Orquestrar é ser rico em possibilidades

Imagine uma música orquestral e ouvirá na sua cabeça um som. Agora imagine reorganizar esse som

Orquestrar é um verbo polissêmico. Mesmo que seu primeiro significado seja relativo à música, no dia a dia orquestrar dialoga com tudo aquilo que fala sobre organizações grandiosas e bem-sucedidas. 

Entrei no Michaelis Online e digitei: orquestrar. Encontrei quatro definições, as duas primeiras musicais, as duas últimas, figurativas, diziam: “Juntar(-se) de maneira harmoniosa e ordenada; combinar(-se), harmonizar(-se)”. “Programar a realização de algo, de modo articulado”.

Harmonioso e articulado são adjetivos muito peculiares neste contexto, porque são palavras que também dialogam com música. Harmonia é o nome dado a um tipo de organização dos sons. Uma organização vertical, de simultaneidade. Articulação é a como caracterizamos a maneira que tocamos. Os sons podem ser curtos, acentuados, marcados, tenutos e/ou ligados, citando alguns exemplos do que chamamos de articulação. 

Acontece que quando pensamos em orquestração não imaginamos orquestrações que possam soar desconexas, sem sentido objetivo, confusas. Sempre esperamos que algo orquestrado seja grandioso, organizado de maneira regular, onde movimentos não se atropelam e conseguem construir uma narrativa causal no tempo. Então, quando vamos a um concerto e ouvimos uma música que não funciona assim, achamos estranho.

O modo como as orquestrações foram feitas inicialmente construiu ao redor da palavra um significado além da organização relativa aos instrumentos da orquestra. No ouvido de muitos, orquestrar é uma forma específica de organizar os sons, as ideias. E essa forma foi construída muito tempo atrás, com ideais estéticos identitários de um povo que chamou isso de arte, de belo, harmonioso e articulado. 

Entretanto, o trunfo da arte é mudar.

Imagine uma música orquestral e ouvirá na sua cabeça um som. Agora imagine reorganizar esse som. Mudar funções, trocar timbres, espalhar as notas diferentemente no tempo, no espaço e nas pessoas. Experimente tirar a melodia dos violinos, experimente tirar a melodia, experimente.

A beleza da diversidade é poder mudar de ideia, considerar. Talvez já não nos faça mais sentido compor música para orquestra pensando na ideia tradicional de orquestração. Mas e se organizássemos uma desorganização?! Criar novos sistemas, onde os caminhos não são óbvios, não se repetem, nos fará ter novas histórias. 

Se na literatura entendemos e valorizamos obras que se permitem reordenar, como por exemplo o Jogo da Amarelinha de Cortázar, precisamos perceber que narrativas não lineares estão em todo lugar. Inclusive na música orquestrada.

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