A primeira vereadora negra eleita em Curitiba, Carol Dartora (PT), recebeu ameaças de morte neste domingo (6). A intimidação – que ocorre um dia após Rafael Greca (DEM) negar a existência de racismo estrutural em Curitiba – foi feita por um e-mail, cuja imagem foi compartilhada por Dartora nas redes sociais.
A mensagem tem a mesma assinatura de um e-mail com ameaça de morte encaminhado à vereadora eleita em Belo Horizonte Duda Salabert, na última sexta-feira (4), e a Alisson Julio (Novo), que é cadeirante e foi o vereador mais votado em Joinville (SC). O conteúdo também é o mesmo enviado à candidata petista Ana Lucia Martins, eleita em Joinville, e à prefeita eleita de Bauru, a jornalista Suéllen Rosim (Patriota).
No texto das ameaças recebidas por Dartora, o autor usa termos como “aberração”, “macaca fedorenta” e “cabelo ninho de mafagafos” para se referir à vereadora e coage: “Eu juro, mas eu juro que vou comprar uma pistola 9 mm no Morro do Engenho aqui no Rio de Janeiro e uma passagem só de ida para Curitiba e vou te matar. Eu já tenho todos os seus dados e vou aparecer ai na sua casa [sic]”, acrescentando logo depois o endereço da residência da candidata eleita.
Em outro trecho, o texto diz que “depois de meter uma bala na sua cara e matar qualquer um que estiver junto com você, vou meter uma bala na minha cabeça. Não adianta avisar a polícia ou andar com seguranças. Nada no mundo vai me impedir de te matar e me matar em seguida”.
Segundo a Polícia Civil, o caso já está sendo acompanhado e “todas as medidas cabíveis serão tomadas”. O boletim de ocorrência deve ser registrado nesta segunda-feira (7), e as investigações serão conduzidas conjuntamente entre o 1º Distrito Policial e o Núcleo de Combate aos Cibercrimes (Nuciber).
O nome que assina o e-mail é, na verdade, de um analista de sistemas cujos dados pessoais são usados há anos pela maior quadrilha de crimes de ódio da internet brasileira, a Dogolachan.
O mais assustador de todos
Em nota, a vereadora Carol Dartora classificou a ameaça recebida neste domingo como o mais assustador de todos os ataques baseados em intolerância e indignação que vêm sofrendo desde que foi eleita.
“De todos os ataques o que mais me assustou foi o que recebi ontem (conforme cópia do e-mail recebido em anexo), da mesma autoria dos proferidos à Vereadora mais votada de Belo Horizonte, Duda Salabert, o que me faz crer que este ódio por negros e negras, LGBTI+ e mulheres, que em 2020 mexeram com as estruturas da sociedade disputando o poder, são coordenados”, escreveu a parlamentar, que vê no conteúdo uma tentativa de silenciamento.
“Querem nos silenciar antes mesmo de tomarmos posse. Querem diminuir nosso grito por liberdade e justiça. Porém sigo ainda mais resoluta a lutar por um mundo onde todos e todas tenham direito e acesso a igualdade e dignidade”, acrescentou.
A ameaça de morte sofrida pela vereadora curitibana ocorre um dia após o prefeito da capital paranaense afirmar, em entrevista à entrevista à GloboNews, exibida neste sábado (5), que não existe racismo estrutural em Curitiba. A resposta veio quando a jornalista Andreia Sadi o questionou sobre a eleição da primeira vereadora negra da história da cidade, Carol Dartora (PT).
“Eu discordo da vereadora que aqui haja um racismo estrutural”, disse Greca, depois de Sadi citar declarações da vereadora eleita sobre o preconceito existente na cidade. “Eu cresci numa casa onde a engenheira Enedina Marques era colega do meu pai e conosco estava sempre”, ela firmou.
Neste domingo, ao falar sobre o ataque, Dartora considerou a fala de Greca como “inadmissível” e disse que a negação do racismo “que permeia toda nossa sociedade chancela atitudes como essas, normaliza a violência e invisibiliza nossa luta”.
“Combinaram de nos matar, mas nós combinamos de ocupar todos os espaços, inclusive a Câmara Municipal de Curitiba! Sigo com determinação para fazer o que me foi designado enquanto representante do povo. Não vão nos calar. Estarei lutando firme e forte ao lado da população curitibana que depositou em nosso mandato toda a esperança de uma cidade mais igualitária, sem ódio e violência”, colocou Dartora.
Em um vídeo publicado nesta tarde, a eleita afirmou que, apesar da situação, está bem:
Combinaram de nos matar, mas nós combinamos de ocupar todos os espaços, inclusive a Câmara Municipal de Curitiba!
— Carol Dartora (@caroldartora13) December 6, 2020
Estarei lutando firme e forte ao lado da população curitibana que depositou em nosso mandato toda a esperança de uma cidade mais igualitária, sem ódio e violência. pic.twitter.com/SLqOm3ax67
Pelas redes sociais, a vereadora recebeu mensagens de apoio, entre elas das deputadas federais correligionárias Benedita da Silva e Gleisi Hoffmann, e da filósofa Marcia Tiburi.
Violência eleitoral
Reportagem publicada pelo Plural na sexta-feira, a partir de um levantamento realizado por uma coalizão de nove veículos jornalísticos independentes, mostrou que, neste ano, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) computou 63 processos por “captação ilícita de sufrágio”, termo técnico para a compra de votos. O número representa um aumento de 425% em comparação às últimas eleições, em 2018, quando apenas 12 processos foram abertos na Justiça Eleitoral pelo mesmo motivo.
O aumento do registro de casos também levou a ataques, desentendimentos e episódios de violência. Pelo menos quatro casos de violência política relacionados à compra de votos ocorreram no pleito eleitoral deste ano.
O NUCIBER encontra o autor desse email em dois tempos. Basta querer.