“Mirador” une o bruto e o sensível em reflexão sobre a identidade masculina

A 24ª Mostra de Cinema de Tiradentes acontece de forma online e gratuita até o próximo sábado (30), com exibição de 114 longas e curtas-metragens, além de interessantes debates e apresentações musicais. Um dos destaques do tradicional evento é o filme “Mirador”, do cineasta curitibano Bruno Costa, que tem Edilson Silva (o Robson de “Bacurau”) como protagonista.

Maycon (Edilson Silva) e a encantadora Malu.

“Mirador” começa com uma cena simbólica e tecnicamente acima da média para o cinema nacional independente – principalmente em termos de captação de som (créditos a Luiz Lepchak): uma luta.

Maycon (Edilson Silva) é um boxeador amador. Concilia o interesse visceral pelo esporte com dois subempregos (ajudante de descarga de caminhão e lavador de pratos). Imigrante negro e pernambucano que mora na periferia de Curitiba, Maycon tem uma relação frágil e silenciosa com sua companheira acidental Michele (Stephanie Fernandes); e extremamente afetuosa com a filha Malu, de menos de dois anos, interpretada por uma pérola de menina chamada Maria Luiza da Costa.

Foto: Ana Málaga

É neste lugar, entre a luta brutal e necessária, e a sensibilidade disruptiva, que “Mirador” se constrói. No Brasil, são comuns os relatos de pais que “desaparecem”, e esquecem mães e filhos no mundo. É uma ação impulsiva que reconfirma um machismo histórico ao querer “se libertar” da tarefa de criação dos filhos, entendida como exclusivamente feminina. Bruno Costa inverte essa tradição e discute paradigmas interessantes, tudo isso num tempo em que a crise da identidade masculina é colocada à prova.

São poucos os momentos em que Maycon sorri, e todos eles são na companhia da filha. Em sua jornada complementar, que envolve um soco num patrão escroto, o preparo da mamadeira, a morte do único amigo e a burocracia estatal para conseguir colocar a filha na creche, o personagem atinge um lugar duplo: o de confirmação da necessidade do que lhe faz homem puro (no caso o boxe) e o da completa aceitação de seu papel também como “mãe responsável” – nem que para isso tenha de fazer bicos que envolvem trabalhos sexuais e andar com uma bolsa cor-de-rosa a tiracolo.

“Mirador” poderia soar óbvio ao confrontar o brutal com sensível. Mas com elegância e precisão técnica, cativa por aquilo que não diz, mas importa. O filme tem roteiro de Bruno Costa e de Wiliam Biagioli e está em cartaz até as 23h59 de sábado (30). Para assisti-lo, é só clicar neste link.

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