Nos últimos dias nos deparamos com a reprodução massiva de um áudio vazado por um grupo de homens no WhatsApp, cuja autoria pertence a um deputado paulista, ao qual eu dispenso grandes apresentações, e que violentamente referenciava-se às mulheres ucranianas como “lindas e fáceis, por serem pobres”, mais repugnante ainda são os termos escatológicos também proferidos neste áudio. E claro que é chocante, ofensivo e depreciativo, mas não é surpreendente. Pelo menos não para nós, mulheres de todas as classes, raças e lugares, pois sentimos na pele as violências que o machismo impõe nas sociedades patriarcais, onde a misoginia se manifesta de diversas formas.
“Essas cidades mais pobres são as melhores.”
A opinião repulsiva do assediador em questão soa como um soco no estômago se for lida em voz alta, mas é também a exemplificação dos indicadores que apontam a desigualdade social como principal fator de risco para a violência contra mulheres, segundo revela a Organização Mundial da Saúde (OMS) . Não é coincidência que a Ucrânia, mesmo diante do atual cenário, sem qualquer grau de empatia, suas mulheres sejam vistas como objetos. A desumanização do corpo feminino é cruel e inaceitável em qualquer contexto. Como bem escreveu Jamil Chade, em texto recente no Uol: “Ao longo da história, a violência sexual é uma das armas de guerra mais recorrentes para desmoralizar uma sociedade. Ela não tem religião, nem raça. Ela destrói. Demonstra o poder sobre o destino não apenas das vidas, mas também dos corpos e almas.” A fragilização imposta a todos durante um conflito armado, cujo poder se concentra em quem tem as armas, é ainda mais pesada sobre as mulheres.
“Não tem mulher assim no Brasil, não chega aos pés da fila das refugiadas aqui.”
Esse comportamento vergonhoso é o reflexo da objetificação do corpo feminino e tem consequências graves e danosas como a estereotipação e a criação de padrões estéticos irreais que mutilam e matam mulheres todos os dias, na busca por satisfazer fantasias de homens com comportamentos condenáveis como o deste aqui citado. A objetificação também esvazia a mulher de sua subjetividade e vontade própria, enxergando-a como submissa à vontade masculina, exatamente como Arthur do Val enxerga as refugiadas ucranianas.
A fala do deputado ocorreu às vésperas do 8 de março, Dia Internacional da Mulher. É neste dia que as mulheres se unem para ir às ruas manifestar sua potência política e reivindicar o fim da violência em todas as suas formas, principalmente a violência perpetrada pela fala do deputado.
Pela vida das mulheres e pela desconstrução do machismo, é fundamental que este comportamento não seja naturalizado. Que os eleitores e eleitoras deste homem repensem sobre o representante que escolheram eleger, pois ignorar este fato é dar um aval para essas violações. Episódios como esses reforçam a importância da luta feminista para combater e superar toda forma de opressão e violência que ainda existe sobre nós, mulheres de todos os lugares do mundo.
Sobre o/a autor/a
Professora Josete
Estudou a vida toda em instituições públicas, formou-se em Biologia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), onde também especializou-se em Organização do Trabalho Pedagógico. Trabalhou como bancária, no extinto Banestado e, partir de 1985, iniciou carreira na Rede Municipal de Ensino de Curitiba. Integrou a equipe que fundou o Sindicato dos Servidores do Magistério Municipal de Curitiba (Sismmac). Foi presidente do sindicato e dirigente estadual da Central Única dos Trabalhadores (CUT). Filiou-se no Partido dos Trabalhadores em 1990 e foi eleita vereadora pela primeira vez em 2004, reelegendo-se em 2008, 2012, 2016 e 2020.