Isolamento social 190 e tantos

Querido diário: num jardim próximo, aqui no bairro, encontrei essa flor que me arrastou pra 1985 como um DeLorean instantâneo. Sabe quando você lembra de algo que você não se lembrava que lembrava? Pois então, essa florzinha estava na minha vizinhança em Joinville e tinha várias delas no caminho até a minha escola.

Você está caminhando no seu bairro, mascarado por causa do Covid (ao contrário dos outros homens na sua cidade) e, por causa de uma flor, agora você também caminha quando era criança. Eu e o eu-criança, o eu-hoje e o eu-1985 começaram a caminhar um do lado do outro.

– Como você está?

– Tudo bem, apesar de que escola é chato demais.

– Você vai continuar achando isso.

– Tu não gosta de aprender?

– Eu adoro aprender, mas tem lugar criado pra isso que mais atrapalha do que incentiva.

– Ano que vem eu me mudo pra Curitiba.

– É, muda mesmo. Tá com medo?

– Meus amigos são daqui, da rua, não vou mais ver eles.

– Até porque eles também vão se mudar.

– Pra Curitiba?

– Eu não sei pra onde, cada um prum canto. É estranho pensar que todos os amigos que a gente tem num momento da vida, que eram tão significativos, somem e você só lembra deles quando vê uma florzinha num jardim do bairro.

– Credo.

– O quê?

– Eu falo desse jeito no futuro?

– Só quando você quer impressionar pessoas que vão ler o que você escreveu.

– Você escreve isso pros seus amigos?

– …tipo isso.

– Tá… A menina da escola.

– Sim.

– Até o final do ano, antes de mudar, será que eu vou conseguir…?

– Não, não vai.

– Nunca mais vejo ela também?

– Quando você olha pro passado, você vê. E ela continua sendo eternamente seu primeiro amor.

– Tá bom. Tu me visita de vez em quando?

– Pode deixar. Fique bem e não mexa com os cachorros da esquina à noite.

– Pode deixar.

Nos afastamos, cada um volta pro seu tempo. Cada um terá que lidar com o tempo da sua maneira. Voltaremos a nos encontrar.

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