O Movimento de Mulheres Negras do Paraná realiza uma agenda de atividades durante o mês de julho, por meio de eventos presenciais e on-line, em Curitiba e outros municípios do estado. A programação acontece porque, desde 2013, o mês de julho é marcado nacionalmente por uma agenda conjunta de atividades do Movimento de Mulheres Negras (MMN) que remetem às pautas específicas de gênero e raça, denominada Julho das Pretas.
O 25 de Julho
No ano de 1992, organizações do Movimento de Mulheres Negras da América Latina e Caribe se reuniram em Santo Domingos no I Encontro de Mulheres Negras Latinas e Caribenhas. Nessa oportunidade, além de debaterem e analisarem os resultados opressores do machismo dentro da sociedade, também destacaram variáveis específicas das mulheres negras, nas quais se inclui o racismo vigente. O duplo preconceito e a dupla discriminação vivenciados pelas mulheres negras fazem com que elas sejam ainda mais cerceadas com relação às oportunidades.
Dessa reunião de grupos do MMN, surgiu a meta de se organizar para combater a dupla opressão promovida pelo machismo e pelo racismo, que violam ainda mais os direitos das mulheres negras. Para chamar a atenção à essa problemática, as integrantes das organizações presentes nesse evento reivindicaram à Organização das Nações Unidas (ONU) o reconhecimento do dia 25 de julho como o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha.
No Brasil, a data foi instituída por meio da Lei nº 12.987 de 2 de junho de 2014 como o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra. Tereza de Benguela foi uma líder quilombola do século XVIII que atuou no Quilombo Quariteré, no Mato Grosso, juntamente com povos negros e indígenas em um sistema de defesa contra a escravidão.
O Julho das Pretas
O Dia 25 de Julho passou a ser um marco na agenda do MMN e, no Brasil, sentiu-se a necessidade de ampliar as ações. Foi partindo desse objetivo que o Odara – Instituto da Mulher Negra – iniciou, em 2013, o Julho das Pretas. Naquele ano, a agenda conjunta de atividades foi realizada por organizações e movimentos sociais de mulheres negras da Bahia e depois se expandiu para toda a região nordeste e alguns outros estados do Brasil. A ideia do Julho das Pretas não é o de comemorar do Dia da Mulher Negra, mas sim fortalecer as organizações protagonizadas por mulheres negras, reforçar as pautas de gênero e raça, trazer mais visibilidade à essa luta e exigir políticas públicas.
Foi por meio do Julho das Pretas que a Articulação das Mulheres Negras Brasileiras (AMNB) decidiu se reunir e organizar a Marcha das Mulheres Negras em Brasília, que ocorreu em 18 de novembro de 2015. Depois da Marcha, organizações de mulheres negras de todo o Brasil começaram o planejamento da programação do Julho das Pretas pelos estados que ainda não era realizada.
A agenda Julho das Pretas se justifica porque a dupla opressão produz efeitos que se relacionam e se complementam, promovendo condições de falta de oportunidades, exclusões e estratégias e superação. As representantes do público que passam por esses problemas são as mulheres negras, as quais ocupam a base da Pirâmide das Desigualdades.
A situação de maior vulnerabilidade das mulheres negras, em comparação com os demais grupos, pode ser verificada na publicação Dossiê mulheres negras: retrato das condições de vida das mulheres negras no Brasil. Por meio dessa pesquisa, compreende-se que, por ocasião do racismo, do patriarcado e do machismo, as mulheres negras têm realidades diferentes na sociedade, ao serem comparadas com as mulheres não negras e homens negros. Esse contexto justifica a agenda conjunta do Julho das Pretas e a implantação de políticas públicas específicas para as mulheres negras.
Julho das Pretas no Paraná
De acordo com as representantes da Organização do Julho das Pretas – PR, no contexto paranaense, a programação alusiva ao dia 25 de Julho acontece desde 2014, quando a data do Dia Nacional de Tereza de Benguela foi instituída. As iniciativas foram da Rede de Mulheres Negras do Paraná (RMN-PR), ONG que atua nas pautas de gênero e raça desde 2006, ano no qual foi fundada.
Contudo, foi após a Marcha das Mulheres Negras em Brasília, organizada pela Articulação das Mulheres Negras Brasileiras (AMNB) e realizada em 18 de novembro de 2015, que organizações de mulheres negras de todo o Brasil começaram o planejamento da programação do Julho das Pretas pelos estados que ainda não era realizado. A RMN-PR, como filiada da AMNB, organizou essa Marcha no Paraná e, seguindo essa linha de planejamento, decidiu realizar em 2017 o Julho das Pretas no contexto paranaense.
Depois desse desafio inicial, a organização do Julho das Pretas – PR foi formada por integrantes de diferentes movimentos sociais e outras entidades do movimento de mulheres negras, e em 2022 está na 6ª edição. Tendo Curitiba como a cidade no qual a maioria das atividades são realizadas, os trabalhos não são dos mais fáceis. Segundo integrantes da organização, realizar uma sequência de ações com esse objetivo em uma cidade na qual se fala muito da contribuição que imigrantes europeus trouxeram em detrimento da importância histórica da população negra e de outras etnias, é um desafio constante, principalmente pelo apelo à conscientização e pelo racismo tão presente no cotidiano.
Um outro desafio diante das atividades da capital é o de levar mais atividades para os bairros de periferias. Algumas lideranças do MMN destacam a importância de dar mais visibilidade às mulheres negras que realizam trabalhos sociais nas bases e a necessidade de levar a agenda Julho das Pretas às pessoas que, muitas vezes, não tem fácil acesso ao centro da cidade.
III Feira Cultural e do Afroempreendedorismo realizada na Praça Zumbi dos Palmares: modelos da CWBlack, ostentando toda a beleza negra com acessórios da própria Feira. Foto: Organização Julho das Pretas (2018)
A agenda de 2022
Nos dois últimos anos, por ocasião da pandemia do novo coronavírus, as atividades do Julho das Pretas foram realizadas todas no formato on-line. Com a volta dos eventos presenciais, na edição deste ano, a agenda conta com atividades que visam promover a consciência política dentro do atual contexto por meio de oficinas, encontro de jovens negras, contação de histórias, lives, palestras e ações filantrópicas.
O mote que norteia a programação segue o nacional, definido como “Mulheres Negras no Poder, construindo o Bem Viver!”. Segundo informações do Instituto Odara, o Julho das Pretas 2022 precisa estar alinhado ao contexto de denúncia e revolta que permeia o país, que se encontra em situações de aumento de desigualdades, negligência dos governos e retirada de direitos, as quais atingem as pautas da população negra.
A Programação do Julho das Pretas – PR 2022 pode ser consultada na página oficial do Facebook da organização. Também é possível conferir a agenda nacional no material disponibilizado pelo Instituto Odara.
Dentro das pautas raciais e de gênero, há a necessidade de dar mais visibilidade à essas variáveis, em prol de garantias de políticas públicas. Assim, o Julho das Pretas é uma forma de poder denunciar as demandas específicas que são diferentes das produzidas pelo machismo e pelo racismo de forma individual.
Este texto é parte do projeto Periferias Plurais, que convida seis jovens das periferias de Curitiba e região a falar sobre sua vida, suas ideias e suas comunidades.