Casa de Passagem Indígena não tem data para reabrir em Curitiba

Fechado há oito meses, local passou a atender outras populações durante a pandemia e será transferido do Centro para o Capão da Imbuia

A entrada em vigor da bandeira amarela em Curitiba, no dia 25 de setembro, flexibilizou ainda mais as medidas de restrição válidas em tempos de pandemia. A diminuição na média das taxas de contágio e internamentos serviu de base para a Prefeitura liberar cinemas e festas com público de até 50 pessoas. Por outro lado, a Covid-19 ainda mantém paralisados alguns serviços prestados pelo município, entre eles, os da Casa de Passagem do Indígena. Suspensos desde o fim de março, os atendimentos da unidade agora começam a fazer falta, e a carência de auxílio já originou uma campanha de ajuda à população que precisa do local.

Embora alguns indígenas que deixaram a Capital diante da situação de emergência estejam, com a flexibilização, começando a retornar à cidade, a Fundação de Ação Social de Curitiba (FAS) afirma que o município ainda está organizando a reabertura do espaço. O órgão não dá prazo para que isso ocorra, mas nega o fechamento definitivo da Casa, inaugurada em 2015 como uma espécie de centro de acolhimento para as pessoas que saem de suas aldeias em busca de renda com a venda de artesanatos pelas ruas da cidade.

Diante da situação, o Ministério Público do Paraná (MPPR) – por meio do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Proteção aos Direitos Humanos e da Promotoria de Justiça de Direitos Constitucionais de Curitiba – comunicou que está acompanhando o tema. Mas com o aumento da demanda ainda sem uma solução à vista, entidades começaram a mobilizar e lançaram, na última sexta-feira (6), uma campanha de ajuda para as famílias que já estão na Capital.

Coordenada pela Liga Brasileira de Lésbicas no Paraná, a ação pretende arrecadar dinheiro e alimento para amparar indígenas que voltaram a vender artesanatos em Curitiba. Até o último fim de semana, três famílias que compartilhavam o aluguel de uma única casa haviam sido amparadas – sendo uma delas com suporte para retornar à comunidade de origem.

“A gente consegue entender que o fechamento foi importante para evitar aglomeração, para evitar uma série de riscos. Mas o que não conseguimos entender é porque o poder público não procurou outras alternativas para atender essa população”, argumenta Léo Ribas, uma das representantes da Liga em Curitiba. “Voltou ao normal tudo o que produz capital, agora o que precisamos dentro de direitos e de acolhimento para a população vulnerável ainda não temos.”

Além da campanha, o grupo coordena um levantamento para encontrar demais pontos de abrigos improvisados de indígenas espalhados pela cidade. A intenção é de que, até o fim desta semana, outras famílias sejam localizadas e apoiadas pelas doações.

“Eles tiveram que sair dos seus territórios para vir para a cidade buscar fonte de renda, além de que postos de saúde nessas localidades começaram a não conseguir mais atender à população toda. Se neste momento de pandemia já está difícil para donos de lojas, para quem tem sua barraquinha em feiras grandes, imagina para eles que vendem artesanatos nas ruas”, observa Ribas.

Indígenas vendem artesanato nas ruas da Capital. Foto: Emerson Nogueira/Parágrafo 2

Saúde e segurança

Tainara Ganin, que pertence ao povo Kaingang, e acadêmica de Terapia Ocupacional pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), conta que a região Sul abriga principalmente os povos Kaingang e Guarani, e que é comum a transição entre lugares diferentes. “Como já se passaram alguns meses do isolamento, e creio que nem todos indígenas tiveram acesso ao auxílio-emergencial, vários desses indígenas começam a se deslocar para as grandes cidades, para conseguir fazer a venda da sua arte e consequentemente tirar o sustento para suas famílias.”

“Meu posicionamento em relação ao fechamento (da Casa de Passagem) é que foi muito importante para conseguirmos conter os elevados casos dentro dos territórios, mesmo que ainda eles continuem aumentando. No entanto, é preciso que haja um estudo entre lideranças, município, Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e Ministério Público, para avaliação da situação e criação de protocolos de segurança para esses indígenas que já estão se deslocando até Curitiba.”

Para Tainara, só assim para poder reabrir a casa e garantir a segurança de todos os indígenas que precisam acessar esse serviço. “Não podemos perder mais nem uma vida indígena. Mas também precisamos pensar em como auxiliar esses indígenas, nesse novo modelo de vida que todos estamos nos adaptando.”

Mudança de endereço

Segundo a FAS, antes de Curitiba decretar estado de emergência sanitária por causa da pandemia do coronavírus, 65 indígenas estavam abrigados na casa de passagem. A pedido dos caciques das aldeias Rio das Cobras, no município de Nova Laranjeiras, e Ivaí, em Manoel Ribas, as famílias retornaram às suas comunidades com o apoio da Liga Brasileira de Lésbicas.

A FAS cita ainda um entendimento entre a Prefeitura de Curitiba e os caciques, ocorrido em março, no qual teria ficado “acordado que, enquanto perdurar a pandemia, os indígenas não retornariam a Curitiba”, e acrescentou que, mesmo que alguns tenham retornado e estejam em situação de rua, “serão atendidos nas unidades da FAS, de acordo com o perfil e necessidade, como acontece com todo cidadão que precisa dos serviços da assistência social”.

A Prefeitura também negou que tenha intenção de encerrar de vez os atendimentos prestados pelo espaço. De acordo com a Fundação, o que aconteceu foi que, ao ficar desocupado, o antigo endereço da unidade – no complexo dos abrigos da Praça Mário Tourinho – passou a atender pessoas de forma segmentada, como idosos, crianças, mulheres, homens, grupos de risco, pessoas com sintomas ou que contraíram o coronavírus. Por isso, a Casa de Passagem Indígena, quando reaberta, passará a funcionar no Capão da Imbuia. O bairro fica distante do Centro, que é onde a maioria dos indígenas vende seus produtos.

Como ajudar

Para participar da campanha de ajuda aos indígenas que já retornaram a Curitiba, basta entrar em contato pelo telefone (41) 99658-8612. O número recebe ligações e mensagem de WhatsApp.

Colaboraram: Matheus Koga e Parágrafo 2

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