Burnout, Boreout e Quiet Quitting: três excessos diferentes no ambiente de trabalho

Cada vez mais esses problemas fazem parte da realidade do ambiente de trabalho local, internacional e do noticiário

Burnout, boreout e quiet quitting. Três expressões que talvez nem todos conheçam pelo nome estrangeiro, mas que infelizmente fazem cada vez mais parte da realidade do ambiente de trabalho local, internacional e do noticiário. Cada um representa um excesso.

Primeiro, burnout. Traduzido e ligado com a ideia de exaustão. Uma boa analogia para entendê-lo é a do fósforo: riscado, acende e queima até que se consuma por completo. Depois, está esgotado, exausto. O termo em inglês traz essa ideia, pois é a junção de duas palavras: burn (queimar) e out (esgotado, ausente).

Dentro do ambiente das relações de trabalho, se revela como síndrome do esgotamento profissional e consiste basicamente pela exaustão energética e emocional, o distanciamento mental do emprego e a redução da eficácia ou realização profissional.

É como se o empregado tivesse seu combustível emocional e produtivo esgotado por conta do trabalho. É como o fósforo que queimou: não há mais da onde tirar energia.

No Brasil, desde o começo de 2022, é classificado como fenômeno relacionado ao trabalho (ocupacional) e consta da Classificação Internacional de Doenças (CID) da Organização Mundial de Saúde (OMS) como uma síndrome resultante do estresse crônico no local de trabalho que não foi gerenciado com sucesso.

Assim, o burnout remete a um excesso do empregador ao criar um ambiente muito pesado, de muita cobrança ou similar, ou omissão, também excessiva, em não corrigir essas condições.

Para fins indenizatórios e processuais, sua constatação demanda nexo causal, ou seja, constatação médica e técnica da relação entre a condição e o trabalho. Em processos, isso levará em conta avaliação médica, documentos e depoimentos de testemunhas.

Segundo, sobre o boreout. Na tradução e na prática, relaciona-se com o tédio. A palavra inglesa bored é que dá origem ao termo, e ela pode ser traduzida exatamente como tédio.

Se de um lado o burnout decorre de um excesso de estresse e carga de trabalho, o boreout é o contrário: se refere a um estado de apatia e desinteresse, causado principalmente por uma baixa demanda. Em que pese também tratar de um estado de saúde mental, ainda não classificado no CID.

Isso não significa, contudo, que já não seja uma realidade em processos trabalhistas. Na prática, o termo mais usado e relacionado é o de “ócio forçado”. Pensamos na hipótese de uma atendente de telemarketing que não consegue trabalhar porque o empregador coloca um bloqueio no seu sistema.
A empregada passa a ficar desmotivada e a se sentir desconectada da empresa. Esse deixar o empregado “de escanteio” pode dar ensejo a dano moral ou a justa causa do empregado (rescisão indireta), além de poder desencadear ou agravar seu adoecimento mental.

Novamente, portanto, trata-se de excesso do empregador em não providenciar (ou impedir) o trabalho e desenvolvimento regular dos empregados.

Por fim, tratemos do quiet quitting. A tradução mais aceita para o termo é “demissão silenciosa” e a ideia central é a de padrão/mínimo.

O mínimo, no caso, é no trabalho: trata-se de um novo movimento em que os empregados estão se propondo a trabalhar somente o mínimo exigido, o padrão, sem buscar qualquer destaque ou atividade que não sejam estritamente necessários. A realidade é mais comum entre jovens.

As mudanças recentes no tocante ao ambiente de trabalho (adoção do homeoffice e maior possibilidade de trabalho para empresas fora da localidade de moradia), nas prioridades pessoais (desenvolvimento próprio, família, estudos, etc.), somados a igualmente recentes debates sobre o excesso de trabalho – onde entra o próprio burnout –, talvez sejam algumas das causas desse movimento e do grande número de demissões (movimento conhecimento como great resignation).

Há um dilema. De um lado, ao empregado cabe a escolha subjetiva de se dedicar mais ou menos ao trabalho, o que é totalmente legítimo. Ao empregador, de outro, cabe incentivar ou propiciar desenvolvimento profissional. Não pode obrigá-lo, mas, queira ou não, sempre se buscará quem se destaca, por medida de competitividade, gestão e economia. É natural no nosso sistema.

Empregado e empregador estão no linear de seus respectivos poderes e deveres. Não há ausência de cumprimento de ordens, mas também nada, além disso. Em alguns casos, a demissão é consequência rápida da atitude. Em outros, com diagnóstico mais tardio, o problema pode aumentar.

Não esquecendo que o ambiente de trabalho deve, necessariamente, propiciar o desenvolvimento pessoal e profissional do empregado, além de alavancar suas relações sociais. Essa é a lógica histórica que permeia as relações de trabalho atualmente.

É certo que as corporações e a legislação, em parte, também incentivam a produção: bônus, prêmios, participação nos lucros, promoções e irredutibilidade salarial. Nada disso tende a se concretizar, contudo, se os próprios empregados, em maioria, não estiverem interessados. Alta rotatividade e pouca produção não são bons sinais para o mercado.

Burnout e boreout certamente representem extremos. As demissões silenciosas talvez também. O extremo em cumprir somente o mínimo, o que também não é desejável ou saudável ao empregado, que logo poderá ser demitido, ficar apático ou não se desenvolver.

O mero trabalho, sem qualquer incentivo próprio ou vontade de crescimento, com certeza não reflete a lógica da legislação ou os anseios do empregador. Mas, de novo, é um direito de escolha somente do empregado.

No mínimo a adesão ao movimento deve despertar uma revisão dos procedimentos, incentivos e ambientes de trabalho.

Ainda não sabemos as consequências de longo prazo dos movimentos, mas, por ora, fica o desafio adicional para os gestores: incentivar e permitir o desenvolvimento saudável de seus empregados.

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