Creches conveniadas não recebem da Prefeitura de Curitiba há três meses

Sem apoio financeiro prometido, instituições comunitárias temem fechar as portas e demitir funcionários

Responsáveis pelo atendimento de nove mil crianças entre zero e três anos, os 96 Centros Comunitários de Educação Infantil (CEIs) conveniados com a Prefeitura de Curitiba estão desde o início da pandemia sem receber auxílio para despesas ou mesmo para a diferença no pagamento de funcionários, prometido pelo Executivo. Com os contratos suspensos, muitos temem fechar as portas e demitir trabalhadores, que somam dois mil profissionais.

O repasse prometido por Rafael Greca (DEM) não vem desde 10 abril, afirmam as entidades. O anunciado era pagar a diferença dos vencimentos dos funcionários afastados pela lei federal. “Foi pago uma semana do salário de abril, depois disso, nem mais um real. Estamos fazendo milagres e empréstimos bancários, mas algumas instituições já precisaram demitir ou atrasaram pagamentos”, conta o pedagogo e conselheiro municipal da Educação, Marcelo Cruz. Ele é presidente da Associação dos Centros Comunitários de Educação Infantil e Serviços Socioeducativos (ACCEIS).

Cruz recorda que as aulas foram suspensas em 20 de março e que um decreto municipal pagou 80% do repasse às instituições apenas até 10 de abril. Depois, a Prefeitura tratou de aprovar uma lei para suspender os contratos com as escolas conveniadas.

“A ideia da suspensão iniciou por empresas prestadoras de serviço que cediam mão de obra para prédios públicos, mas são empresas particulares que passam por uma licitação e oferecem serviço. Nas creches comunitárias, o atendimento é feito em nossos prédios, então a lógica tem que ser outra.”

O pedagogo destaca que, mesmo não tendo crianças nas escolas, os Centros de Educação Infantil mantêm suas despesas, como água, luz, telefone, aluguel, manutenção dos espaços. “E nesta lei ninguém previu um artigo que cobrisse isso. Desta forma, o passivo se acumula e muitas temem ter que encerrar os serviços, como aconteceu com 12 delas no fim do ano passado.”

Dificuldades desde 2019

O repasse para as creches conveniadas foi modificado no edital de 2019, quando o valor passou a ser pago por crianças e por dias letivos, não mais mensalmente. “Em janeiro não tivemos as matrículas completas, pois foram organizadas pela Secretaria, e não houve pagamento de contrato. Em fevereiro ficamos só com as já atendidas em 2019, portanto, com repasse parcial. Porém, com todo o quadro de funcionários disponível para atendimento das matrículas, que ficaram reduzidas até 20 março, quando houve a paralisação do atendimento por conta da pandemia.”

A suspensão dos contratos com os CEIs foi aprovada na Câmara Municipal em maio, com data de 1 de junho a 1 de agosto, podendo ser prorrogada. “Mas só recebemos o documento em julho, tendo que assinar a suspensão retroativa”, conta o presidente da Associação.

Comtiba

Nesta semana, durante a última reunião do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (Comtiba), houve discussão e deliberação sobre o tema. “Precisamos de recursos para os projetos sociais aprovados pelo Comtiba e de atendimento à criança”, avalia o o conselheiro Patrick Reason, do Grupo de Trabalho Comtiba Covid.

Ele também é secretário do Movimento Nacional Pró-Convivência Familiar e Comunitária. “É inexplicável esse olhar rígido e cínico ao cenário atual para o financiamento destas instituições, como se estivessem se aproveitando, mas estamos falando de sobrevivência e entidades sociais. Não são números, são nomes.”

Reason destaca que, para muitas famílias, as creches são referência na procura por apoio e orientação. “Temos um exército de funcionários com vínculos, conhecimento e confiança destas famílias, muitas em vulnerabilidade. E estas instituições precisam lutar para sobreviver em vez de usar este grupo de profissionais para investir no atendimento ao público vulnerável neste momento.”

Rede de apoio prejudicada

Das 96 instituições credenciadas, 61 são comunitárias (sem fins lucrativos) e 35 são particulares. “Estamos com dificuldade de nos mantermos conectados com nossos alunos e suas famílias, o que pode gerar problemas no apoio social”, reforça Cruz.

“Quando a criança vem pra escola com dificuldades ou machucada, fazemos a denúncia e o acompanhamento. Mas se ela não vem pra escola, não temos como notificar, o que acaba gerando uma subnotificação nos casos de violência doméstica.”

A solução seria a Prefeitura disponibilizar contato virtual ou esporádico com estas famílias para “sentirem que o atendimento está acontecendo e a rede de proteção está ativa para qualquer situação”.

Prefeitura alega falta de documentos

A Secretaria de Educação de Curitiba reforçou que os contratos foram apenas suspensos, não cancelados; adequados temporariamente para que os funcionários possam receber também os valores do governo federal.

Sobre o não pagamento prometido, a Secretaria sustenta que ele está acontecendo desde março e que, se há demora, é por falta de documento não anexado ao processo.

“Estamos esperando desde abril e só em 22 de junho pediram as notas fiscais da prestação de serviço referentes a abril e maio. Ainda estão analisando as planilhas, sem previsão de pagamento destes atrasados. Sobre junho nem pediram ainda. Como podem dizer que haviam pago”, questiona Cruz.

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