A difícil arte de estimular a cultura negra em Curitiba

Casa responsável por lançar trabalhos de muitos artistas negros e marginalizados, Faraoh Records passa por dificuldades

Responsável por diversas iniciativas positivas para o público negro e artistas independentes, a gravadora Faraoh Records, de Curitiba, vem enfrentando muitos problemas jurídicos e precisa lutar para continuar existindo no local onde está. Com o crescimento da Faraoh como espaço cultural, surgiram desafios; a proprietária da sede, junto com a imobiliária. estão processando Luan Farah para sair da casa num prazo super curto. E sabendo como é a vida do artista independente, principalmente do artista negro de Curitiba, não é fácil arranjar um espaço para poder expressar sua arte. Seguir dando apoio significativo aos artistas sem suporte financeiro é difícil, e ainda corre o risco de não ser visto como algo produtivo para cidade. “Ter dinheiro” e “ser artista” parecem ser duas coisas totalmente opostas quando você vem da periferia, negro, e luta contra um sistema. Tudo pode dar errado em dobro.  

 

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Vídeo postado por Luan no começo do mês reportando os acontecimentos da casa e lança a programação da casa para o mês da consciência negra. 

Mas eu pergunto pra vocês: quantos espaços vocês conhecem que se dedicam a fomentar a cultura e que possibilitam que artistas marginalizados deem voz à sua arte? 

Quantas Karol Conka ou Aka Rasta podem existir em Curitiba que nunca vão conseguir ter suas músicas em novelas ou sendo ouvidas fora do círculo de amigos? Quantos artistas curitibanos nunca vão ter o reconhecimento como eles, não pela falta de qualidade mas pela falta de oportunidade?  

Ter uma casa construída desde o zero por artistas independentes que fogem de um sistema, procurando o resgate ancestral e cultivando a criatividade que normalmente é perdida na cidade: é justamente por esse cultivo que a Faraoh vive e tem que ser consolidada cada vez mais. “Ser um espaço onde todo mundo tem  oportunidade de desenvolver sua arte, espaço onde estimula muito o espírito de cooperatividade e união, pensando em fazer as coisas acontecerem, fazendo arte e mantendo ela viva, sem deixar ela morrer por falta de condições e localidade”, diz Gabriel Vienna, um dos criadores e sócio da Faraoh. 

O espaço é necessário não só para os artistas que estão ali dentro, mas para o bem da cultura em Curitiba. Pessoas negras, periféricas, negligenciadas, tentando todo dia sobreviver para poder viver de sua arte. A inquietação desses pensamentos faz com que a casa sobreviva, do apoio das pessoas que consomem dela, indo nos eventos, usando para mostrar seus trabalhos, consumindo coisas de lá, pensando como uma casa cultural, que é.

E agora com workshops para o projeto de produção e capacitação dos artistas e consumidores da casa, e necessitando de mais apoio da comunidade e do governo também, e já causando impacto com os workshops e as rodas de conversas com temas realmente necessários e pocket shows. É complicado empreender numa cidade onde tentam negligenciar a existência da cultura preta e tentam acabar com os empreendedores afrofuturistas e não veem com bons olhos nossas movimentações. A ideia deles é que isso vai contra o que eles estão acostumados, contra o pensamento de ficar na mesmice porque é confortável – só pra eles. O crescimento da construção da casa cultural tentando exaltar e resgatar a força ancestral é “deixar o artista vivo e fazer a arte respirar” e ser consumida como deve ser. 

Entrevista com Luan Farah 

Como foi o Novembro de Aruanda?

Então, em novembro rolou a primeira edição do Novembro de Aruanda, uma programação cultural com o intuito de exaltar e fomentar a cultura preta de Curitiba. Nossa ideia era trazer o protagonismo do mês de novembro para um espaço negro, com atividades idealizadas por pessoas negras e voltadas para o público negro. Foram 13 eventos, entre eles: Slam Zumbi e Dandara, roda de samba, pocket shows de artistas locais, discotecagens, oficinas, rodas de conversa, noite de cinema, palestras. Foi um mês repleto de experiências positivas e de muito aprendizado. Apesar das dificuldades, fiquei muito feliz de ver nosso potencial e tudo que a gente pode fazer como coletivo, até porque conseguimos realizar toda essa programação sem apoio de nenhuma empresa grande ou do governo. Foi tudo feito no modo guerrilha, juntando todos os nossos talentos como equipe para proporcionar algo bacana pra comunidade. Com certeza finalizamos esse mês realizados e prontos para aprender com os erros e proporcionar um mês de novembro ainda melhor no ano que vem! Chegamos pra ficar.

Quais as expectativas para o próximo ano?

“As expectativas pro ano que vem são altíssimas, pois 2023 foi nosso primeiro ano fazendo eventos e fomentando a cultura da cidade de outras formas, aprendemos muita coisa que vamos levar para o ano de 2024. Agora temos uma equipe maior, mais estrutura e mais visibilidade, então depende da gente se organizar e se planejar da melhor forma possível para que o ano que vem seja ainda melhor! 

Falando das atividades da casa, ano que vem vamos continuar com os eventos acontecendo ao longo do meses, sendo o mês de novembro nosso foco principal. Além disso, estamos com um projeto para proporcionar aulas culturais para a comunidade, com previsão para acontecer já no primeiro semestre de 2024, e  teremos muitos lançamentos e show dos artistas residentes da Faraoh. Atualmente são 13 artistas que fazem parte do selo e todos estão em fase de preparação para o lançamento de seus trabalhos autorais. O ano de 2024 promete muitas movimentações, começando já em janeiro! Com certeza vamos fazer muito barulho.”

Este texto é parte do projeto Periferias Plurais, em que o Plural convida jovens de Curitiba e região para falar sobre suas vidas e suas comunidades.

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