“Curitiba merece voltar a ser uma capital moderna. Curitiba merece ser diversa”

Em Curitiba existe um levante antirracista e antimachista, e a cidade vê uma mulher negra como possível candidata à prefeitura

Este texto faz parte de uma série de artigos de pré-candidatos à Prefeitura de Curitiba a ser publicados pelo Plural.

A luta contra o racismo não é uma luta de pessoas negras contra brancas. Não se deseja a exclusão de pessoas brancas. Não se julga negativamente as habilidades de uma pessoa somente por ser branca, elas não são impedidas de acessar espaços, cargos ou locais de poder. No entanto essa sociedade que prega “não podemos pagar mal com mal”, segue desejando a exclusão de negros e negras todos os dias. O racismo intenta nossa aniquilação todo dia, continuamente sem interrupção desde a escravidão, perpetuando através de sua estrutura e instituições o genocídio da juventude negra, a pobreza, a violência, exclusão e a sub-representação da população negra. Tudo isso sob um pacto de silêncio, de amnésia, de cegueira sobre todos os horrores que essa discriminação gera todos os dias a milhões de pessoas.

Sabemos que não existem dados suficientemente apavorantes que sejam capazes de quebrar tal pacto, mas vale retomá-los:

  • A taxa de analfabetismo entre os negros (9,1%) de 15 anos ou mais é superior ao dobro da taxa de analfabetismo entre os brancos da mesma faixa de idade (3,9%);
  • Pretos e pardos R$934,00, brancos R$1.846,00. Segundo o IBGE esse era o rendimento domiciliar per capita desses grupos em 2018;
  • Negros são os que mais morreram, proporcionalmente, de Covid-19 e os que menos receberam vacinas. Levantamentos do Instituto Polis e Agência Pública.

Como mudar isso se pessoas negras são sub-representadas nos Congressos e Executivos do Brasil? Segundo Angela Davis, o desafio “não é reivindicar oportunidades iguais para participar da maquinaria da opressão, e sim identificar e desmantelar aquelas estruturas nas quais o racismo continua a ser firmado”.

O racismo é inegavelmente uma ferida exposta na nossa sociedade e seguirá sendo se não tivermos atitudes concretas para superá-lo. Sendo assim concluímos que não agir contra ele é ajudar a perpetuá-lo. Negar o racismo é desejá-lo, negar agir contra ele é se beneficiar dele. E quantos ainda no Brasil o negam, não o veem, acreditam que é um probleminha secundário. Quantos acreditam que podemos ter ações antirracistas “amanhã”, que o racismo vai se desfazer sozinho, que debatendo classe apenas é suficiente, sem entender que gênero, raça e classe no Brasil estão interligadas. O racismo desenvolvido na escravidão é a origem das desigualdades desse país.

Alguns podem achar que quando falamos de questões étnico-raciais estamos discutindo uma questão menor. Como vimos acima, esse recorte permeia todas as estruturas da sociedade. Todas as estruturas da cidade. Além da desigualdade racial, a desigualdade de gênero está também definindo as relações sociais:

  • Segundo dados do CAGED de março de 2021, Curitiba tem a segunda maior diferença salarial entre homens e mulheres ficando atrás apenas de Belo Horizonte;
  • Maior formação, maior diferença. Mulheres com mestrado ganham 50% a menos que os homens. E mulheres com pós-graduação, 33%;
  • E quando somamos desigualdades o resultado é ainda pior: mulheres indígenas ganham 18% a menos que os homens; mulheres pretas, 12% a menos, enquanto brancas 8%.

E em Curitiba existe um levante antirracista e antimachista. Isso me orgulha, afinal essa é a cidade em que nasci, cresci, me formei, dei aula, cidade que me fez a primeira vereadora negra em 2020, e que deu a maior parte dos votos para que me tornasse a primeira deputada negra do estado, cidade que também escolheu me colocar no cenário de possíveis candidaturas a ocupar o palácio 29 de março. Sim, Curitiba, a capital do Paraná, capital europeia, verde, moderna, crítica, vê uma mulher negra como possível candidata à prefeitura.

E agora José? Os discursos começaram: “É importante uma mulher negra candidata, mas não é o momento“, devemos considerar outros cálculos políticos”, “ela pode ser vice”, “quem vai encabeçar a frente ampla?” “Precisa ter experiência”.

Basicamente os candidatos aptos de antemão são, homens, brancos, ricos, herdeiros, antigos na política ou apadrinhados por figuras influentes: Massa, Slaviero, Pimentel. Se seguirmos assim vamos reproduzindo a mesma forma de fazer política. Sem olhar de novas perspectivas, esperando chegar a resultados diferentes fazendo as mesmas coisas.

A disputa da prefeitura talvez seja o momento mais rico para se discutir a cidade. Para que as pessoas possam, de forma intensa, parar e pensar nas necessidades e possíveis soluções. Ter pontos de vistas diferentes enriquece essa discussão e proporciona um avanço para o município.

Eu quero ser candidata, como mulher negra quero direcionar olhares para a superação das desigualdades. Trazer meu lugar de professora para fortalecer a educação. Minha juventude como força para reordenar prioridades para a mobilidade e o meio ambiente. Pensar em empregabilidade e saúde para toda a diversidade de pessoas.

Meu desejo é forte. Desejo de ajudar a construir um futuro inovador para a minha cidade e estado, que pode ser ainda mais vanguardista, que pode vencer preconceitos antigos e já ultrapassados.

Isso é o futuro, e eu quero olhar para ele. Estou aqui e estou à disposição!

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