Os valores que a amizade dá

Todos os bons amigos, sem exceção, repudiam veementemente toda essa tranqueira em que o Brasil se meteu

Levo a mão ao bolso e acho várias moedas, um comprovante de votação e uma saudade enorme pra se levar por aí, pois queria mesmo era carregar comigo na carteira meus amigues. São valiosos demais, poderia perdê-los se ficassem muito soltos, mas ainda assim é solto que gosto de vê-los. Não quero ver ninguém preso ou se prendendo sem necessidade. No final a gente se busca e se acha pelas esquinas do mundo, se conecta pelo zapzap e fortalece uma rede de acalento por onde passamos.

Amigos e amigas são valiosos pois através deles posso definir o valor das coisas. Com eles não sou um ponto perdido no espaço, me delimito e juntos delimitamos um mundo em expansão. Exploramos as nuances entre as cores, fazemos samba com muitas notas, tecemos relações de importância dentro do viver.

As coisas mudam, mas sempre ganham valor. Entre nós, por exemplo, o fascismo tem um valor negativo e isso nunca mudou. Ainda mais esse fascismo brasileiro que é uma mistura de Mussolini com sertanejo superfaturado, de Al-Qaeda com tiozão do pavê. Um fascismo brega e tosco, mas perigoso e que sempre foi intragável. Nunca valeu nada e nem foi passível de negociação para quem conheço e admiro.

Todos os bons amigos, sem exceção, repudiam veementemente toda essa tranqueira em que o Brasil se meteu. Como foi que a vida fez isso? Como ela, a vida, depurou tudo tão bonito fazendo a gente se admirar mutuamente? O radicalismo atual serviu para mostrar os valores das amizades, bem como, as amizades de valores.

Engraçado que nenhum dos bons amigos me surpreendeu. Somente aqueles já duvidosos, de valores éticos sem contornos definidos foram os que se deixaram jogar ladeira abaixo. Não os quero mal, apenas não os quero mais.

Os caminhos da amizade sempre puderam manter o valor humano em perspectiva sem ter medo da labuta, da grana e da garra pra conquistar a nossa vida. Não falávamos disso, mas no final nos encontramos mais uma vez. Parece que o amor entre nós extrapola para além do boteco e ganha amplitude política. ‘Não tenho amizades, tenho amores’ disse o romancista chileno Pedro Lemebel. Temos apreço pela amizade, pelo humano e por tudo o mais que vem com isso. É óbvio que ninguém assim vai amar um miliciano ou um torturador.

Sabemos que a extrema direita brasileira serviu para reconhecermos os habitantes do esgoto fascista, claro, mas também os ignorantes, desavisados por falta de informação de qualidade, porém sobretudo, os amargurados de um neoliberalismo falhado, os recalcados de uma cultura chauvinista e os infantilizados pelo maniqueísmo pobre de simbolização do mundo.

Levo a mão ao bolso e acho várias moedas: ética, honestidade, justiça, beleza e amor. Essas moedas o fascismo não aceita, mas com elas enriquecemos o mundo.

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