Quase mil profissionais do HC continuam sem vacina

Eles atuam em diversas áreas do hospital, como limpeza, segurança e manutenção; estudantes de Medicina também não foram imunizados

A imunização em Curitiba avança a passos lentos. Até o último dia 25, a Capital só havia vacinado 2% da população. Mesmo com um novo lote de 12.990 vacinas recebido nesta quinta-feira (11), 984 trabalhadores da Saúde do Hospital de Clínicas ainda aguardam na fila para receberem a primeira dose do imunizante. Entre eles estão profissionais administrativos, da limpeza e terceirizados. Apesar de constarem como prioridade no Plano de Vacinação da Capital, a última convocação para do grupo aconteceu em 6 de fevereiro. 

Entre os não vacinados estão 181 técnicos administrativos que trabalham presencialmente, 71 que estão em trabalho remoto e 16 que estão de licença; 382 terceirizados de diversas categorias, como eletricistas e vigilantes; além de 295 estudantes de medicina em estágio pela UFPR.

“São eles que mantêm o hospital. Eles que garantem a estrutura para tudo acontecer ali dentro”, afirma Evandro Castagna, diretor do Sindicato dos Trabalhadores em Educação das Instituições Federais de Ensino Superior do Paraná (Sinditest).

Por conta do colapso do sistema de saúde, Evandro afirma que chegará um momento que “os profissionais não vão mais suportar”. Para garantir que um paciente contaminado seja atendido adequadamente, é preciso primeiro assegurar que os servidores tenham as condições necessárias para realizar essa assistência. “Se aquele que cuida fica doente, quem vai cuidar do doente depois?”, questiona.

De acordo com o Sindicato, desde o início da pandemia, 20% das equipes do hospital foram contaminadas pelo vírus e quatro pessoas morreram. “A gente sabe que não tem vacina para todo mundo. A vacina está vindo a conta-gotas, mas a gente entende que tem que definir as prioridades e a prioridade é de quem está cuidando das pessoas.”

“Ignorados”

“É tanto uma sensação de insegurança quanto de injustiça. O hospital está se movendo, a Covid está avançando, mas a gente foi engolido. A sensação é de não estar sendo enxergado”, conta Thaís Soares, assistente administrativa do HC – hospital de referência no atendimento de Covid e segundo maior complexo de leitos para tratamento da doença no estado, com 177 vagas.

Embora Thaís atue na área administrativa do hospital, ela está em constante contato com médicos, enfermeiros e pacientes da ala Covid. Até agora, ninguém do setor da servidora foi vacinado. “O dia inteiro eu tenho contato com o pessoal das áreas médica e multiprofissional. A gente circula por corredores por onde passam pacientes Covid, nosso contato é muito próximo, embora indireto”, afirma. 

Além de sobrecarregados com a alta demanda de serviço, Thaís relata que os funcionários se sentem desprestigiados e ignorados. “As listas de vacinação da Secretaria [Municipal de Saúde] avançam e a gente está para trás, isso traz ainda mais essa sensação de ‘poxa, o que eu estou fazendo aqui?’. Porque quando batem panela não é para a gente, mas nós estamos lá também.” 

Ao questionar o órgão municipal sobre a demora da vacinação para os trabalhadores do HC, a servidora conta que o que recebe são “textos prontos ou argumentos falhos”. “Tem outras pessoas no cronograma da Secretaria que estavam para depois da gente e já estão tomando vacina.” 

No dia 19 de fevereiro, um dia antes da campanha de vacinação contra a Covid em Curitiba completar um mês, a prefeitura interrompeu a aplicação por falta de doses. Thaís relata que foi dito aos servidores que assim que o estoque de vacinas fosse reposto, as convocações voltariam a acontecer. No entanto, desde que a imunização voltou a ocorrer na Capital, em 26 de fevereiro, os profissionais do complexo não foram mais chamados. 

Lista

Em nota, o Hospital de Clínicas informou que foi encaminhada à Secretaria Municipal da Saúde (SMS), em janeiro de 2021, a lista com o nome de todos os profissionais do Complexo. “Até o momento foram convocados para vacinação cerca de 4.500 profissionais do CHC, incluindo terceirizados.”

“Mantemos constante diálogo com a SMS, a fim de acompanhar a convocação da totalidade do quadro de nossos profissionais que deve acontecer, como previsto no Plano Municipal de Vacinação. Destacamos que o interesse máximo da instituição é em preservar a saúde dos trabalhadores do Hospital.”

Subgrupos

Ao Plural, a SMS afirmou que os “trabalhadores de Saúde que atuam em Serviços de Saúde, paralelamente também estão sendo vacinados profissionais que atuam em áreas assistenciais hospitalares que tenham perdido o período da vacinação”. O órgão municipal explicou que, de acordo com o Plano de Imunização, “dentro do grupo trabalhadores de Saúde há uma divisão em subgrupos”.

Questionada sobre o motivo de tantos profissionais ainda não estarem imunizados, a Secretaria respondeu que “as doses de vacina que vem para o Município já vem com destinação definida, sendo uma parcela para trabalhadores de Saúde outra para continuidade do cronograma de vacinação de idosos. Esses grupos estão sendo imunizados concomitantemente”. Segundo a SMS, “o número de doses repassadas pelo Ministério da Saúde, destinada à imunização de trabalhadores de Saúde, ainda não foi suficiente para atender todos os subgrupos”.

Protesto

Ato simbólico em frente ao Hospital de Clínicas nesta sexta-feira (12). Foto: Sinditest

Na manhã desta sexta-feira (12), profissionais de Saúde se reuniram em frente ao Complexo Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR) para exigir uma resposta da SMS a respeito da vacinação dos trabalhadores. “É um grito de socorro. A gente está aqui. A gente existe. Não nos deixem para trás”, diz o diretor.

Foto: Reprodução/Sinditest

Por conta do grave estado da pandemia, o ato convocado pelo Sinditest não durou mais que 15 minutos. O uso de máscaras e o distanciamento mínimo de 1,5 metros foi obrigatório. 

Setor privado e a compra de vacinas

Sancionada nesta quarta-feira (10) como um possível amparo no abastecimento de vacinas, a nova Lei 14.124/2021, que permite a compra de imunizantes por Municípios, Estados e setor privado, parece que não resolverá o problema da falta de vacinas para os servidores da Saúde.

Procurada pelo Plural, a Secretaria de Saúde do Estado (Sesa) informou que o Paraná só irá considerar a compra isolada de vacinas caso a estratégia do Plano Nacional de Imunização (PNI) não funcione. “O Paraná tem R$ 200 milhões reservados caso precise fazer a compra direta. O Estado está dialogando com todos.” 

De acordo com a nova legislação, os Municípios, Estados e o setor privado poderão comprar imunizantes sem estarem vinculados ao Ministério da Saúde. “A Lei reafirmou a autonomia desses setores para a aquisição das vacinas fora do Programa Nacional de Imunização (PNI)”, explica a advogada especialista em Direito Médico e à Saúde, e presidente da Comissão de Direito à Saúde da OAB/PR, Renata Farah.

Além das vacinas aprovadas com o registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a Lei também autorizou a importação de imunizantes certificados apenas pelas autoridades sanitárias dos países em que foram produzidos, sem necessidade do aval da agência brasileira. Nesse caso, porém, as vacinas precisam ter estudos clínicos de fase 3 – pesquisas em humanos – concluídos ou com resultados provisórios.

Para Renata, a nova Lei “amplia o poder público através dos Estados e dos Municípios para que, de forma complementar, auxiliem o cumprimento do PNI, oferecendo mais quantidade de vacina e acelerando a imunização coletiva”.

Números da vacinação

De acordo com dados da Secretaria Estadual de Saúde desta sexta-feira (12), o Paraná registrou 458.954 pessoas vacinadas contra a Covid-19. Foram aplicadas 458.954 da primeira dose e 154.134 da segunda.

Em Curitiba, até a última quinta-feira (11), foram imunizadas 98.840 pessoas com a primeira dose da vacina. Desses, 47.123 são idosos, 45.949 são profissionais dos serviços de Saúde, 5.695 são moradores, funcionários e cuidadores de instituições de longa permanência e 73 são indígenas.

Até agora, 38.975 pessoas receberam a segunda dose da vacina na cidade. Os dados são da Secretaria Municipal da Saúde.

Colaborou: Maria Cecília Zarpelon

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