Proporção de candidatos PMs cresce e desbanca professores no PR

Policiais militares saíram da 20ª posição em 2014 para chegar à 7ª profissão mais bem representada entre candidatos no estado este ano

O número de policiais militares (PMs) candidatos no Paraná nas eleições de 2022 mais que dobrou em relação aos dois últimos pleitos gerais, de 2018 e 2014, reforçando uma tendência nacional temperada pela instabilidade político-institucional da última década e que ganhou um toque final com o bolsonarismo. Em proporção, as candidaturas dos PMs superaram pela primeira vez as de professores do Ensino Médio – no estado, tradicionalmente mais engajados na busca por representação política que docentes das etapas fundamental e superior.

Nestas eleições, disputam cargos pelo Paraná 40 PMs: 11 para deputado federal; 28, estadual, e 1 suplente ao Senado. Quatro anos atrás, foram 18 registros; e em 2014, 16. O aumento disparado nos números absolutos empurrou com força a fatia relativa dos agentes em relação ao total de candidatos. De 1,29% das candidaturas em 2014, são agora 2,55% dos postulantes. Passaram da 20ª para a 7ª profissão mais declarada junto aos registros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Os filtros estatísticos do órgão revelam, por outro lado, um tímido recuo de professores do Ensino Médio aspirantes a cargos políticos. A comparação acompanha a classificação do próprio TSE, que fragmenta a profissão de docente de acordo com os níveis da educação escolar brasileira.

Em 2014, foram 37 registros de professores do nível médio, que representaram 2,99% das candidaturas; nas eleições passadas, a disputa foi ainda mais acirrada para a categoria, com 57 nomes submetidos (4,43%). Este ano, uma míngua: 34 candidatos e uma representação proporcional de 2,17% entre todas as ocupações pronunciadas nos cadastros do Tribunal.

Mas a intenção de buscar uma cadeira no legislativo não se limita aos PMs. O conjunto de policiais civis candidatos no Paraná também ganhou corpo, passando de 9 em 2014, para 10 em 2018, e 15 nestas eleições.

O recorte de candidatos da defesa e segurança pública pode ser ainda maior, se consideradas submissões de bombeiros, militares aposentados, policiais federais e outros trabalhadores das corporações que não estão discriminados na relação. A própria Secretaria de Segurança Pública do Paraná (Sesp) afirmou ter concedido 21 desincompatibilizações a servidores para disputarem o pleito, incluindo, além de policiais civis, funcionários das polícias Penal e Científica. O sistema de afastamento da PM é à parte.

Ranking dos cargos declarados pelos candidatos em 2022, em total e proporção. Fonte: TSE
Ranking dos cargos declarados pelos candidatos em 20218, em total e proporção. Fonte: TSE
Ranking dos cargos declarados pelos candidatos em 2014, em total e proporção. Fonte: TSE

A favor da maré

Civis ou militares, o fato é que candidatos de farda nadam a favor da maré. Ganham pontos por se movimentarem ao redor do chamado “partido policial”, articulado por figuras emblemáticas eleitas com chuvas de voto no pleito passado.

Em 2018, foi um delegado da Polícia Federal o candidato mais votado para Assembleia Legislativa (Alep). Braço direito e correligionário de Jair Bolsonaro, Fernando Francischini (agora União) recebeu quase 430 mil votos, que, pelas regras de então, puxaram outros três candidatos da mesma coligação para dentro do Palácio Rio Branco. No ano passado, ele teve o mandato cassado pela Justiça Eleitoral por propagar fake news nas redes sociais no dia das eleições e está inelegível. Já disputa pela Câmara dos Deputados, Sargento Fahur (PSD), policial militar por 35 anos, teve a maior quantidade de votos entre os paranaenses e busca reeleição com os mesmos números massivos, que pretende conquistar com o mesmo projeto de endurecer a legislação para criminosos, na máxima “bandido bom é bandido morto”.

Modelos dentro de seus nichos, policiais e delegados alçados ao estrelado político espelham candidatos e refletem um discurso quase uníssono entre a categoria. Uma breve passagem pelas redes sociais de candidatos mais expressivos – policiais já em exercício de mandato ou que entram na corrida com imagem bastante consolidada pelo próprio cargo que ocupam – mostra uma narrativa matizada por pautas de costumes e depreciação de marcos dos direitos civis e humanos consolidados ao longo de décadas.

Em estudo divulgado no ano passado, especialistas em segurança pública do Instituto Sou da Paz observaram no fenômeno, a que chamaram de “policialismo”, um risco de instrumentalização da atividade política para fins políticos e a adesão destas classes a pautas ideológicas específicas – daí as contradições, uma vez que a candidatura e eleição destes profissionais são tão legítimas quanto de representantes de qualquer outra categoria.

Comunidade política

São perfis em quase absoluta consonância com as promessas tonificadas na figura do presidente Bolsonaro – e de agrado do eleitorado conservador. No Paraná, os 55 policiais civis e militares paranaenses na disputa este ano se distribuem por 19 partidos, a maioria de uma zona do centro à extrema direita do espectro político, uma indicação de que o fenômeno que empurrou Bolsonaro ao Palácio do Planalto segue sendo um importante catalisador.

Mas embora ganhem força na retaguarda do bolsonarismo, o pesquisador Renato Sérgio de Lima, em texto de análise sobre eleições de policiais no Brasil integrado à edição 2020 do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, fez uma ressalva: o crescimento em progressão geométrica de candidaturas de policiais é um fenômeno gestado em um contexto marcado por dilemas e interesses diversos que viabilizaram a eleição do candidato da extrema direita em 2018.

“O que os dados do TSE sugerem é que policiais tendem a ser mais eleitos em contextos de crises e de reversão de expectativas não apenas no ambiente econômico mas de prioridades e ideologias políticas. No caso da segurança pública, o crescimento do fenômeno dos policiais na política precisa ser matizado pelos múltiplos movimentos do campo, mas também precisa ser lido pela construção de uma narrativa que tem conseguido resumir a política à guerra contra o mal, na qual os policiais são vistos como os guerreiros que irão repor a ordem, a moral e os bons costumes. E, de forma adicional, guerreiros injustiçados e desvalorizados pelos ‘governos de esquerda’”, afirma o pesquisador no texto.

Docente da Universidade Federal do Paraná (UFPR), o cientista político Bruno Bolognesi, estudioso de sistemas e partidos políticos, elenca uma série de fatores que ajudam a interpretar a aderência de policiais e outros agentes de segurança à comunidade política. Segundo ele, a politização dessas categorias nunca esteve no script, mas avançou dentro do que a psicologia política marca como a força dos exemplos para a inclusão de novas classes e minorias no sistema – a eleição de Bolsonaro e seus aliados, no caso.

Precisam ser considerados também os impasses no mecanismo de segurança pública que se espalham pelo país, com lacunas suficientes para gerar um ambiente de legitimidade para os policiais, e o papel quase que protagonista assumido pelos militares como força de Estado. Em 2021, o Tribunal de Contas da União indicou a presença de quase 6,2 mil militares em cargos no governo federal, número que não passava dos 3 mil na gestão de Michel Temer.

“O fato de os militares ocuparem muitos cargos no governo dá capital político para eles. Querendo ou não, o Estado é um espaço importante de socialização e conquista de capital eleitoral, então a ocupação do Estado por essas forças resulta em mais gente dessas forças querendo participar”, diz Bolognesi.

Para o professor, o afloramento de nichos com perfis muito típicos da pauta conservadora também ajuda a explicar a ascensão de candidatos das forças de segurança. A concentração de demandas que antes eram mais esparsas dá uma vantagem a policiais, por exemplo, que conseguem identificar melhor seus eleitores e crescer alimentado por eles.  

O que não é, contudo, um movimento único da direita. Isso ajuda a entender o surgimento destas pautas e a sede de que elas sejam representadas em massa.

“[O eleitor que compra as pautas dos candidatos policiais mais agressivos] é o mesmo eleitor que compra o discurso identitário de esquerda. A direita e a esquerda se modulam em espelho. É preciso observar que tem um grupo alinhado com determinadas pautas, direitos humanos, direitos das minorias, inclusão, então esse pessoal deu uma resposta na mesma moeda, com sinal contrário”, explica o cientista político da UFPR. “Todas essas máximas de ‘homens são perseguidos’, ‘tem preconceito reverso’, ‘bandido bom é bandido morto’ sempre estiveram presentes aqui no Brasil. A diferença é que, agora, esse pessoal cresceu e conseguiram formar uma base mais sólida que se opõe a esse discurso identitário da esquerda”.

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