Entidades são contra militarizar 200 escolas públicas no PR

Ratinho Jr enviou proposta ao Legislativo há uma semana; hoje, deputados aprovaram urgência para votar o PL

Vinte e sete entidades atuantes no direito à educação no Paraná assinaram uma nota pública contra o projeto do governador Ratinho Jr (PSD) que quer transformar 200 escolas públicas – cerca de 10,5% das 2,1 mil escolas – em Colégios Cívico-Militares. A proposta é baseada em um programa do governo federal que visa instituir o chamado “Programa Cívico-Militar” na Rede Estadual de Educação Básica.

No documento, as entidades pedem a retirada da proposta e afirmam que o governo não dialogou com as organizações competentes que devem tratar do assunto. Entre elas estão a própria sociedade civil, representantes de professores e estudantes, além de órgãos colegiados que atuam na Educação Pública.

Na manifestação, o grupo argumenta que a lei estadual não pode ser aprovada diante do momento de crise sanitária que o Estado vive. Na visão das entidades, o investimento do governo estadual deveria estar focado em aspectos mais urgentes para o ensino, como a pesquisa e o planejamento para um gradual e seguro retorno às aulas presenciais.

De acordo com a nota, o governo não esclarece em que medida a presença militar em escolas de regiões socialmente vulnerabilizadas será capaz de alavancar a Educação Básica, valorizar docência e melhorar a qualidade de ensino.

O investimento extra-anual por escola militar de até mil alunos é de cerca de R$ 1 milhão, com recursos financiados pelo Ministério da Educação, mas com contrapartida financeira do Estado para cobrir os demais gastos regulares, que superam essa cifra.

Regras autoritárias

Para a vice-presidente da Associação Nacional de Juristas pelos Direitos Humanos LGBTI (ANAJUDH), Lígia Ziggiotti, o projeto de Ratinho é uma continuidade das ideias impostas no Escola Sem Partido – proposta rejeitada no ano passado e que limitava a atuação dos professores.

De acordo com dados mapeados pelas entidades que assinaram o manifesto, 643 municípios, em 16 estados, aderiram ao Programa Nacional de Implantação de Escolas Cívico-Militares. Lígia acredita que os números mostram que o projeto de Ratinho é ambicioso e vai “institucionalizar a presença de militares nas escolas”. Ela também destaca que os colégios impõem uma série de regras consideradas autoritárias.

Ligia descreve que nas escolas militares há uma separação entre meninas e meninos, e crianças e adolescentes que não vivenciam a forma hegemônica de gênero são discriminadas. Além disso, nas escolas há outras proibição como cabelo crespo solto, batom, [cabelo] black power, abraço é punido com advertência, uso de gíria, entr outras vedações.

A advogada argumenta que “ao contrário do que a proposta legislativa defende, não há evidências que permitam sustentar ser positiva a presença militar em colégios das periferias das cidades paranaenses”. Para ela, “uma escola que adote a disciplina militar e a obediência hierárquica irrefletida como os valores orientadores da gestão pedagógica, certamente causa efeitos nocivos à liberdade de cátedra, à diversidade, ao pensamento crítico e, consequentemente, à educação democrática”.

Ligia sustenta que o projeto “fere princípios constitucionais caros ao Estado Democrático de Direito brasileiro, como a liberdade de expressão e de cátedra, o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas, a inviolabilidade da intimidade e da vida privada, o respeito aos direitos humanos e a gestão democrática da escola”.

Com isso, a ANAJUDH e outras 26 entidades estão pedindo para que os deputados da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) retirem a proposta da pauta. O projeto de Ratinho Jr está na Alep desde a última segunda-feira (14).

Regime de urgência

Sete dias depois de chegar ao Legislativo, a proposta do governador já entrou na pauta dos deputados estaduais. Nesta segunda-feira (21), a matéria já começou a ser analisada nas comissões temáticas e foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

No entanto, na Comissão de Finanças e Tributação da Casa, o deputado Arílson Chiorato (PT) pediu vista (revisão) do parecer favorável de Delegado Jacovós (PL). Na Comissão de Educação, o parecer do relator da matéria – líder do governo, deputado Hussein Bakri (PSD) – teve pedido de vista do deputado Professor Lemos (PT).

Apesar dos pedidos, o deputado Hussein Bakri fez um requerimento à Mesa Executiva da Alep – aprovado com 37 votos a favor e sete contra – para que o PL tramite em regime de urgência. Com isso, o projeto volta à pauta das comissões temáticas na terça-feira (22).

Antes da sessão, o presidente da Assembleia Legislativa, deputado Ademar Traiano (PSDB), afirmou que o secretário de Estado da Educação e do Esporte, Renato Feder, reuniu-se com os parlamentares para expor os principais pontos do projeto de lei 543/2020. Para Traiano, quem tem que decidir sobre colégios militares são os pais e alunos das escolas e não “somente o professor sobre a sua vontade”.

O presidente ainda destacou que “não vai se militarizar as escolas, é uma nova modelagem que terá a gestão da Polícia Militar, mas os professores serão os mesmos com um novo momento, em que toda a parte organizacional vai acontecer e a gestão será, claro, da área militar, até se pensando na disciplina e na hierarquia”.

Em pronunciamento na sessão remota da Alep, o líder do governo, deputado Hussein Bakri afirmou que o projeto extrapola as divisas políticas e ideológicas. “Quantos pais não sonham com seus filhos uniformizados em um colégio militar? E isso está sendo proporcionado meus amigos, principalmente levando em conta a possibilidade do governo aportar recursos para essa efetivação.”

Quem assina a nota contra o PL 543/2020:

Associação Nacional de Juristas pelos Direitos Humanos LGBTI (ANAJUDH)

Ação Educativa

Campanha Nacional pelo Direito à Educação

Plataforma Brasileira de Direitos Humanos (DHESCA BRASIL)

Terra de Direitos – Organização de Direitos Humanos

APP – Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do PR

Rede Escola Pública e Universidade (REPU)

Justiça Global

Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES)

Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED)

Grupo Dignidade – Pela Cidadania de Gays, Lésbicas e Trans

Aliança Nacional LBTI+

Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (FINEDUCA)

Instituto Brasileiro Trans de Educação (IBTE)

Conselho Permanente em Direitos Humanos do Estado do Paraná (COPED)

Liga Brasileira de Lésbicas (LBL)

Rede Nacional de Ativistas e Pesquisadoras Lésbicas e Bissexuais (Rede Lésbi Brasil)

Núcleo de Estudos e Pesquisas em Diversidade Sexual da Universidade Federal de Maringá (NUDISEX)

Comitê Latino-Americano e do Caribe para Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM BRASIL)

Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE)

Fórum Popular de Educação (FEPE/PR)

Sindicato dos Servidores do Magistério Municipal de Araucária (SISMMAR)

Fórum Paranaense de Educação de Jovens e Adultos

Observatório do Ensino Médio da Universidade Federal do Paraná

Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES)

Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (CEDECA CEARÁ)

Transgrupo Marcela Prado (TMP)

Sobre o/a autor/a

5 comentários em “Entidades são contra militarizar 200 escolas públicas no PR”

  1. Eu conheci vários alunos vindos da Escola militar de Curitiba e tambem do CPOR. Notava-se a boa formação destes quando iniciaram as provas. Durante as aulas, eram bastante disciplinados. Só deve ser este povinho de esquerda que está pondo gosto ruim nestas escolas.
    Vi perguntas de questionamentos, se se conhece a cultura local. O que tem a ver uma coisa com outra. Os alunos saem destas escolas razoavelmente preparados nos principais asuntos que terá que ter conhecimento pelo restante da vida profissional. Pois hoje qualquer coisa que ncessitamos, que precise “um pouco” de tecnologia, precisamos de importar. Ou ainda: tem pessoa que é contra, não por achar tecnicamente inviável. É contra, por que é uma promessa de campanha de JAIR BOLSONARO. É bom este povo de esquerda achar outras coisas para criticarem, porque o cara vence a próxima com certeza, pelo andar da carruagem.

  2. Simples mesmo é a forma como o brasil está voltando à idade média.. enquanto em outros países desenvolvidos a busca é por mais diálogo e menos discriminação, por escolas inclusivas e abertas, no brasil teremos escolas militarizadas – porque já não basta o tanto violência que as crianças sofrem em casa e na rua – e separação entre meninos e meninas… é tão chocante que fico sem palavras.

  3. Interessante seria consultar a populacao se ela gostaria de matricular seu filho numa escola pública normal ounnuma escola pública militarizada. Simples assim.

    1. Rosiane Correia de Freitas

      Silvio, parece ser simples, mas dada a restrição de recursos disponíveis, não é bem assim. Investir em novas escolas quer dizer ter menos dinheiro para as existentes. Ainda mais numa crise econômica que está reduzindo significativamente a receita do Estado.

    2. A população não deveria ser consultada de nada sem antes ter um debate sobre isso e que fosse bem esclarecido tudo. Mas é tudo na correria e a população se deixa enrolar como sempre, estamos no Brasil, meu caro!

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