Obituário: Manoel Coelho, ícone da arquitetura

Adepto da "arquitetura sem frescura" morreu aos 80 anos, deixando sua marca em projetos por todo o estado

Curitiba perdeu, na última quinta-feira (4), um dos mais importantes nomes da arquitetura paranaense. Manoel Coelho, aos 80 anos, deixa um grande legado. Seus projetos estão espalhados por todo o estado. Quem anda por Curitiba, certamente já se deparou com seus desenhos: esteve nos campi da PUC ou da Universidade Positivo (UP); caminhou pelo pavilhão de eventos do Parque Barigui ou engraxou os sapatos na Boca do Brilho; usou uma lixeira pública verdinha ou sentou-se para ler um livro na Biblioteca Pública do Paraná. Tudo isso – e mais um pouco – tem o toque do arquiteto.

Coelho graduou-se na primeira turma de arquitetura do estado, na Universidade Federal do Paraná (UFPR), imerso na conjuntura da arquitetura moderna. Teve forte influência dos professores Roberto Gandolfi, Luiz Forte Netto e Joel Ramalho, que recusavam as referências historicistas em prol de uma arquitetura atualizada com a tecnologia. “Em vez de buscar significados no passado grego, romano, gótico ou o que fosse, aqueles os arquitetos passaram a conceber edifícios a partir do próprio significado arquitetônico: a estrutura que sustenta o edifício, os materiais de construção e o uso que do edifício. Então, a explicação da arquitetura estava na própria arquitetura e no seu próprio tempo e não na decoração ou na citação de estilos históricos”, explica o arquiteto e historiador Irã Taborda Dudeque.

Taborda, que é autor do livro Manoel Coelho: arquiteturadesign, considera o projeto da Pontifícia Universidade Católica (PUC) como o principal da carreira do arquiteto. “Ele trabalhou no desenvolvimento do campus da PUC durante mais de 40 anos. Nesse tempo, conseguiu uma coisa rara, que é organizar várias escalas da arquitetura num sistema, que abrange a planificação dos vários campi, dos edifícios, dos laboratórios, das placas de sinalização, dos uniformes dos funcionários e do design do papel de cartas, formando um todo. É raro alguém ter a oportunidade de desenvolver um projeto nessa escala. Ele teve a oportunidade e, ainda mais, teve a capacidade”, afirma o autor.

Os projetos do arquiteto carregavam os traços de sua personalidade forte. Nas conversas preliminares para os projetos das futuras bibliotecas da PUC e da UP, Manoel recusou veementemente as sugestões dos dirigentes universitários, que falaram com admiração das bibliotecas norte-americanas, cheias de referências gregas, romanas e renascentistas. “Em ambos os casos, ele argumentou que era um absurdo querer copiar aquilo, que estamos no Brasil, no século 21 e de nada adianta copiar colunatas dos tempos do império romano. Seria um anacronismo deliberado”, conta Taborda. 

O Pavilhão Expo Unimed, no complexo da Universidade Positivo, está no rol de criações de Manoel Coelho. Foto: Arquivo pessoal

O arquiteto e professor aposentado da UFPR, Key Imaguire, conviveu com o adepto da “arquitetura sem frescura” por cerca de 30 anos. Coelho também foi professor, mas de acordo com Imaguire, “o negócio dele era o escritório”. Lá, era bastante exigente, o que parece ter funcionado bem. Seu escritório foi um dos que se manteve e até cresceu, quando os outros começavam a encolher. “A produção importante dele era o projeto. O que ele procurava transmitir para os estudantes era essa qualidade de projeto”, afirma o professor.  

Para além do professor e do arquiteto de personalidade forte, existia um “figuraça, bom de conversa, fã de jazz e bossa nova. Manoel fazia parte do grupo de arquitetos que criou o Teatro Paiol, então eles iam nos shows daquelas pessoas legais do jazz e da bossa nova e depois saiam para apresentar a cidade”, diz Taborda.

A filha do ex-governador, arquiteto e urbanista Jaime Lerner, Ilana, também lembra de Coelho como uma figura divertida: “Eles eram amigos de muito tempo. Sempre que se cumprimentavam, o Coelho falava pro meu pai ‘Nossa, Jaime, como você está magro!’. E o meu pai respondia ‘Nossa, Coelho, como você está alto!’ Eles sempre brincavam um com o outro desse jeito. Se gostavam muito.” 

“Coelho era um grande arquiteto e um grande amigo. Sua contribuição nos avanços da nossa cidade são imensuráveis! Era um dos importantes nomes da nossa arquitetura que deixou aqui sua marca”, disse Lerner ao Plural.

Manoel Coelho morreu aos 80 anos por complicações do câncer.

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1 comentário em “Obituário: Manoel Coelho, ícone da arquitetura”

  1. Myrian Vecchio Lima

    Excelente matéria, Rafaela, para um personagem que representa a arquitetura e a cultura de Curitiba! Uma perda enorme para a cidade. Mas, um legado incrível para os jovens estudiosos de meio ambiente urbano, cidades, espaços, lugares, símbolos, significações.

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