O fim do podcast Sine Ira et Studio

Em breve, voltarei a escrever, mas pensando principalmente nos jovens. Espero que o Plural continue me acolhendo

Quando soube o que havia acontecido com o jornalista Rogerio Galindo naquele que era então o maior jornal do Estado, pensei em uma forma de manifestar minha solidariedade. Mas quem era o jornalista e quem eu era colocava-me em uma posição difícil, tamanha a distância de importância dele como repórter e como colunista e eu, um mero comentarista de assuntos sobre Educação no mesmo jornal, onde eu assinava um blog. Mas, enfim, fiz o que estava ao meu alcance fazer: afastei-me do dito jornal e disse para a assessoria de imprensa que até hoje veicula meus textos em jornais de todo o país que naquele jornal eu não queria, nunca mais, ver um texto meu publicado.

Fiz e anunciei o que fiz, não para obter qualquer reconhecimento pelo gesto, mas para tentar mostrar às pessoas que, diante das injustiças e das calhordices, é preciso fazer escolhas e assumir posições. Se havia uma pretensão na minha atitude era a de afirmar que qualquer um, por menor importância que se pudesse ter no cenário cultural da cidade e do Estado, poderia assumir sua cota de responsabilidade naquele momento no qual todos viam parte da imprensa escancarando suas posições ideológicas, mesmo que mal travestidas com a denominação de “notícias” e de “informação”.

Pouco depois surgiu o jornal Plural e veio o convite de Galindo para que eu produzisse o primeiro podcast do novo veículo. Na verdade, eu havia postado na minha rede social que estava organizando um podcast, mesmo sem saber, na época, exatamente como funcionava essa nova mídia, mas desde logo, empolgado com as suas possibilidades. E então veio o convite, que eu aceitei de pronto, antes de pensar, afinal, o que eu teria para dizer em um podcast semanal. Mas não demorei a saber o que queria realizar: uma coluna falando sobre coisas que pudessem ser lidas por gente não consumida nem pela ira e nem pelo rancor e que fosse capaz de discutir minhas ideias com outras ideias, no meio tom que sempre caracterizou minha personalidade, exceto naqueles momentos dos quais me arrependo e me envergonho. Ou seja, a versão que considero a melhor que possuo, fala pausadamente e mede as palavras, estuda muito e pensa bastante antes de dizer. Como diz a expressão do historiador romano Tácito: sem raiva e sem favor. Sine ira et Studio. Seria o nome do podcast.

Rogerio aceitou de pronto a minha ideia e só ponderou sobre a minha pretensão de escrever um texto por semana. É que eu não fazia ideia da dificuldade de fazê-lo. Mas fiz. Ao longo desses quase cinco anos, desde que começamos, raras foram as semanas sem que eu mandasse, pelo WhatsApp, o “podcast da semana”. Nunca contei, mas é seguro dizer que foram mais de 200 textos ao longo dessa nossa parceria. Textos sobre tudo: o que eu via, o que eu lia, o que eu pensava, o que eu sentia. Alguns (poucos) textos bons, dos quais ainda hoje releio e concordo. Todos os outros, embrulho de peixe. Mas nenhum deles sem a vontade de dizer algo para ser lido e ouvido.

Agora penso que é hora de parar. Esse é o último texto que escrevo sob a rubrica do Sine Ira et Studio. Não que eu tenha dito tudo, por que isso não existe. Apenas que eu desejo fazer outra coisa, mais comprometida com os jovens e com a educação e a cidadania. Sou um homem de 60 anos que conversa com jovens. É um privilégio que pretendo expandir para todas as formas de comunicação possíveis: a sala de aula – meu habitat natural – as redes sociais, as colunas de jornal, os podcasts de entrevistas e debates, os cursos online, palestras e encontros. Quero estar 100% envolvido com os jovens, apresentando meu compromisso com o mundo e debatendo minhas responsabilidades e o que julgo serem as responsabilidades deles. Quero ouvir muito e falar um pouco. Quero encontrar jovens de todas as partes da cidade, do Estado, do País. Para tudo o que for possível estarei disponível. Porque creio que esse é o compromisso urgente da minha geração: o de apresentar um mundo possível, de explicar o que fizemos e o que deixamos de fazer, de apontar nossos erros e onde eles não precisam repeti-los, enfim, de interessar-me, no sentido preciso dessa ação: estar entre.

Agradeço a todos os que me leram e os que comentaram meus textos. O Sine Ira et Studio se despede, mas o compromisso de viver sem raiva e sem favores permanece. Espero que o Plural continue a me acolher. Espero que eu consiga fazer o que me proponho, um pouco que seja. Assim, os próximos anos, que costumam chamar de entrada na velhice, valerão a pena.

Torçam por mim. Muito obrigado.

Sobre o/a autor/a

1 comentário em “O fim do podcast Sine Ira et Studio”

  1. Prof. Daniel, sou muito grato ao seu trabalho por aqui, que ensinou temperança e esperança. Gente como você me inspira a também me esforçar por ser um bom professor. Será um prazer saber sobre suas novas empreitadas! Um abraço

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