Ela entra pela porta, ele estava só pele e osso. Tinham chegado à um bar notável de Buenos Aires. Era uma esquina das tantas esquinas com prédios para se admirar ou para admirar ela.
Na capital portenha existe a Comissão de Proteção e Promoção dos Botecos (tradução livre e bêbada). Dá inveja pra bebum de qualquer país. A lei 35 diz que ”se considera um bar notável aqueles cuja atividades culturais, antiguidade ou relevância local lhe outorgam um valor próprio”. Que coisa linda pensar que se vale em razão diretamente proporcional à alegria que se proporciona para a cidade durante o tempo. São 82 bares ao todo até agora e se contar que muitos tem mais de um século de vida não se sabe número de garrafas abertas desde então.
Se conheceram numa quinta-feira em um bar notável, decidiram que quinta feira seria o dia notável deles e por isso estavam lá enquanto eu tomava notas de tudo.
Quanto tempo faz que a gente se conhece?- ela perguntou. Parece tanto, mas na verdade não é. Acontece que o que venho sentindo por você é como a lei 35: teu olhos te outorgam um valor próprio e meu sentimento aumenta conforme o brilho do teu olhar proporcionando alegria durante um tempo que parece não passar.
Você me conhece, te conheço. Ele disse. Sim, te conheço saindo do interior e amando a capital com esses olhos brilhantes. Te conheço insegura, incerta e apaixonada pela vida. Porque eu mesmo já fui esse menino. Te conheço se apaixonando pela lei 35. No mesmo momento em que dizia isso sentado à mesa se deu conta do porque ela lhe era tão notável. Foi ali mesmo, a comida esfriando, olhando ela nos olhos, o vinho na taça, que ele percebeu que a amava. Mas não dava pra dizer isso assim tão rápido e por isso se calou por um segundo. Era nascido em 82 e já dava para saber que há que se esperar um pouco. Então só pôde dizer, sem mencionar, que sabia o motivo dela ser tão importante para ele. Foi o primeiro caso notável em que um homem descobre ao vivo que ama uma mulher enquanto a olha nos olhos.
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