Crítica do governo a universidades é infeliz, diz superintendente

Superintendente de Ensino Superior no governo Ratinho, Aldo Bona diz que divulgação de dados não confirmados dificulta relação com instituições

A ideia do governo Ratinho Jr. (PSD) de cobrar publicamente as universidades estaduais sobre supostos gastos excessivos com pessoal foi criticada não apenas pelas instituições e sindicatos mas também pela própria equipe do Executivo. Em entrevista ao Plural, o superintendente de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior do Paraná, Aldo Bona, classificou como “infeliz” a divulgação de matéria a respeito, publicada pela Agência Estadual de Notícias (AEN). Segundo ele, os dados não foram confirmados e não contribuem em nada na resolução de questões enfrentadas na relação entre governo e Instituições Estaduais de Ensino Superior (IEES).

O site oficial do Estado afirma que “no primeiro semestre, as instituições já gastaram R$ 20 milhões do dinheiro público para pagar horas extras sem qualquer anuência do comitê que é responsável pela gestão dos recursos humanos do Poder Executivo”. Segundo o texto, dados das secretarias estaduais da Fazenda e da Administração mostram que inconformidades com despesas de pessoal nas universidades estaduais geram um déficit orçamentário anual de R$ 123 milhões ao Paraná.

Entre os problemas estariam: remunerações acima do teto constitucional; pagamentos da gratificação de Tempo Integral e Dedicação Exclusiva para agentes universitários e docentes temporários; pagamentos de serviços extraordinários sem autorização; e pagamentos de vantagens, gratificações e adicionais remuneratórios sem fundamento legal.

No entanto, Bona lembra que o déficit de professores está sendo coberto com temporários, assim como o déficit de servidores está sendo coberto com horas extras. “Por isso a crítica do montante de horas extras utilizadas, que foi justificada neste sentido. Mais de 80% de horas extras são em atividades dos hospitais universitários, em que a questão é imperiosa; ou você tem gente lá atendendo ou você não tem leito funcionando. Para manter os turnos e funcionar, as universidades têm pago horas extras”, avalia.

Para o superintendente, a troca de acusações entre entes de uma mesma esfera é sem fundamento. “O valor aprovado, neste ano, para folha de pagamento é em torno de R$ 50 milhões, abaixo do que foi executado em 2018. Obviamente que já há um déficit, que precisa de suplementação. Além disso, a desvinculação das receitas captadas pelas próprias universidades geram demandas de custeio que também precisam de suplementação.”

De acordo com ele, existe ainda o crescimento vegetativo da folha. “Pagamento de promoções, progressões, quinquênios, anuênios, que também impactam. Então este déficit não é algo inexplicável, que elas passaram inadvertidamente a gastar mais e por isso estão onerando o estado. Esta matéria que foi divulgada pela AEN não contribui em nada para resolvermos as questões que estamos enfrentando na relação entre governo e universidades. Ela foi uma publicação de dados ainda não confirmados e, portanto, uma publicação infeliz.”

A AEN também destacou a necessidade de todas as universidades estaduais estarem integradas ao Sistema META 4, “plataforma responsável pela gestão da folha salarial dos servidores que permite que toda a população saiba, através do Portal da Transparência, onde estão sendo investidos os recursos públicos.”

Porém, segundo Bona, dizer que o Meta 4 é condição para transparência também é equivocado e “não se sustenta pois tudo o que se aponta como, hipoteticamente, irregular está se tirando de onde, se não do Portal da Transparência? Tudo o que está publicado no Portal sobre os servidores que estão no Meta 4 está igualmente publicado dos servidores que não são pagos pelo Meta 4. Então, transparência como motivo para Meta 4, não é verdadeiro.”

Universidades

Após a publicação da AEN, as universidades publicaram respostas sobre os tais gastos excessivos. Todas justificaram as horas extras pela falta de servidores. O déficit de pessoal é crescente nas instituições, onde concursos públicos não são realizados há pelo menos quatro anos. Os últimos aprovados não foram nomeados e nem mesmo a recontratação de professores temporários foi ainda liberada pelo governo.

UEM perdeu 267 servidores só este ano. Nenhum foi reposto. Foto: UEM

UEM

A Universidade Estadual de Maringá (UEM) informa que as horas extras pagas pela instituição foram destinadas a suprir falta de servidores e demonstram a dura realidade que a Universidade enfrenta.  Segundo o pró-reitor de Recursos Humanos, Luís Otávio Goulart, a UEM tem um déficit de 913 servidores, acumulado desde 2014. Só neste ano, perdeu 267 funcionários.

Goulart destaca que o gasto com horas extras é destinado ao pagamento de zeladoria, vigilância e serviços gerais, além do Hospital Universitário, que sem os serviços extraordinários teria comprometida sua capacidade de atendimento à população. “Qualquer pessoa que passa, hoje, pelo HU provavelmente teve o atendimento prestado por pessoal em serviço extraordinário”, afirma o pró-reitor.

“Nem mesmo as nomeações de agentes e docentes aprovados em concursos têm sido autorizadas”, reforça Goulart, avaliando que este cenário pode levar, inclusive, ao fechamento de alguns setores ou à diminuição de serviços prestados.

O pró-reitor destaca que tem sido possível identificar uma sensível redução no pagamento da folha ao longo do primeiro semestre, especialmente pelo grande volume de aposentadorias. Segundo ele, é inverídica a afirmação de que a UEM teria pago salários acima do teto legal.

Sobre a necessidade de contratação de professores colaboradores, esta também decorre da falta de nomeação de efetivos já aprovados em concurso. “A realidade hoje é que muitos cursos que a Instituição oferece têm suas atividades mantidas pelos professores temporários, cujos contratos precisam ser renovados. Para além disso, a UEM aguarda a autorização de novos processos seletivos”, diz a nota.

UEPG

A Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) afirma que as horas extras questionadas são destinadas aos servidores da limpeza, vigilância, motoristas, laboratoristas e serviços gerais. “A necessidade de horas extras nessas áreas essenciais decorre do déficit de funcionários por morte ou aposentadoria, perda agravada pela falta de reposição dos quadros ao longo dos anos pelo Governo do Estado”, diz o texto.

Em 2014, a UEPG tinha em torno de 900 servidores e hoje conta com cerca de 720. “Em média, a cada ano, a UEPG perde 50 servidores, o que aumenta a disparidade entre demanda de serviços e capacidade de atendimento. Estes argumentos e outros esclarecimentos, entre os quais a UEPG destaca a instalação de relógio-ponto para controle das jornadas de trabalho, foram encaminhados à Comissão de Política Salarial. Complementarmente, a Pró-Reitoria de Recursos Humanos reitera que, de acordo com a folha de pagamento do mês de julho, nenhum salário pago pela instituição ficou acima do teto legal.”

Com relação aos professores temporários, que chegam a representar 50% em alguns cursos, a UEPG diz também aguardar nomeação dos aprovados em concursos anteriores ou novos processos seletivos.

UEL

Universidade Estadual de Londrina (UEL) assegura que a defasagem de professores e agentes também já afeta seus serviços e ensino. Com déficit de pessoal em 30%, a universidade observa um ritmo crescente de aposentadorias. Só neste primeiro semestre de 2019, foram 263 servidores aposentados.  “De acordo com a pró-reitoria de Recursos Humanos (PRORH) da UEL, nos últimos 10 anos, não vem ocorrendo a reposição do quadro funcional efetivo no mesmo ritmo em que ocorrem os desligamentos, por causa do atraso na nomeação dos servidores. Alguns processos tramitam durante anos até sua conclusão, o que acarreta prejuízo para a instituição e para a comunidade de Londrina e região”, diz a instituição.

Para a manutenção dos serviços – que incluem, entre outros, o Hospital Universitário (HU/UEL), o Hospital Veterinário (HV), a Clínica Odontológica Universitária (COU), a Casa de Cultura e o Museu Histórico – a UEL supre a falta de servidores “com o pagamento de horas extras, previstas no orçamento anual da instituição, e com limites estabelecidos e que não são ampliados desde 2017”.

De acordo com a universidade, para evitar a interrupção das aulas em 53 cursos de graduação, é feita a contratação de docentes em regime especial (CRES), isto é, a contratação temporária. “Para suprir a demanda de horas/aulas em 2019, foram solicitadas 17.008 horas, sendo que, deste total, apenas 8.366 foram autorizadas pelo Estado”, esclarece.

“Se ficarmos na faixa de 8 mil horas liberadas será insuficiente para manter a demanda do ensino para o segundo semestre”, avalia o pró-reitor de Recursos Humanos da UEL, Itamar Nascimento. Segundo ele, para manter os serviços que a UEL realiza, é imprescindível a contratação das horas extras e a liberação da carga horária para os temporários. A solução viria com a contratação efetiva dos profissionais para suprir o déficit de pessoal.

 Déficit de pessoal na UEL chega a 30%. Fonte: UEL

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