Li recentemente um livro do filósofo Thomas Nagel, chamado “Uma breve introdução à filosofia”. E o subtítulo diz: “para aqueles que não conhecem nada sobre o assunto”. Trata-se de um pequeno volume com brevíssimos capítulos que abordam coisas fundamentais como “o significado das palavras”, o “certo e o errado”, o “livre arbítrio” e o indefectível “O significado da vida”. Mais interessante é que o autor, um dos nomes importantes da Filosofia Contemporânea, não responde a nenhuma dessas questões. Daí o caráter de “introdução” do livro: ele ensina como podemos começar a pensar sobre esses temas, principalmente aqueles que nunca pensaram em pensar sobre isso.
Tenho a convicção de que iniciativas como essa deveriam inundar nossas escolas. Cada professor, em sua especialidade, deveria fazer uma lista dos temas sobre os quais os jovens poderiam começar a pensar e como fazer isso de maneira consequente, primeiro com alguma ajuda e depois por conta própria, avançando o quanto seu interesse assim o quiser e sua inteligência permitir. Ou seja: a escola, na minha percepção, deveria ser um festival permanente de questões com o propósito inicial de surpreender os jovens e depois convida-los a pensar sobre elas. Não necessariamente para encontrar uma resposta, mas para inventar respostas plausíveis para essas questões, que os inclua e que importe a eles. E que nos implique a todos nelas.
Na Grécia democrática, o fundamento da igualdade que permeava a todos os participantes do espaço público era a voz. Todo mundo podia falar e ser ouvido. O discurso era o instrumento para que o cidadão aparecesse diante dos outros com as suas ideias e, assim, ganhar ou não notoriedade. O julgamento, em um ambiente no qual todos podem falar e se fazer ouvir, isto é, são livres e iguais, implica um grau de discernimento bem elevado. O que sofisticava os julgamentos e qualificava as decisões. E esse discernimento é desenvolvido por meio da experiência mesma do diálogo e do debate. Não há um aprendizado teórico capaz de, sozinho, preparar alguém a fazer algo bem. Ajuda, é evidente – daí muitos cidadãos contratarem intelectuais para ensina-los sobre o bem falar e sobre o bom dizer – mas não é suficiente. Agora, no embate de ideias do dia a dia, o condicionamento é muito mais extenso e eficaz.
Essa foi a lição dos gregos: a Filosofia era a arte do bem viver, forjada e praticada no exercício cotidiano da relação plural entre iguais. E essa é a lição esquecida das nossas escolas. Daí, especulo, o triste cenário de uma juventude angustiada com o mundo que a cerca. E a angústia, como sabemos, é o sentimento doído da falta das palavras, da falta de significação das coisas. Falta que pode ser suprida pelo questionamento, pela problematização, pela coragem de começar a perguntar sobre as origens dessa falta que perturba e anuvia tudo. Não há garantia de solução, mas sim, de crescimento e maturidade.
No capítulo sobre o “significado das palavras”, Thomas Nagel diz: é importante, sem dúvida, o fato de que a linguagem seja um fenômeno social. Não é algo que cada pessoa inventa para si mesma (…). Somos pequenas criaturas finitas, mas o significado nos permite, com a ajuda de sons ou marcas no papel, entender o mundo inteiro e as muitas coisas que há nele.
No entanto, penso eu, não estamos conseguindo colaborar com as novas gerações a entender de forma mais ampla e complexa, e uma das razões é a de pensarmos que devemos ensinar as coisas prontas para os jovens ao invés de associarmo-nos com eles no questionamento daquilo que os cerca, aproveitando da linguagem comum que partilhamos, construindo algo juntos à partir de nosso encontro de adultos e de jovens, reconhecendo que somos iguais em nossas capacidades e livres em nossos desejos de conviver em um mundo comum. Um mundo democrático.