Projeto que permite parcerias é visto como “nova lei da mordaça” nas escolas estaduais

Proposta do governo Ratinho será analisada nesta segunda na Comissão de Educação da Assembleia Legislativa

A Comissão de Educação da Assembleia Legislativa do Paraná analisa nesta segunda-feira (15) um projeto de lei que permite às associações da comunidade escolar firmarem parcerias com entidades privadas, como organizações não governamentais e associações de bairro, “em prol qualidade de ensino”. De autoria do governo do estado, o PL 43/2024 já passou pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Assembleia. Se for aprovado na Comissão de Educação, seguirá para votação no plenário.

Para a APP-Sindicato, que representa os trabalhadores da educação estadual, o projeto abre a possibilidade para pessoas sem formação na área da educação interferirem no processo educacional e pedagógico das escolas, pois o texto não especifica quais entidades poderão ser habilitadas, nem suas atribuições na parceria.

temor é que o PL 43 funcione como uma nova “Lei da Mordaça”, como ficou conhecido o projeto 606/2016, que instituía o programa “Escola sem partido” no Paraná. O projeto dos deputados Ricardo Arruda e Felipe Francischini (ambos filiados ao PSL na época) foi rejeitado pela Alep em 2018, por 27 votos a 21. Antes da votação, a então secretária estadual da Educação, Lucia Cortez, a Defensoria Pública do Estado e a seção paranaense da OAB se manifestaram contrariamente à proposta. Em 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou que as leis baseadas no “Escola sem partido” eram inconstitucionais, ao julgar a validade de uma legislação aprovada em Alagoas.

“Parece mais uma lei da mordaça 2.0, um movimento de vigilância e monitoramento muito mais ideológico do que realmente para colocar alguém à disposição para ajudar”, diz a presidente do sindicato, Walkiria Mazeto. “O Conselho Escolar hoje, na sua composição, já prevê a participação da comunidade. Não tem lógica abrir para associações, entidades ou empresas que vão entrar na escola, e não está definido como elas vão intervir. Daqui a pouco tem gente entrando na sala e dando pitaco na aula”.

Outro ponto negativo, na avaliação do movimento sindical, é permitir que pessoas sem formação na área participem do processo educacional. “O projeto não tem nenhuma trava, nenhum limite. É possível haver uma intervenção direta no trabalho pedagógico, no atendimento que a equipe pedagógica está fazendo, as pessoas poderão dizer o que professor ou diretor devem fazer. E pessoas sem formação na área. Por que só na educação pessoas sem formação na área podem vigiar o nosso trabalho?”

Recursos

Até o STF declarar a inconstitucionalidade do “Escola sem partido”, houve debates sobre a proposta em todo o país. Em Curitiba, manifestantes contrários e favoráveis ao controle dos professores chegaram a brigar na frente da Câmara Municipal, em 2017. Também houve confusão na Assembleia Legislativa de São Paulo. Os defensores dos projetos argumentavam que há “doutrinação” e “sexualização” dos alunos.

Para Walkiria, o objetivo real de projetos como o “Escola sem partido” é destinar parte dos recursos públicos da educação para empresas. “Esses projetos que falam em ‘preservar a família’ e evitar a doutrinação são uma cortina de fumaça para a aprovação de legislações que abram o financiamento da educação pública, para que a iniciativa privada tenha acesso a esses recursos que têm previsão constitucional”, afirma. “O atual governo trouxe inúmeras empresas para dentro da educação. Hoje, na Secretaria da Educação, tudo é feito por consultoria, com empresas contratadas”.

Segundo a presidente do sindicato, o clima de radicalização da extrema direita foi reavivado pelos debates a respeito do Plano Nacional de Educação (PNE). “Tem um grupo que é constantemente alimentado por esse olhar de que há doutrinação nas escolas. E agora há uma disputa em torno do PNE no pais inteiro. Tivemos uma audiência pública esses dias na Assembleia com o título ‘PNE ou doutrinação’? Não tem nenhuma relação com o texto, mas eles nem leem o texto, inventam coisas e agora vão para disputa nacional”.

Ajuda financeira e doações

Em nota, a Secretaria de Estado da Educação (Seed) afirmou que o objetivo do PL 43 é regularizar subsídios financeiros e doações para as instituições de ensino, respeitando a autonomia pedagógica. “O projeto tem como objetivo estabelecer ações de apoio entre a educação estadual e organizações privadas para subsídio financeiro e doações visando o fortalecimento do ambiente educacional. A proposta busca promover uma colaboração que respeite a autonomia pedagógica das instituições de ensino, direcionando os recursos para iniciativas que complementem e enriqueçam ainda mais a qualidade da educação pública”, diz a nota da Secretaria.

O PL 43 prevê as parcerias para “incentivar avanços no processo educacional”; “aperfeiçoar o desempenho em proficiência dos estudantes nas avaliações oficiais da educação básica”; “buscar melhores índices de aproveitamento escolar e reduzir a evasão de estudantes ao estimular a participação comunitária nas instituições educacionais”; “fortalecer a valorização da comunidade escolar” e “promover melhorias no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica”.

Sobre o/a autor/a

1 comentário em “Projeto que permite parcerias é visto como “nova lei da mordaça” nas escolas estaduais”

  1. Valnei Francisco de França

    No final do texto constam vários objetivos a serem atendidos pelas Parcerias Público Privada. O que chamou-me a atenção é que os objetivos são, na base, os objetivos das Faculdades, Universidades e Institutos de pesquisas. Tirando o viés “dos índices avaliativos” é responsabilidade das Instituições Públicas realizar pesquisas e acompanhamentos que promovam e sustentem o desenvolvimento da Sociedade em que está inserida. Ex as Faculdades e Universidades paranaenses deve primar pelo pleno desenvolvimento das escolas em nosso estado. Não fazendo, qual seria a utilidade delas?

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

O Plural se reserva o direito de não publicar comentários de baixo calão, que agridam a honra das pessoas ou que não respeitem níveis mínimos de civilidade. Os comentários são moderados por pessoas e não são publicados imediatamente.

Rolar para cima