Professores avaliam Referencial Curricular para novo Ensino Médio

Paraná abre consulta pública sobre diretriz dos conteúdos que devem ser modificados em 2022

A reforma do Ensino Médio brasileiro, instituída pela lei 13.415/2017, recebeu críticas e reprovação em vários Estados, especialmente no Paraná. Mesmo com protestos da comunidade escolar, que resultaram nas ocupações de escolas em 2016, o texto foi aprovado no Congresso e permitiu aos governos estaduais instituírem seus próprios e atualizados currículos. No Paraná, a Secretaria Estadual de Educação (Seed) abriu neste mês consulta pública sobre o Referencial Curricular, a diretriz para os conteúdos do novo Ensino Médio, que será implantado nas escolas públicas e particulares a partir de 2022.

O documento, com 1.154 páginas, foi colocado para consulta na internet no dia 3 de fevereiro e segue aberto até o dia 28/2. Nele, estão compiladas as novas aprendizagens previstas, que integram uma Formação Geral Básica, comum a todos os estudantes, e outra composta por Itinerários Formativos, nos quais o aluno opta por Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza ou Ciências Humanas – que tiveram a carga horária (das disciplinas de Filosofia, Sociologia, Artes e Educação Física) reduzida pela metade.

Segundo a Secretaria Estadual de Educação (Seed), o objetivo do novo currículo “é promover a autonomia do estudante, que será protagonista do próprio percurso escolar”. A ideia é equiparar o peso das áreas estudadas, como já ocorre no Ensino Fundamental, e garantir mais chances de emprego para quem conclui o Ensino Médio.

“O Referencial Curricular deverá nortear a elaboração dos currículos da Rede (Estadual) e das escolas particulares paranaenses. Ele contempla aprendizagens essenciais a serem desenvolvidas no decorrer da etapa do novo Ensino Médio. Ele não é currículo mas é um documento que deve norteá-los”, explica Ane Carolina Chimanski, coordenadora de Currículo da Seed.

Em entrevista recente ao Plural, o diretor da pasta, Roni Miranda chamou a mudança nas disciplinas de “calibragem de carga horária”, já que o conteúdo de Humanas ocupava maior peso no currículo. Ele admitiu que os debates sobre a nova matriz curricular se concentraram nos setores internos da Seed e não se expandiram para a comunidade escolar porque isso “dificultaria chegar a uma conclusão”.

Diálogo e preparo

A discussão foi aberta formalmente agora – como obriga a tramitação do novo processo – porém, os professores ainda se sentem distantes de uma participação efetiva na elaboração do documento-base.

“Não temos nenhum tipo de comunicado oficial. A postura da Seed tem sido de imposição e não de diálogo, então, por mais que haja esse processo formal de consulta pública, não significa que a contribuição das respostas será suficiente para modificar algo que está por vir”, afirma Edimara Oliveira, professora da Rede Estadual há 13 anos e integrante do Coletivo Humanidades da UFPR.

“Estabelecer um discurso de que o aluno pode escolher sua área do conhecimento, desconsidera que quando ele for fazer um vestibular ele não vai poder fazer esta escolha no conteúdo das provas. É um discurso que muitos querem ouvir, mas será que há maturidade pra entender que o restante do conteúdo fará falta na formação do Ensino Superior?”, questiona a educadora.

Para ela, o foco da Seed no imediatismo do mercado de trabalho não será suficiente para corrigir as desigualdades de aprendizado e garantir que os alunos retornem à escola, visto o alto índice de evasão escolar nesta etapa – acentuado com a pandemia e a Educação à distância.

O ensino remoto nem sempre chega a todos os estudantes. Foto: Geraldo Bubniak/AEN

“Será muito difícil estas mudanças acontecerem se não forem acompanhadas do preparo dos professores e de uma gestão com olhar voltado para a Educação enquanto um direito social, que permite que o estudante possa alçar voos maiores e chegar a uma universidade, fazer um curso técnico com qualidade, ter um sonho de futuro”, enfatiza a professora.

Texto provisório

Tais Mendes, integrante do Conselho Estadual de Educação (CEE) e secretária educacional da APP-Sindicato, reforça que o Referencial Curricular da Seed foi formulado num cenário de imposição e de falta de diálogo. “São mais de mil páginas, colocadas sob consulta num momento muito crítico da pandemia, com esgotamento físico e mental dos professores e de toda comunidade, para que nos debrucemos diante dele, sem debate nas escolas”, avalia a conselheira.

A crítica principal ao documento, diz ela, é que não há debate com a comunidade escolar e que a consulta pública se esgota de forma on-line, no momento de volta às aulas. “Colocam um documento dessa importância para que as pessoas preencham o questionário e deem a sua opinião sem aprofundar um debate.”

A conselheira lembra que para colocar em consulta pública o Referencial Curricular, o Conselho Estadual de Educação aprovou provisoriamente a base do texto. “O documento foi construído a partir de uma minuta das Diretrizes Curriculares Complementares do novo Ensino Médio, que ainda está em discussão no Conselho Estadual de Educação (CEE). Em meados de maio e início de junho, o Cee colocará em consulta pública as Diretrizes Complementares e o Referencial Curricular. Então, o Cee compila todas as sugestões e vota os documentos em julho. Se aprovados, em 2022 a implantação será gradativa”, explica.

Diferenças

Entre as fragilidades do texto apontadas pelos educadores está o fato dele não garantir que todos os estudantes tenham acesso aos conhecimentos. “Esse formato em itinerários tende a aprofundar ainda mais as desigualdades que já existem, sobretudo para os de escolas públicas”, aponta a doutora em Educação, Mônica Ribeiro, professora de Políticas Educacionais na UFPR.

Coordenadora do grupo de pesquisa Observatório do Ensino Médio, também da UFPR, Mônica acrescenta que quando se compara ensino público e privado, a avaliação é ainda mais complexa do que a grade curricular. “Temos que considerar as condições de oferta, a infraestrutura física, o esforço docente, carga horária, número de turmas e estudantes. A questão do currículo é delicada para se depositar sobre a mudança curricular a melhoria da qualidade de ensino.”

Esta só será possível, percebe a doutora em Educação, quando o Estado considerar as adversidades, os regionalismos e as particularidades de cada comunidade. Em vez de unificar a grade curricular, o caminho seria garantir a cada escola a elaboração de seu próprio projeto político-pedagógico e de seu plano curricular. “Não há como essa unificação enfrentar os quadros de abandono e evasão no Ensino Médio”, conclui.  

A pesquisadora ressalta que tanto o prazo quanto a forma do Referencial Curricular em consulta são problemáticos. “Seria interessante uma mobilização das escolas, mesmo por reunião on-line, mas um tempo, de fato, para ler o que a Seed propõe, com amplo diálogo e contribuições das escolas.”

Para acessar o conteúdo do Referencial Curricular e participar da consulta pública, clique aqui.

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1 comentário em “Professores avaliam Referencial Curricular para novo Ensino Médio”

  1. DANIELA BARBIERI VIDOTTI

    Olá.
    O documento de consulta ao Referencial Curricular do novo Ensino Médio Paranaense não está mais disponível na página da SEED.
    Será que vcs podem me enviar, por favor?

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