O Primeiro de Maio morreu

70% dos trabalhadores ainda desconhecem que, com exceção do salário mínimo, um aumento salarial não decorre de política de governo, mas sim de negociação direta entre o sindicato e o empregador

O dia primeiro de maio foi escolhido no fim do século XIX pelo movimento operário internacional para lutar por uma vida digna para os trabalhadores. Eles buscavam um ideal: dividir o dia em três partes iguais, uma para trabalhar, outra para lazer e estudos e a última para o merecido repouso.

Mas por que 1º de maio? Segundo o professor João Carlos Marques, nessa data, em 1886, em Chicago, ocorreu uma grande manifestação pela jornada de trabalho de oito horas. No entanto, sob as ordens das autoridades da época, os policiais reprimiram os manifestantes com grande intensidade. Dessa forma, as famílias operárias (homens, mulheres e crianças) voltaram às ruas três dias depois. Durante a manifestação, uma bomba de origem indeterminada explodiu no meio dos policiais. A reação foi imediata. Os agentes reprimiram violentamente os manifestantes. Cinco dirigentes sindicais foram acusados pelo episódio e condenados à morte por enforcamento, tendo sido executados em 1887. Mas, cinco anos depois, foram inocentados e por isso acabaram passando para a história como os “Mártires de Chicago”.

No Brasil, as primeiras manifestações do Primeiro de Maio, no início do século XX, marcavam a data com salva de tiros e visitas aos cemitérios para homenagear os companheiros mortos. Também surgiram festivais comemorativos que tentavam mesclar reivindicação com diversão. Isso, claro, irritava os líderes mais engajados, e, em 1906, no Primeiro Congresso Operário brasileiro, definiu-se que os trabalhadores deveriam se conscientizar e lutar contra a exploração e não comemorar com festa. A data era um dia de luta e luto pelos “Mártires de Chicago”.

Por essa razão, quando o Primeiro de Maio virou feriado nacional, em 1924, o movimento operário não gostou. Transformando o dia em feriado, o “operariado não mais se ausentaria do trabalho porque estava enfrentando seu patrão e mostrando-se solidário para com seus companheiros, mas porque o governo havia concedido a folga”.

Hoje em dia muitas pessoas não sabem nem para que serve um sindicato. Segundo o procurador do trabalho Ronaldo Lima dos Santos, aproximadamente 70% dos trabalhadores ainda desconhecem que, com exceção do salário mínimo, um aumento salarial não decorre de política de governo, mas sim de negociação direta entre o sindicato e o empregador. Ou seja, sem a intervenção do sindicato, raramente se tem uma reposição da inflação ou um aumento salarial, ou qualquer outra conquista que não esteja na lei.

Mais do que nunca, protestar no primeiro de maio seria essencial para tentar reverter a destruição das conquistas sociais. A maioria dos trabalhadores hoje sofreu precarização de suas condições de trabalho, e quanto mais vulneráveis, pior: as pessoas com deficiência, mulheres e negros vivem com mais dureza a decadência social nos últimos anos.

Mas o que se viu nas ruas de Curitiba no primeiro de maio de 2022 foi decepcionante. Pessoas de verde-amarelo protestando pelo fim da democracia, contra a tripartição dos poderes, contra o comunismo (?) e até mesmo a favor do Estado de Israel (?).

O Primeiro de Maio morreu, e as manifestações verde-amarelas profanaram seu cadáver. Os militantes do apocalipse querem o fim da solidariedade social e junto com ele o fim da família brasileira, porque sem uma remuneração digna, sem descanso semanal remunerado, sem adicional noturno, sem remuneração superior das horas extras, sem previdência social, como manter-nos juntos? Quem vai ajudar os necessitados? o Estado? Mas que Estado, se esses manifestantes desejam o fim da organização política brasileira?

Sem direitos trabalhistas não há família que resista. Por isso é preciso ressuscitar o Dia do Trabalhador.

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1 comentário em “O Primeiro de Maio morreu”

  1. Um povo que aplaude um tirano analfabeto funcional e que não tem consciência de classe será eternamente escravo. A derrubada da Presidente Dilma foi a oportunidade que a classe patronal precisava para destruir os direitos sociais e os sindicatos. O pacto social mínimo foi rompido. Parabéns à Dra. Cristiane pelo artigo.

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