Curita loca

Antes da pandemia pegava uber mas agora parece que é sempre dinâmica. Moro do lado da canaleta. Toca meia dúzia de músicas tô no trampo. Passa meia dúzia de dias tô de folga. Não tem muito pico em Curita funcionando 6×2. Business de atendimento ao público costuma ser escala 6×1. Costumava. Vários rolê fechando. Vários abrindo também. Aqui do lado do prédio inauguraram um restaurante pique estrela michelin. Botaram toldo na calçada. Podaram o abacateiro. Um conhecido meu que descolou trampo ali disse que só de espumante e ostra tem conta que passa de mil. O mundo quebrado. Sei lá se tem conserto. Tem ironia. O nome do segurança do restaurante é Rone.

Entraram no pico antes da inauguração. Lembro que se pa era domingo e do nada um barulhão na rua. Não vi ninguém na janela do quarto. Voltei pro fogão. Almocei com a Fernanda mas homeoffice é toda hora. Fui lagartear sozinho. Aí tava puxando a cortina e flagrei uma galera na fron do restaurante. Umas barca gringa e todo mundo de cara fechada. Naquela noite um gol bola ficou estacionado em baixo da nossa janela. Nas outras noites também. O Rone dorme dentro do carro e quando saio trampar ele ainda não acordou. Na hora que volto tá de segurança na padaria e quando anoitece vai pro segundo turno no restaurante ao lado. Aí a rua fica deserta. Ele baixa os bancos e descansa. A padaria é de pão de fermentação natural.

E tem sido assim. De baia pro trampo. Do trampo pro mercado. Do mercado pro posto. Tem um ali na Ucrânia que a sedinha não é tão cara. Dá mó bad o preço da gasosa. Tudo que a gente consome tem transporte embutido. Nada para. O bagulho é tão frenético que pra relaxar corro. Vai vendo. Tem noite começo no Sesc da Esquina e chego na Rui Barbosa, passo olhando a Santa Casa, subo a Sete, quebro na Mario Tourinho e aí uma porrada de concessionária antes do terminal do Campina, das árvores da canaleta do Bigorrilho, da praça 29 de Março que tem quadra poliesportiva pra polícia chutar caixa de som e enterrar quem não é branco. O Rone também não é mas duvido que frequente a praça. Nunca vi o mano de folga.

Teve uma noite eu tava chegando do rolê com a Dora e ela abanou o rabo pra ele e ele curtiu. Aí a gente se apresentou. Perguntei se curtia café e no outro dia me devolveu a xícara. Sempre devolve lavada. Devolvia. Tem papo de uma semana que o Rone só faz o turno da padaria. Contrataram outro maluco. Se pra entrar em baia passo pela calçada que agora é do restaurante, geral me olha e vai guardando celular. Se vou pelo meio da rua, o segurança coça a cintura e espera. Sei lá qual fita. Sei que nessa friaca colocaram aquecedor entre as mesas e depois do restaurante já tem a porta do prédio. Passando a porta tem uma marquise. O segurança fica ali. Entre o calor e a pessoa deitada no papelão.


Para ir além

A crônica não mata – Parte 7

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