu. Além disso, o perfil da população local é de jovens e crianças em situação de vulnerabilidade.

A Vila Audi União tem uma “população predominantemente jovem, com 64,14 % de pessoas na faixa etária entre 0 e 30 anos de idade,26 uma parcela significativa em idade economicamente ativa, principalmente no período de inserção no mercado de trabalho. Este quadro pouco se alterou desde a época em que foi elaborado o PTTS; o que torna o bolsão uma das áreas da cidade com maior número de crianças vivendo em meio à pobreza, indicador importante para avaliar o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) municipal”, descreve Teixeira.

Sobre o/a autor/a

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

O Plural se reserva o direito de não publicar comentários de baixo calão, que agridam a honra das pessoas ou que não respeitem níveis mínimos de civilidade. Os comentários são moderados por pessoas e não são publicados imediatamente.

Rolar para cima