Garagens, quartos emprestados, vans e outras ocupações: para onde foram as famílias despejadas 

Cerca de 150 famílias ficaram completamente desabrigadas após uma ação de despejo forçado em Curitiba

Após a Polícia Militar do Paraná (PMPR) destruir as casas da ocupação Povo Sem Medo, nesta terça-feira (10), cumprindo uma ordem de reintegração de posse, mais de 150 famílias ficaram sem ter para onde ir. 

A ação da PM teve início às 6h da manhã de terça e terminou por volta das 19h. No entanto, foi apenas às 4h15 da madrugada desta quarta-feira (11) que todos os moradores da ocupação conseguiram um espaço para ficar. São garagens, vans, quartos emprestados e outras cinco ocupações de Curitiba que abrigam atualmente as famílias da Povo Sem Medo. 

De acordo com Mariana Kauchakje, integrante do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), as equipes da Fundação de Ação Social (FAS) deram apenas uma alternativa à população: as famílias tinham a opção de ir para o acolhimento, mas seriam separadas. Mulheres e crianças pequenas (até 11 anos) iriam para um alojamento e homens para outro, conforme Mariana. “Por isso nenhuma das famílias foi capaz de aceitar a proposta. As poucas pessoas que aceitaram foram homens sozinhos e mulheres sem filhos.”

Sem um plano de realocação efetivo por parte da prefeitura de Curitiba, organizações da sociedade civil e entidades, além do MTST, começaram um intenso trabalho de busca para que a comunidade não passasse a noite na rua. “Famílias inteiras com as coisas que conseguiram retirar antes que quebrassem os barracos em garagens e vans de vizinhos ou em um único quarto emprestado por alguém. Algumas pessoas conseguimos colocar temporariamente em outras ocupações.”

Morador da ocupação retirava seus pertences enquanto as casas eram destruídas nesta terça. Foto: Cecília Zarpelon/Plural

O que diz a FAS

Ao Plural, a FAS informou que duas famílias foram para uma entidade parceira da prefeitura, onde permanecerão até se reorganizarem. Outros três homens foram encaminhados a uma Casa de Passagem. A fundação não informou o nome dos locais nem suas localizações. 

Segundo a FAS, o restante dos moradores da ocupação teria optado por ir a residências de familiares ou pessoas de referência e negou que famílias tenham sido separadas.

Processo não foi respeitado

De acordo com o coordenador do Núcleo Itinerante das Questões Fundiárias e Urbanísticas (NUFURB) da Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR), defensor público João Victor Rozatti Longhi, a decisão judicial que autorizou a reintegração determinava que a Defensoria e o Ministério Público fizessem a “fiscalização acerca da prática dos atos concretos”, o que foi impossibilitado pela falta de notificação aos órgãos.

Quando o defensor chegou na ocupação, na noite de terça, o processo de desocupação já estava avançado. Por isso, solicitou à prefeitura quais foram os encaminhamentos dados e à Polícia Militar para que fizesse um relatório da ação. 

“O que nos foi dito é que muitas famílias teriam ido para casa de parentes e as que necessitavam, a prefeitura disponibilizou abrigo, mas com o agravante de que acabou separando famílias. Agora, estamos aguardando as repostas da FAS e da PM, assim como os relatos dos moradores para saber se houve um encaminhamento adequado ou não para apurarmos eventuais responsabilidades em caso de descumprimento.”

Para Mariana, do MTST, a desocupação aconteceu passando por cima de algumas questões processuais condicionantes. Além da falta de intimação prévia do Ministério Público e da própria Defensoria, que deveriam estar no local para acompanhar a atividade, a prefeitura teria que elencar de forma detalhada os locais de destino das pessoas. “O que ficou decidido no processo era que, sim, a ordem de despejo poderia acontecer, desde que as famílias fossem transferidas para um local de moradia digna ou alojamentos temporários que fossem capazes de abriga-las.”

E agora?

Diante da situação precária e extremamente temporária dos moradores da Povo Sem Medo, o MTST e o Ministério Público do Paraná haviam feito um pedido formal para que a prefeitura cedesse um espaço da cidade para a comunidade, como um ginásio, até que fosse resolvida a questão. Embora esse tipo de solicitação de recursos para assistência humanitária possa ser feito em casos de calamidade pública – está previsto na Lei nº 12.340, de 1º de dezembro de 2010 – ele foi negado no caso da ocupação Povo Sem Medo.

Neste momento, o MTST entrou com outro pedido para que a prefeitura faça a cessão de casas populares com a cobrança de um aluguel social. “Sabemos que Curitiba não consegue atender todas, mas é preciso pressionar. A desocupação foi feita fora do que estava acordado no processo. Então a culpa das famílias estarem nessa situação é dos agentes públicos e do sistema de justiça de Curitiba que permitiu que isso acontecesse”, afirma Mariana.

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1 comentário em “Garagens, quartos emprestados, vans e outras ocupações: para onde foram as famílias despejadas ”

  1. Seria bom se a PM mostrasse toda essa energia covarde com os terorristas acampados em frente aos quartéis do exército. Mas como sabemos ela só usa essa energia covarde contra pobres, pretos e favelados.

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