Ser bissexual é ser apagada o tempo todo

Foram anos escondendo e pensando que eu nem precisava tocar no assunto. Mas eu preciso, sim.

Eu vivo com uma constante sensação de não-pertencimento. Na mais nova discussão das redes sociais, eu estou no grupo de pessoas que não se identifica nem como Millennial, nem como Geração Z. Não sou negra, mas também não sou branca. Não sou hétero, e não sou lésbica.

No caso dos dois primeiros, é mais situacional. Não vai importar o quanto eu me posicione, o quanto eu bata meu pé e fale como eu me vejo dentro de cada uma dessas caixinhas. A única coisa que vai importar é a visão de quem está falando comigo: meu ouvinte já me colocou na caixa que ele acredita ser a real e não importa o quanto eu argumente, não importam os fatos que eu apresente, a caixinha que ele escolheu muito – e põe muito nisso – dificilmente vai mudar.

E eu já aceitei isso.

Costumava ser uma coisa que me incomodava muito, especialmente em relação à raça. Mas eu aprendi a moldar meu discurso pra cada grupo e pra cada caixinha que eu sei que a pessoa já me colocou.

Por outro lado, não posso aceitar isso do último.

Foram anos escondendo e pensando que eu nem precisava tocar no assunto, que não ia fazer diferença e não ia mudar nada pra ninguém. Mas eu preciso, sim.

É como tirar foto tomando vacina: gera um senso de coletividade e vai fazer a diferença nem que seja pra uma única pessoa. Mas pra essa única pessoa vai importar.

Ser bissexual é viver uma provação constante. As caixinhas não funcionam, e as pessoas sabem disso, porque existe toda uma outra caixinha que elas não querem abrir.

Ao se assumir bissexual, você na mesma hora deixa de ser confiável pra se relacionar.

Se você sai com mulheres, vão dizer que é uma fase, que é só pra aparecer, que se você for ficar com um homem é só porque “é mais fácil”.

E, se você for uma mulher bissexual, você ainda vai virar fetiche pra alguns.

Se você sai com homens, você imediatamente entra na caixinha da heterossexualidade e vão assumir que você ilude todas as mulheres com quem você já saiu ou vai sair.

Ser bissexual é ser apagada o tempo todo. É sempre precisar provar que todos os seus sentimentos são válidos, que as pessoas podem confiar em você.

No mês do orgulho, eu quero me orgulhar de quem eu sou. Quero assumir essa caixinha, bater meu pé e ser ouvida e respeitada. E quero fazer isso publicamente, pra quem sabe assim alguém perceber que não está sozinho.

Estamos aqui e sempre estivemos. O que sentimos e desejamos é real, não é uma fase de rebeldia ou fetiche. Nossa caixinha merece tanto espaço de orgulho e luta quanto as outras.

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