Personagem de Ricardo Darín enfrenta a ditadura militar argentina

Argentina, 1985, conta a história do promotor que ousou enfrentar os líderes de uma das mais sangrentas ditaduras da América Latina. Filme de Santiago Mitre pode chegar ao Oscar em 2023

Brasil e Argentina têm em comum terríveis ditaduras militares que se encerraram em meados da década de 1980. No entanto, embora tenham suas histórias democráticas destroçadas por governos autoritários, são países que lidaram de forma muito diferente com seus passados. Enquanto que no Brasil o golpe de 1964 terminou com uma anistia ampla e geral – varrendo para debaixo do tapete da história todos os crimes perpetrados pelos seus generais e subalternos –, a Argentina julgou e puniu seus envolvidos, colocando seus líderes até em prisões perpétuas. É mais por isso e menos pela rixa cinematográfica entre os dois países, que o Brasil é incapaz de realizar um filme como Argentina, 1985, longa que no momento permanece na pré-lista a disputar uma vaga como Melhor Filme Internacional no Oscar de 2023.

Dirigido por Santiago Mitre, Argentina, 1985, é um clássico filme de tribunal, onde o espectador acompanha de perto a preparação de um dos lados – no caso, o da promotoria – e assiste aos principais argumentos de defesa e acusação durante os ritos do julgamento. É tão clássico que em alguns momentos pode soar um pouco déjà-vu, já que o roteiro lança mão de muitas das muletas que o cinemão hollywoodiano incrustou nas cinematografias ao redor do mundo. Refiro-me a viradas de última hora, chantagens emocionais, trilha sonora lacrimosa etc. Mas, então, por que assisti-lo? Em primeiro lugar porque, mesmo com todas repetições de fórmulas que Mitre escolheu para o seu filme histórico, trata-se de uma obra poderosa. A escolha por um caminho tão “cinemão” se dá justamente para chegar ao âmago do maior número possível de espectadores. Em segundo lugar, Argentina… é um filme de maestria técnica. Diria que tecnicamente é impecável. E, por último, o protagonista é interpretado por ninguém menos do que Ricardo Darín, sem sombra de dúvida, o maior ator vivo ou morto daquele país.

Darín vive o promotor Julio César Strassera, um burocrata que até lhe cair nas mãos aquele caso, não passava de um personagem com pouco relevo social. Homem imbuído de revolta e incapaz de enfrentar a máquina de matar que fora o governo militar, despeja sobre sua família, sobretudo sobre o filho caçula, suas opiniões políticas, seu senso de justiça social e seus medos. Com o processo nas mãos e tempo exíguo para montar uma acusação de peso, vê todos aos seu redor negando-se a ajudá-lo. É aí que surge uma horda de jovens idealistas, recém advogados ainda não tocados pelo cansaço e medo de que os mais velhos tão costumeiramente são afligidos. É o filme e a história nos falando mais um pouco do óbvio, a mudança sempre passa pela juventude.

Argentina, 1985, nos conta sobre o julgamento que abriu uma revisão histórica importante daquele período de horror e seus cerca de trinta mil mortos. O filme nem cita o Brasil, mas para nós, é como se nos dissesse a todo instante que esse é um capítulo imprescindível que nos foi arrancado dos livros de história brasileira. A ver se um dia será escrito.

Disponível para assinantes na Prime Video.

Assista o trailer aqui.

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