Quem aposta na gastronomia

Nada mais natural que cada vez mais jovens vejam a gastronomia como mercado de trabalho promissor e glamouroso. Mas esse mercado é mesmo promissor?

A gastronomia está cada vez mais na boca do povo. São programas com competições de receitas, chefs e estreantes, promoções em restaurantes e bares, livros de receitas, ebooks, lives, cursos on-lines, e até mesmo pacotes com ingredientes acompanhados de vídeos para transformar qualquer um em exímio cozinheiro.

Neste ambiente aparentemente tão encantador, nada mais natural que cada vez mais jovens vejam a gastronomia como mercado de trabalho promissor e glamouroso. Atentos a essa demanda, cursos de todos os tipos pipocam pela cidade e pelas redes sociais. Mas esse mercado é mesmo promissor?

Uma das escolas mais procuradas e renomadas em Curitiba quando o assunto é gastronomia é o Centro Europeu, que segundo Rogério Gobbi, administrador da escola, há 34 anos capacita profissionais para o mercado de hotelaria e gastronomia, já tendo formado cerca de 10 mil profissionais que atuam em hotéis e restaurantes do Brasil e de vários outros países.

Outras instituições também oferecem cursos, como a Opet, que desce 2009 oferece o de Tecnólogo em Gastronomia. As pessoas que procuram esses cursos buscam uma formação objetiva, direcionada à prática, com certificação nacional e internacional e reconhecimento dos segmentos profissionais para os quais se capacitaram, através do ingresso rápido no mercado de trabalho. Muitos deles já atuam no segmento e buscam aprimorar seus conhecimentos e obter uma certificação que lhes permita ascender profissionalmente.

Curso de chef do Centro Europeu. Foto: Rosa Maria Dalla Costa

Segundo Gobbi, o segmento gastronômico além de estar em contínuo crescimento, oferece enormes possibilidades de encarreiramento e crescimento profissional. “Ao término dos cursos, oferecemos programas de estágios em restaurantes de renome, redes hoteleiras nacionais e internacionais…”, relata.

Para atingir esse objetivo, Gobbi afirma que o método formativo utilizado pelo Centro Europeu é pautado num bom time de professores, que são profissionais renomados e com experiência. “Buscamos uma formação prática e objetiva, desenvolvida em modernos estruturas de ensino de referência, com alta tecnologia e muitas parcerias com empresas e entidades do segmento.

A Opet também afirma formar profissionais para Curitiba e para o mundo. Para isso tem disciplinas específicas que, ao serem cursadas pelo aluno, lhes oferece uma dupla certificação, como a de Barista ou a de Cozinha Criativa, com técnicas que estão sendo desenvolvidas no mundo inteiro.

O mercado curitibano busca pessoas com boa formação, interesse em se desenvolver e se capacitar continuamente, assim como capacidade empreendedora e que, principalmente, goste daquilo que faz, afirmam as escolas.

Beto Madalosso, empresário do segmento, diz, por sua vez, que tem muitos restaurantes procurando chefs de cozinha e muitos chefs procurando trabalho. Talvez porque a expectativa de ambos seja muito grande. “Muitos chefs querem introduzir cardápios criativos e trabalhar numa cozinha super equipada, mas quando começam têm que repetir um cardápio que já está pronto, sem poder exercer sua criatividade, com um salário pouco satisfatório. Segundo ele, estão pagando hoje em Curitiba salários que variam, em média, de quatro a sete mil reais. Isso ainda vai depender do tamanho do restaurante, se for um bar ou um lugar pequeno, nem chega a isso. Tudo vai depender do tempo de trabalho, da complexidade, da técnica envolvida, podendo até chegar a uns dez mil reais.

Madalosso acredita que há problema dos dois lados. Como empresário, vê que poderia até investir mais em melhores condições e equipamentos e do outro lado, o profissional deveria ter mais tempo de serviço como cozinheiro antes de pleitear o cargo de chef de cozinha. “Um chef de cozinha, não é chef sem ter trabalhado no cargo. Ninguém sai de um curso sendo chef, tem que ter experiência, liderança. Um chef só é chef se tiver tempo de liderança, se tiver coordenado uma equipe. Muita gente sai dos cursos se achando chefs”, afirma ele.

Por isso, acredita que os cursos formam cozinheiros e não chefs. “Ninguém que nunca teve subordinados pode se dizer chef. Aos poucos o cozinheiro ganha respeito e vai virando chef. Acho que tem boas formações como o Centro Europeu e o Senac, que eu conheço, mas deve ter outras boas também Brasil afora”, diz ele.

Alunos aprendem truques da profissão de chef no Centro Europeu. Foto: Rosa Maria Dalla Costa

As pessoas que têm procurado esses cursos estão na faixa etária dos 25 aos 45 anos, com algumas pessoas de mais idade ocupando esses postos de trabalho. São pessoas que precisam trabalhar e que para ganhar esse salário se enquadram na classe média baixa.

Essas pessoas têm que ter habilidade para trabalhar em grupo, pois para ficar oito horas por dia num ambiente quente, fazendo um trabalho árduo, tem que conseguir trabalhar em grupo. Essa parece ser a principal habilidade, na opinião de Madalosso. “No mais, nada que não possa ser treinado e aprendido.” Para ele, Curitiba tem as características gastronômicas do seu perfil sócio econômico. “Cidades maiores têm outras necessidades, pode criar mais, variar mais”, conclui.

Um exemplo de aluno de gastronomia que ganhou o mundo é o do chef Vinicius Augusto Thomaz, o Vini, que fez o curso de chef de cozinha do Centro Europeu, em 2015. Ali se tornou auxiliar dos chefs, sous chef e professor. Paralelamente, ainda em Curitiba trabalhou com eventos, como consultor de restaurantes e como empresário. Teve sua própria padaria. Há dois anos, mudou-se para o Egito e trabalha num hotel considerado sete estrelas.

Segundo ele, a profissão de cozinheiro não é muito valorizada em Curitiba, por mais que os profissionais procurem formação. Comparando com o exterior, no hotel em que ele trabalha no Egito, um estagiário começa ganhando mil dólares. No Brasil, quando não pagam apenas o vale transporte, pagam salários de mil e quinhentos reais. É muito difícil trabalhar. No Egito, as regras trabalhistas são diferentes e parece ter menos burocracia. No Brasil é muito difícil empreender neste segmento devido às leis trabalhistas. Além disso, do ponto de vista financeiro parece valer a pena. “Estou há dois anos aqui, tive promoções e acho que está valendo a pena”, relata.

Vinícius Augusto Thomaz: do Centro Europeu para o Egito. Foto: Arquivo pessoal

Somado a isso, Vini relata que o custo de vida é barato, o que ajuda a fazer uma reserva financeira. Como ele trabalha num hotel de alto nível, pode utilizar insumos caros e de qualidade, como lagosta e carnes com abates diferentes. Tem ainda que seguir certas regras como não utilizar carne de porco, nem bebida alcoólica em nenhum prato, mesmo servindo turistas de diferentes partes do mundo.
Segundo ele, nos países árabes tem muitas oportunidades para profissionais de gastronomia, mas precisa falar bem o inglês, e estudar continuamente. Vini não tem planos de voltar para o Brasil, pois sabe que as condições aqui continuam difíceis. Para quem está aqui ele recomenda muito estudo e trabalho. É muito difícil no começo, mas a pessoa tem que ser persistente e aprender a observar os chefs com quem trabalhar”. Tem que treinar até virar um especialista, para isso, trocadilho à parte, não tem receita.

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