Sanepar tira água de pedreira para suprir Grande Curitiba

Área privada tem dois bilhões de litros de água e grande ecossistema submerso. Ambientalistas apontam degradação e alternativas mas governo reforça crise hídrica

Sem água suficiente nos reservatórios para suprir a demanda da Região Metropolitana de Curitiba, a Companhia de Abastecimento do Paraná (Sanepar) iniciou a captação de água em fontes alternativas, como a Pedreira Maringá, mais conhecida como Pedreira do Orleans, em Campo Magro. A medida preocupa ambientalistas e mergulhadores, já que o local desenvolveu ecossistema único e abriga um dos maiores centros de treinamento de mergulho do país. Sanepar reforça crise hídrica e apenas 34% de reserva de água no Estado.

Desde que foi desativada, há 30 anos, a Pedreira do Orleans acumulou uma coluna d’água de 45 metros com qualidade ambiental suficiente para atrair vida. Trata-se da única pedreira da região com essas características. De acordo com o engenheiro agrônomo e instrutor de mergulho Robin Hilbert Loose, ali vivem diferentes espécies de aves aquáticas e cardumes de peixes nativos e exóticos, além de pacas, capivaras e lontras. “Ninguém pode falar que é um ambiente artificial, já é natural. Foi impactado no passado, há décadas, e a natureza se encarregou de construir todo um ecossistema biológico rico. Não foi realizado nenhum estudo para saber o impacto ambiental desse bombeamento ali”, afirma o engenheiro.

Com o bombeamento de 150 litros de água por segundo – segundo a Sanepar – o nível da água na pedreira desce rapidamente. Robin teme que o local, que serve de refúgio à vida silvestre em uma região altamente antropizada, acabe em “um grande buraco de lama e bicho morto, fedendo carniça“.

Uso social

Segundo o ambientalista, o local abriga o maior simulador de naufrágio da América Latina, sendo utilizado pelo Corpo de Bombeiros, pela Defesa Civil, pelo Exército e pelas polícias Militar e Civil para treinamento de mergulho há mais de 10 anos. A beleza cênica, a profundidade e a visibilidade, além da estrutura de treinamento submersa – que conta com um ônibus cedido pela prefeitura de Curitiba, quatro carros e seis plataformas – atrai também mergulhadores de todo o país.

Para Robin, a pedreira tem potencial para ser um parque estadual de visitação. “Ela é enorme. O pessoal utiliza para rapel, canoagem e tem essa parte social de treinamento da segurança pública. Tudo isso será perdido.”

Ele argumenta, a partir da informação de um engenheiro da Sanepar, que a água captada da pedreira seria suficiente para abastecer apenas alguns bairros da Capital por dez dias. A empresa, no entanto, afirma que os quase dois bilhões de litros de água contidos na lagoa da pedreira suprem a demanda de uma população de 60 mil pessoas durante três meses.

“É óbvio que entendemos que a água é um bem comum de todos, é fundamental para higiene, ainda mais no meio de uma pandemia, mas a Sanepar sabe muito bem que existem alternativas para preservar esse ambiente único. Não dá pra deixar essa pedreira como a última das opções e utilizar outras, que não têm tanta vida?”, questiona o mergulhador.

O Corpo de Bombeiros afirma que o local tem características boas para treinamento, mas que existem outros locais no estado onde atividades dessa natureza poderia ser realizadas. “Entendemos o esvaziamento da pedreira como algo prioritário para a questão da gestão hídrica do estado, especialmente na região de Curitiba, por conta da estiagem. Temos uma emergência hídrica que precisa ser tratada dessa forma”, diz o Major Eduardo Gomes Pinheiro, do Comando do Corpo de Bombeiros Militar do Paraná.

Corpo de bombeiros realiza treinamentos no local antes do esvaziamento. Crédito: Reinaldo Alberti

Sem acordo

Em tentativa de diálogo, ambientalistas e mergulhadores participaram de uma reunião virtual com a Sanepar na última sexta-feira (10). Segundo Robin, apesar da afirmação de um dos engenheiros da Companhia presentes na reunião de que existem outras fontes de captação de água, a Sanepar se manteve irredutível.

“Não tivemos nem um acordo, como tirar 10% dali e ir para outros lugares, sem comprometer a viabilidade ecológica, social e ambiental do local. Estão ali porque é menos custoso. Eles têm outra opção, que é bombear água do reservatório da refinaria da Petrobrás (Repar), por exemplo.”, diz o engenheiro agrônomo.

O caso chegou à Comissão de Ecologia, Meio Ambiente e Proteção Animal da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep). Em documento enviado à Prefeitura de Campo Magro, à Sanepar e à Secretaria do Desenvolvimento Sustentável e do Turismo do Estado do Paraná, o presidente da comissão, deputado estadual Goura (PDT), pede que “sejam interrompidas imediatamente as ações de bombeamento de água da Pedreira Maringá e estabelecido diálogo público entre as partes interessadas, com apresentação do devido estudo dos impactos socioambientais da drenagem do local e das possíveis alternativas.” O Ministério Público (MP-PR) também analisa a questão.

Sanepar

De acordo com a Sanepar, a crise hídrica afetou a vazão de rios e poços e o nível das quatro barragens do sistema integrado de abastecimento de Curitiba e Região Metropolitana, que hoje contam com 34,8% da capacidade de reserva.

A empresa afirma estar buscando água em fontes alternativas, como a Pedreira Malhada, em São José dos Pinhais, as cavas da Fazenda Rio Grande e no Parque das Águas, em Pinhais.

“São várias medidas mitigatórias adotadas pela Sanepar nesse período. A Sanepar tem autorização dos proprietários da Pedreira Maringá e outorga do Instituto Água e Terra (IAT). Além disso, o decreto do Governo do Estado prioriza o uso da água para abastecimento humano.”

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