A causa mortis da república de Moro, Deltan e Gabriela Hardt tem nome: jornalismo

mulher branca e homem branco
Tem gente dizendo que o fim do lavajatismo é uma vingança de Lula, mas quem afundou essa turma foi um grupo de repórteres

Este texto é dedicado a meu amigo Rafael Moro Martins

Houve um momento em que pareceu que Sergio Moro e seus apóstolos da Lava Jato estavam destinados a controlar o Brasil. Entre 2014 e 2018, eles mandaram e desmandaram; prenderam e soltaram (mais prenderam do que soltaram); ditaram para a imprensa o que deveria ser publicado e para os políticos quais leis deveriam ser feitas.

Hoje, o que restou disso? Moro possivelmente será cassado pelo TSE. Deltan precisou sair às pressas do Ministério Público – ele sabia que se esperasse mais, as múltiplas denúncias contra ele virariam sindicâncias e ele ficaria inelegível. Acabou cassado e, pior, colunista da Gazeta do Povo.

Agora foi a vez da sub de Sergio Moro se dar mal. Gabriela Hardt, a juíza que fez copia e cola de uma sentença sem se dar conta de que o texto nem fazia sentido, foi afastada do cargo pelo CNJ. Junto com ela, mais três juízes/desembargadores do TRF4. A decisão duríssima de Luiz Felipe Salomão diz que, basicamente, o pessoal da Lava Jato estava ignorando as leis e o STF para fundar um multimilionário fundo de combate à corrupção que seria um brinquedinho para eles mesmos.

Se sobrou alguém inteiro da Lava Jato, deve estar escondido atrás de um sofá, bem quietinho, torcendo para não lembrarem que ele existiu. Claro, isso não quer dizer que esse pessoal não vai voltar a ter poder, muito menos que não vão surgir outros iguais no rastro do que eles fizeram. Em todo filme de horror, dizem, o psicopata sempre dá um último susto quando você acha que ele já está morto.

Agora o que está se vendo é a análise. O pessoal está olhando para trás e perguntando o que aconteceu. Sergio Moro e Deltan, que dizem nunca terem combinado nada mas às vezes parecem ser a mesma pessoa, juram que é perseguição política. Analistas conservadores falam em uma vingança de Lula, imaginando que o presidente tem poder para mudar tudo isso, inclusive o imaginário popular.

Mas se formos fiéis aos fatos (e como é importante o jornalismo ser leal aos fatos, não?) o que mudou tudo não foi Lula. O homem estava preso e, para muita gente, acabado. O que mudou tudo, senhoras e senhores, e inclusive deu a liberdade ao próprio Lula, foi o jornalismo.

Não aquele jornalismo que ia às coletivas de Deltan e escrevia letra por letra o que o procurador falava. Mas sim aquele que, com provas na mão, conseguiu mostrar por dentro como era a operação anti-corruptos. O jornalismo que se empenhou em revelar quais eram os reais interesses que estavam comandando o país.

Hoje, Glenn Greenwald está de outro lado da fronteira (um lado meio esquisitão, inclusive). Leandro Demori partiu para seu caminho pessoal. E o Intercept vem, incrivelmente, depois de ter feito o trabalho de reportagem mais importante do país em décadas, enfrentando problemas de financiamento – eis o que é fazer jornalismo no Brasil.

Mas durante os meses da Vaza-Jato, nada houve de mais importante na política e na sociedade brasileira. “Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”, diz o trecho bíblico tão tristemente tornado símbolo de um governo semiditatorial. Mas, nesse caso, foi exatamente assim. O país conheceu a verdade sobre a Lava Jato, e foi libertado de Moro, Deltan e dos demais.

A Vaza Jato, confirmada mais uma vez no caso de Gabriela Hardt, mostrou que o juiz e os procuradores conversavam sobre tudo; que o próprio escopo da operação foi reduzido por mando de Moro, e não por decisão da força-tarefa; que a acusação combinava tudo com o juiz e obedecia a seus comandos como se fossem uma só coisa.

As mensagens mostraram que os procuradores tinham muitos planos para o dinheiro recuperado da corrupção; que planejavam inclusive mandar erigir um momento em praça pública a eles mesmos.

Isso sem contar que as mensagens revelaram sentimentos espúrios, uma absoluta falta de empatia e de humanidade, a mais absoluta podridão de almas que se poderia encontrar em pessoas supostamente republicanas.

Tudo o que ocorre hoje com os lavajatistas, com o pessoal que um dia sonhou em jogar fora as leis do país e reescrever a Constituição em nome de seu projeto de poder pessoal, se deve em última instância a uma série de reportagens e a um grupo de repórteres.

Eis o poder do jornalismo. A pena, sim senhores, foi mais poderosa do que a espada decepadora de cabeças dos lavajatistas.

Sobre o/a autor/a

Compartilhe:

Leia também

Há saída para a violência?

Há que se ter coragem para assumir, em espaços conservadores como o Poder Judiciário, posturas contramajoritárias como as que propõe a Justiça Restaurativa

Leia mais »

Melhor jornal de Curitiba

Assine e apoie

Assinantes recebem nossa newsletter exclusiva

Rolar para cima