Dez anos depois, Curitiba enfim terá feriado no Dia da Consciência Negra

Cidade aprovou feriado em 2012, mas Associação Comercial conseguiu derrubar lei na Justiça

Para quem mora em Curitiba, 2024 será a primeira vez que o Dia da Consciência Negra será celebrado com um feriado. O dia da morte de Zumbi dos Palmares já era feriado em vários estados e cidades – mas em Curitiba, a mesquinhez da Associação Comercial do Paraná impediu que uma lei do gênero, que chegou a ser aprovada na Câmara Municipal, passasse a valer exatos dez anos atrás.

Edson Ramon, um empresário que mais tarde se relevaria (para surpresa de zero pessoas) um bolsonarista, comandava a Associação Comercial na mesma época em que a Câmara, depois de derrubar João Claudio Derosso, vivia um breve momento de respiro democrático. Paulo Salamuni comandou a votação e o projeto aprovado pelo então vereador Clementino Vieira foi aprovado.

Herdeiros de uma instituição fundada por um abolicionista, o Barão do Serro Azul, os diretores da ACP teriam o dever cívico de seguir a tradição de seu patrono e aplaudir a iniciativa da cidade. Eles sabem (todo mundo sabe) que as ruas onde ficam as lojas centrais de Curitiba foram construídas com suor e sangue de negros. Mas quando apareceu para falar em público, o presidente da Associação não disse nada sobre reparação, sobre humanismo, nem sobre os negros. Suas perguntas tinham a ver com o bolso. E o PIB? E as vendas?

Como sempre é possível se fazer nesses casos, acharam um impedimento legal para que a cidade tivesse mais um feriado municipal – apesar da vontade da população, demonstrada por meio de seus legisladores, a ACP recorreu à Justiça (repita-se, por mera mesquinhez) e venceu.

Mas o Movimento Negro é maior do que a Associação Comercial do Paraná. Demorou dez anos, mas agora, sob a Presidência de Lula (alguém imagina Jair Bolsonaro tomando essa atitude?) o feriado da Consciência Negra se tornou nacional. E mesmo aqueles cuja pele se eriça ao ter de pensar que o PIB do Brasil, tanto o de ontem quanto o de hoje, e principalmente o futuro, dependem majoritariamente do esforço de homens e mulheres negras, vão ter um dia inteiro por ano para pensar sobre isso.

Um adendo: Edson Ramon, hoje presidente de um certo Instituto Democracia e Liberdade, escreveu há cerca de um ano no jornal mais à direita da cidade (aquele) sobre a eleição de Lula – o responsável pelo novo feriado. Estava contrariadíssimo, claro.

Depois de dizer que não valia a pena falar do 8 de janeiro (segundo ele havia “inúmeras controvérsias sobre a autoria dos atos”, afirmava que era preciso agir para manter o governo Lula na rédea curta.

“É preciso manter as lideranças empresariais e todas as forças de direita em estado de alerta total. Não vamos aceitar retrocesso na legislação trabalhista e nas políticas públicas que vinham melhorando os indicadores econômicos do Brasil.”

Em dez anos, o mundo mudou bastante. Mas tem gente que não mudou nada.

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