Quadrinista Chantal Montellier fala da resistência contra o machismo

Em entrevista ao Plural, quadrinista francesa fala sobre o sexismo no meio francês de HQs e sua relação com as bruxas

Chantal Montellier é um dos nomes mais importantes dos quadrinhos franceses nos últimos 50 anos e estará em Curitiba no dia 8 de Setembro, para a Bienal de Quadrinhos. Aos 76 anos, a artista precisou de resiliência e enfrentamento para enfrentar o machismo e publicar suas histórias.

Autora do livro “Bruxas, minhas irmãs” (Veneta), Montellier esteve na vanguarda com outras quadrinistas mulheres na França quando integrou a equipe da revista “Ah! Nana”, fundada em 1976. A revista, como Montellier, era disruptiva e tinha posicionamentos políticos em favor dos direitos das mulheres. O que incomodou muita gente.

Bienal de Quadrinhos

“Quando comecei a publicar quadrinhos para ‘Ah! Nana’, praticamente não havia mulheres desenhistas”, diz Chantal Montellier, em entrevista ao Plural. “Cartunista da imprensa política, fui – sozinha – pioneira desse gênero. O sexismo, no início dos anos 70, era muito forte nessa área, e as feministas da época, geralmente da universidade, que tinham maior exposição pública e influência, tinham pouca consciência do que acontecia nessa área. Eu estava isolada e numa situação de grande vulnerabilidade… Em 1976, a quase totalidade das mulheres quadrinistas ou ilustradoras estava ainda isolada na imprensa jovem ou na publicidade.”

Resistência

Depois das primeiras publicações, a artista entrou em listas políticas de censura e perseguição. Também sofreu ataques, insultos, foi vítima de ameaças sexuais e teve convites para eventos cancelados.

“‘Ah! Nana’ mexeu com as coisas, mas logo foi reprimido pela censura, que proibiu sua exibição nas bancas por uma suposta ‘pornografia’, que não existia. A publicação se tornou invisível e morreu em completa indiferença, e as mulheres que foram publicadas tiveram que voltar a brincar na sua ‘caixa de areia’. Hoje, as coisas mudaram, as mulheres são mais numerosas e ousam abordar temas que perturbam a ordem dominante e suas hierarquias sexistas e sociais”, diz Montellier.

Bruxas, minhas irmãs

Maryse Condé (autora de “Eu, Tituba: Bruxa negra de Salém”) e o historiador Jules Michelet (autor de “Bruxa – De Circe às Bruxas de Salém”) são duas das pessoas que inspiraram Chantal Montellier a criar a HQ “Bruxas, minhas irmãs”.

O livro conta histórias de mulheres que, por fugirem da representação feminina esperada, foram consideradas bruxas e sofreram as consequências disso. Condé e Montellier se conheceram pessoalmente porque publicaram pela mesma editora na França e foi nessa conversa que Montellier leu “Eu, Tituba”. Uma das histórias do livro de Montellier é diretamente inspirada na obra de Condé.

Leia também: Sobre como descobri Silvia Federici e uma nova história das mulheres no livro “Calibã e a Bruxa”

Por outro lado, há outras personagens que foram criadas a partir das próprias experiências da autora. A ficção se mistura com a história pessoal de Montellier, que não ocupou o lugar destinado a ela quando começou a desenhar.

“Minha situação era bastante desconfortável no meio muito segregado social e politicamente dos quadrinhos franceses”, diz a autora. “Fui banida e até ‘queimada’ em praça pública na capital da nona arte, o que me aproxima das ‘feiticeiras’ e de seus destinos.”

Serviço

A Bienal de Quadrinhos de Curitiba vai de 7 a 10 de setembro, sempre das 11h às 20h, no Museu Municipal de Arte – MuMa (Av. República Argentina, 3430, Terminal do Portão). Todas as atividades são gratuitas. Outras informações no site bienaldequadrinhos.com.br e no perfil @bienaldequadrinhos no Instagram. A programação completa pode ser conferida aqui.

A entrevista com Chantal Montellier foi gentilmente traduzida do francês pelo professor Marcelo Fernando Lima (UTFPR) e pela tradutora Roseane Rezende de Freitas, especial para o Plural.

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