Tarifa técnica do ônibus chegou a R$ 8,11 com o fim do regime emergencial. É um problemão

Preço da tarifa técnica ultrapassou os R$ 8 em julho e agosto. Para reequilibrar gastos, prefeitura vai voltar a pedir prorrogação do regime

Cada passageiro que entra em um terminal, estação tubo ou ônibus do transporte coletivo de Curitiba paga R$ 4,50 à prefeitura. A prefeitura, por sua vez, paga R$ 8,11 às empresas concessionárias a cada girada de catraca. É uma conta que está longe de fechar e que decorre do terremoto que a covid-19 causou no já combalido caixa do sistema de transporte da cidade.

A indecisão do município diante do fim do regime emergencial do transporte coletivo de Curitiba elevou o aporte público no sistema. Nos últimos dois meses, foram pelo menos R$ 30 milhões a mais de contrapartida para manter em operação a rede, que voltou a funcionar com base em passageiros pagantes. A mudança alterou o valor da tarifa técnica, que, de R$ 5,30 antes da pandemia, agora passou para R$ 8,11. Esse é o valor que a prefeitura paga às empresas de transporte por cada passagem.

O salto nos valores tem a ver com a retomada dos custos “normais” do sistema de transporte, que passaram de aproximadamente R$ 54,9 milhões, durante a validade do acordo emergencial feito com as operadoras no início da pandemia, para R$ 67,2 milhões em julho e 72,9 milhões em agosto – uma pressão de custos avaliada pela prefeitura como “importante” e que fará o prefeito Rafael Greca (DEM) recorrer ao Legislativo para pedir postergação da lei emergencial que flexibilizou a forma do repasse feito às empresas.

Segundo a Urbs, gestora do transporte de Curitiba, o novo projeto de lei “terá validade enquanto durar o regime de emergência em saúde e não mais com uma data específica, como nos anteriores”. A mensagem deve chegar à Câmara nos próximos dias, com atraso suficiente para impactar o caixa do município. O órgão não disse, contudo, se haverá outras mudanças em relação ao que já vinha sendo praticado, pois o texto ainda está em elaboração.

Regime emergencial

Desenhado para equilibrar os custos operacionais em um período de queda no número de passageiros, o regime emergencial do transporte passou a valer em 16 de março de 2020 e acabou no dia 30 de junho deste ano, após duas prorrogações autorizadas pelos vereadores. De forma geral, o acordo suspendeu a ordem oficial de pagamento das empresas, que, de passageiro pagante, passou a ser por quilômetro rodado, além de retirar da planilha de custos itens como rentabilidade e amortização das parcelas de novos ônibus comprados. Ainda em junho, a expectativa era de uma renovação imediata do projeto, o que não ocorreu. E no impasse entre prorrogar e não prorrogar, Curitiba pagou mais caro dentro das condições previstas.

O fim da modalidade de repasses excepcional implicou na mudança automática do cálculo da remuneração feita às empresas, que voltou a ser atrelado ao número de passageiros – encolhido em mais da metade por causa da pandemia. Assim, o encarecimento e a volta da cobrança de itens de custeio específicos, por um lado, e a redução da massa pagante, por outro, resultaram no aumento da tarifa técnica – valor real pago por cada usuário às operadoras do sistema – e, consequentemente, na expansão do aporte público necessário para complementar os R$ 4,50 pagos por embarcado.

É que, hoje, a tarifa técnica do sistema de transporte de Curitiba já supera em 53% os R$ 5,30 válidos imediatamente antes do início da crise sanitária, batendo os R$ 8,02 por passageiro em julho e R$ 8,11, em agosto, conforme a própria Urbs. Isso fez com que, em relação aos custos totais, a injeção de dinheiro público no sistema crescesse consideravelmente com a volta ao antigo modelo de repasse.

Na comparação com o valor aproximado de R$ 54,9 milhões pagos às empresas durante a vigência do regime emergencial, considerando receita mensal de passagens em torno de R$ 30 milhões, a contrapartida municipal foi cerca de R$ 13 milhões maior em julho, quando o custo do sistema foi de R$ 67,2 milhões, e R$ 18 milhões a mais em agosto, que fechou o mês com despesas totais na casa dos R$ 72,9 milhões. A soma aportada cresce ainda mais se analisada diante da receita tarifária menor, que em junho foi de R$ 28 milhões, e agosto, apenas R$ 24,5 milhões.

Prejuízo

A prefeitura, no entanto, nega ter arcado com o prejuízo sozinha. Segundo a Urbs, nos meses de julho e agosto não houve aporte do município de Curitiba para fechar os cálculos do sistema porque a diferença foi preenchida com recursos destinados pelo governo do estado. As verbas fazem parte da ajuda de custo do Executivo com a integração do transporte metropolitano e vieram após meses de apelação da gestão do prefeito Rafael Greca.

“A integração quem paga hoje é o município de Curitiba. Nós, inclusive, fazemos esse pedido ao governo do estado, para que possamos continuar com a integração do sistema de transporte que é referência mundial, e que também tenhamos mais ônibus à população, que aporte os recursos”, defendeu o presidente da Urbs, Ogeny Pedro Maia Neto, em audiência pública realizada na Câmara Municipal no início de junho – semanas antes do fim do regime emergencial.

A reportagem tentou entrevista com o presidente da Urbs, mas ele só se colocou à disposição para falar depois que o novo projeto de lei foi enviado aos vereadores. No entanto, às vésperas do fim da vigência da lei, a prefeitura chegou a afirmar que ainda não havia decisão entre os gestores do transporte se o regime seria prorrogado ou finalizado por completo.

Queda no número de passageiros

A lei do regime emergencial do transporte deixou de valer praticamente ao mesmo tempo em que o município flexibilizou as regras de proteção contra a Covid-19 de acordo com o nível mais baixo do protocolo, a bandeira amarela, em 7 de julho. A classificação amplia a circulação de pessoas nas ruas e, em tese, poderia fazer crescer a procura pelo transporte coletivo, que tem tido aumentos significativos, mas ainda não suficientes. Em julho, por exemplo, a média de passageiros por dia registrada pela Urbs foi cerca de 310 mil. Desde o início da pandemia, o maior número atingido havia sido 300 mil em fevereiro deste ano, caindo para 228 mil logo depois, em março, quando a capital paranaense voltava a ser atingida por uma nova e mais letal onda de Covid-19.

A defesa da Urbs é que o transporte coletivo não está relacionado com a alta de casos na cidade. “Não existe relação direta entre o número de passageiros de ônibus e de contágio da doença. O índice de contaminação de passageiros é inferior a 0,1%”, afirmou Maia Neto na audiência da Câmara, segundo ele, com base em estudos conduzidos com a participação de infectologistas da Secretaria Municipal da Saúde (SMS) e de técnicos da Urbs.

Mas mesmo o aporte feito pelo estado e a retomada gradual de usuários não conseguiram manter a normalidade na transferência das verbas às operadoras. No dia 24 de agosto, trabalhadores de duas das empresas do sistema aprovaram indicativo de greve por atraso nos pagamentos dos vales a motoristas e cobradores, o que o Sindicato das Empresas de Ônibus de Curitiba (Setransp) informou, à época, ser consequência no atraso nos repasses Urbs.

Questionada se enfrenta dificuldades financeiras para manter os repasses em dia, a Urbs afirmou, por nota, que “há uma pressão de custos importante”, motivo pelo qual vai pedir aos vereadores a renovação do regime emergencial. “Houve uma redução do movimento com a pandemia (atualmente, mesmo com as medidas de flexibilização, o movimento está 45% menor do que antes da covid-19), mas há uma necessidade de manter a frota a 100% nos horários de pico para manter o protocolo de distanciamento”, explicou o órgão.

A redução na frota circulante ajuda a explicar o motivo pelo qual, mesmo com a validade do modelo normal de pagamento, os custos do transporte da capital ainda estão menores em relação aos tempos anteriores à crise da Covid-19. Sem pandemia, os custos giravam em torno de R$ 80 milhões por mês, valor agora relativamente menor porque o total de carros de coletivos nas ruas passou de 1,2 mil para cerca de 950. A redução não é proporcional ao aporte, no entanto, porque o número de também diminui.

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3 comentários em “Tarifa técnica do ônibus chegou a R$ 8,11 com o fim do regime emergencial. É um problemão”

  1. queda no numero de passageiros vai ter mesmo. Eu até usaria mais onibus se pudesse pagar em dinheiro. a linha ao lado da minha casa só opera com cartão transporte. como eu usaria eventualmente não tenho vontade de fazer o cartão, dai acabo não usando o onibus. o sistema precisa ser mais democrártico… esses dias queria pagar com cartão de debito, tb não recebe….dai né….vou caminhando, de bicicleta, skate, ou pego uber…

  2. Esse valor de “tarifa técnica” é muito suspeito. Sai mais barato colocar três pessoas num Uber e rodar a cidade. Não faz o menor sentido. Será que precisamos de uma nova CPI o transporte público?

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