Para roteirista Sirlene Barbosa, HQs têm papel fundamental na educação

Autores da HQ sobre a escritora Carolina Maria de Jesus estarão na Bienal de Quadrinhos de Curitiba

“Precisamos continuar falando de Carolina Maria de Jesus, dentre outras e outros escritores pretos, para mostrar aos estudantes, sobretudo de escolas públicas, que não são somente pessoas que parecem inalcançáveis que escrevem”, diz a educadora Sirlene Barbosa que, junto de João Pinheiro, criou a obra “Carolina” (Editora Veneta, 2016), que conta parte da vida da autora de “Quarto de Despejo”, em quadrinhos.

Barbosa e Pinheiro estarão presentes na 7ª edição da Bienal de Quadrinhos de Curitiba, que ocorre entre 7 e 10 de setembro, discutindo a obra, narrativas decoloniais e as HQs como ferramenta importante na educação brasileira.

Criação de “Carolina”

Em 2013, durante a pesquisa de mestrado, Barbosa, que é professora da rede municipal de ensino de São Paulo, notou que não havia praticamente nenhuma autora ou autor preto nos livros didáticos das escolas. “Eu percebi que Carolina de Jesus poderia estar naqueles livros, que talvez ela fosse uma resposta para aquela ausência de pessoas pretas.”

Foi quando Barbosa passou a ler e pesquisar todo o material que havia disponível, na época, sobre a escritora: biografias, obras autorais, pesquisas acadêmicas. Em dezembro daquele ano, chamou Pinheiro para a empreitada: contar parte da vida de Carolina Maria de Jesus em quadrinhos. “Como professora de português, sabia que leituras verbais e visuais, sobretudo, são de suma importância.”

As pesquisas foram se aprofundando e, em janeiro de 2015, os dois foram à cidade natal de Carolina, Sacramento, em Minas Gerais. Entrevistaram uma das filhas dela, Vera Eunice de Jesus Lima, acessaram materiais originais, fotos e diversos objetos da escritora. “Ela foi uma mulher tão forte, mãe solo de três crianças dentro de uma favela que ficava à margem do Rio Tietê. Mulher honestíssima e muito trabalhadora.”

Trecho da HQ “Carolina”. Imagem: Divulgação

Para Barbosa, que também é doutoranda em Educação na Universidade de São Paulo (USP), é fundamental que os quadrinhos, com sua gramática própria, tragam histórias de personagens pretos e falem sobre racismo e decoloniedade, pois eles têm potencial de atingir diversas camadas da sociedade.

“O Brasil tem uma história de quase 400 anos de escravização do povo preto e, depois de assinar a Lei Áurea, não possibilitou que essas pessoas que foram sequestradas da África e aqui escravizadas tivessem acesso à educação, à cultura, ao lazer, à saúde, ao emprego e à moradia. Isso afeta nossa sociedade até hoje. As pessoas que estão na rua em situação de miséria, as que mais tiveram problemas na pandemia, as que fazem o trabalho mais pesado recebendo menos, todas elas têm cor”, diz Barbosa.

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Essas marcas da escravização, segundo a professora, perpassaram Carolina Maria de Jesus como mulher preta, neta e filha de ex-escravizados. “Se o Estado tivesse olhado para essa questão com outros olhos não estaríamos falando que Carolina precisou escrever depois de um dia maldito de trabalho, de muito cansaço, de não saber se ela e os filho iriam comer. Mas mesmo assim ela chegava em casa e escrevia, sem mesa, cadeira ou energia elétrica. Ela não precisava ter passado por isso, mas o Estado fez com que ela passasse. E passou de uma forma que deixou sua literatura. Por isso eu e João sempre reiteramos: Carolina é escritora. Depois podemos falar de todo o resto.”

“Carolina” na Bienal 

A HQ “Carolina” foi indicada ao prêmio Jabuti, em 2017 e, dois anos depois, venceu prêmio francês Angoulême, considerada a maior honraria na área de quadrinhos da Europa. A obra também foi lançada na França e no Peru, em 2018 e 2022, respectivamente.

Exposições
  • Exposição “Carolina”, de Sirlene Barbosa e João Pinheiro, fica em cartaz até 29 de setembro no Centro Cultural Sistema FIEP (Rua Paula Gomes, 270, Edifício Dr. Celso Charuri, São Francisco, Curitiba). De segunda a sexta, das 9h às 18h.
  • Exposição “Carolina”, de Barbosa e Pinheiro, fica em cartaz até 29 de setembro no Centro Cultural SESI Pato Branco (Rua Xingu, 833, Amadori, Pato Branco). Visitas devem ser agendadas pelo WhatsApp: (46) 98801-2273.
Quinta-feira (7)
  • Sessão de autógrafos às 17h30.
  • Entrevista “Mina de HQ” às 14h30, no palco Ocupa.
Sexta-feira (8)
  • Conversa “Gibiteca HQ Brasil: Quadrinhos e a Língua Portuguesa”, às 13h30, na Casa de Leitura Wilson Bueno. Com Fulvio Pacheco, Marcio R. Garcia e Sirlene Barbosa. Mediação de Igor Trabuco.
Sábado (9)
  • Conversa “Escrever quadrinhos: pesquisa e roteiro”, às 14h no Auditório Antonio Carlos Kraide. Com Carol Sakura, Mylle Pampuch, Sirlene Barbosa e Triscila Oliveira. Mediação de Liber Paz. Acessível em Libras.
  • Conversa “Narrativas brasileiras no exterior: Angola, Janga, Carolina e Morro da Favela”, às 17h30 na Casa de Leitura Wilson Bueno. Com João Pinheiro, Marcelo D’Salete e Sirlene Barbosa. Mediação de Pedro Brandt. 

Bienal de Quadrinhos

A 7ª edição da Bienal de Quadrinhos de Curitiba vai de 7 a 10 de setembro, sempre das 11h às 20h, no Museu Municipal de Arte – MuMa (Av. República Argentina, 3430, próximo ao Terminal do Portão). Todas as atividades são gratuitas. 

Outras informações podem ser encontradas no site da Bienal. A programação completa pode ser conferida aqui.

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