Este texto fala sobre o documentário a respeito do maestro Ennio Morricone, compositor de centenas de trilhas sonoras.
Bernard Herrmann criou partituras para Orson Welles, mas é lembrado principalmente pela parceria com Alfred Hitchcock. Memoráveis exercícios de suspense do mestre não seriam tão angustiantes sem o acompanhamento musical do grande compositor.
Da mesma forma, o trabalho conjunto de Nino Rota e Federico Fellini tende a ofuscar a parceria do músico com Luchino Visconti, incluindo a obra-prima “Rocco e Seus Irmãos”.
E o que dizer de Ennio Morricone e Sergio Leone? As cavalgadas naquele Velho Oeste de mentira – foram filmadas em Almería, na Espanha – marcaram para sempre o imaginário dos cinéfilos e deram sua carta de nobreza ao spaghetti western.
Ennio Morricone
O cinema de Leone, a trilogia do “Estranho Sem Nome”, com Clint Eastwood, e “Era Uma vez no Oeste”, tem alguma coisa a ver com o tempo, e o tempo da música – de Morricone – deu-lhe sua grandiosidade.
Tudo isso é verdade, mas não se podem subestimar as belíssimas partituras que Morricone criou para outro destacado diretor. “Cinema Paradiso” dificilmente seria tão pungente – as lembranças de Totó – sem aquela trilha. E o que dizer de “Malena”? Morricone não foi apenas “o” compositor preferido de Giuseppe Tornatore. Foram grandes amigos.
Tornatore escreveu um livro sobre suas conversas com o compositor, à maneira daquele que François Truffaut concebeu sobre o mestre do suspense. “Ennio, o maestro” foi lançado em inglês pela HarperCollins. Tem, quase ao pé da capa, a palavra “conversazione“. Uma conversa inesquecível para quem ama o cinema.
Documentário
Tornatore fez também um documentário que está em cartaz nos cinemas [em Curitiba, ele está sendo exibido no Cineplex Batel, do Shopping Novo Batel). O livro foi celebrado como unanimidade: “Uma grande lição de cinema, mas também uma lição de história”, diz um crítico. Mas “Ennio, o maestro”, o filme, recebeu algumas críticas. Seria muito longo. Há controvérsias, porque Tornatore costura depoimentos – de grandes artistas e do próprio compositor – com as cenas de filmes.
Um dos mais animados é Quentin Tarantino e, por uma questão de temperamento, tende a ser exagerado. Morricone, vale lembrar, ganhou um Oscar especial e na sequência ganhou outro prêmio da Academia, dessa vez por um filme de Tarantino, “Os Oito Odiados”, de 2016. “Ennio, o Maestro” é atravessado pelo que Morricone diz a Tornatore no primeiro capítulo do livro. A inspiração não existe. Compor, por mais que se contem as histórias de Mozart menino, exige trabalho, dedicação.
No silêncio
“Se existe um segredo na composição musical”, diz Morricone, “deve ser procurado no silêncio. Porque o silêncio é música. Cada som é apenas a pausa de um silêncio. Minha música parte disso, Peppuccio”, como Morricone, carinhosamente, chamava Giuseppe Tornatore. “Parte do silêncio e da minha admiração por dois gigantes, Johann Sebastian Bach e Igor Stravinski.”
A música estava no DNA. O pai, Mario, tocava trompete e trabalhava em diversas orquestras. Ennio tinha problemas com o instrumento e talvez com o próprio pai, um músico menor. Escreveu cerca de 400 partituras para cinema e TV, além de arranjos para canções de artistas como Gianni Morandi, e mais cem peças clássicas. Fazia distinção entre a música de amor e a que chamava de absoluta, suas composições mais experimentais.
Maria
Seu grande amor, o livro e o filme testemunham, podia ser a música – em termos –, mas também era a mulher, Maria, com quem se casou em 1956. Permaneceram unidos até a morte dele, em 2020. Embora a mulher não reclamasse, ele achava que tinha passado mais tempo em estúdios do que com ela, em casa. E justamente o filho, em entrevista ao Estadão, disse que a pandemia dificultou a criação de um instituto com o nome do pai, mas preservar seu legado não é só uma questão familiar. É de Estado, pelo muito que Morricone representou da Itália para o mundo.
Onde assistir
“Ennio, o maestro” está em cartaz no Cineplex Batel, do Shopping Novo Batel. Confira os horários das sessões, aqui.