Quando a Covid-19 dá lugar a outras doenças

Problemas nos nervos, na pele, na memória e no psicológico são algumas sequelas do coronavírus

Profissionalmente, 2020 foi o melhor ano da vida do professor Robert Gessner Jr., de 31 anos. Ele dá aulas de Química e foi convidado pela Secretaria de Educação do Paraná (Seed) para gravar o programa Aula Paraná, transmitido para todo o Estado. Estava feliz da vida.

Em dezembro, ele teve uma nova surpresa, desta vez não tão positiva: foi contaminado pela Covid-19. Ele era hipertenso, pré-diabético e obeso. Pesava 142 quilos e acabou perdendo 32 na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Foi mais de um mês de internação.

“A desconfiança é que eu tenha pego do avô da minha noiva, no finalzinho do ano. Primeiro senti um cansaço, dor atrás dos olhos e indisposição. Acabou evoluindo pra febre e, no dia 21 de dezembro, acordei com falta de ar. Estava com uma saturação de 82%. Fui direto para o hospital”, rememora.

Uma tomografia constatou que Robert estava com mais de 50% do pulmão comprometido, então ele foi internado. “Fiquei na enfermaria, com a máscara de oxigênio, mas não melhorei e fui para a UTI. No dia 23 de dezembro, fui intubado. Antes, liguei pra minha família, pro meu pai, pra minha noiva, dei tchau pra eles, foi um momento bem doloroso. Depois que desliguei, nem sei o que estava sentindo, mas a pergunta que fiz para o enfermeiro foi se a gente sonhava quando estava sedado. Ele não sabia, mas disse que me perguntaria quando eu acordasse.”

O professor ficou 16 dias intubado e não melhorou. A família recebeu notícias bem ruins ao longo do processo. “Fui para o último recurso, a ecmo, uma máquina que faria o trabalho artificial do meu pulmão, onde fiquei sete dias. Tive hemorragia e tiveram que me tirar, a minha pupila não reagia, foi um momento bem complicado, mas conseguiram me estabilizar.”

No dia 8 de janeiro, Robert acordou da sedação. “Eu sou muito família, passei as festas sem eles, foi um susto. Fizemos a primeira videochamada nesse dia. A minha irmã gravou e até hoje eu assisto e choro muito. Acordei sem mobilidade alguma, foi difícil. Mas desde que acordei, as coisas foram evoluindo. O enfermeiro perguntou se eu tinha sonhado e eu disse que sim.”

Aos poucos, com a Fisioterapia, ele foi se movimentando e ganhando um pouco mais de força nos braços e pernas. No dia 26 de janeiro, 36 dias depois da internação, finalmente teve alta. “Foi, pra mim, uma das melhores coisas do mundo. Ainda estava bastante debilitado, precisava do auxílio da cadeira de rodas, depois passei pro andador e aos poucos fui me liberando. Agora, dois meses depois, consigo andar, mas com dificuldade. Faço Fisioterapia duas a três vezes na semana.”

O susto passou, mas as sequelas não foram poucas. “Já estou quase careca, minha mão esquerda não funciona, o pé esquerdo ainda está bem atrofiado e acabei adquirindo a síndrome de guillain-barré, que é uma doença nos nervos. Se tudo der certo, com bastante Fisioterapia e empenho, vou melhorar. Talvez não 100%, mas se eu puder voltar a fazer o que eu amo, que é ser professor, está ótimo. Já estou feliz só de estar aqui contando a minha história.”

O professor segue em recuperação. Foto: arquivo pessoal

Bolhas pelo corpo

Amanda Silva lamenta as dificuldades que sua mãe passou após a Covid-19. Cleusa Silva tinha 59 anos e era uma mulher saudável, mas a doença acarretou em várias sequelas e uma perda considerável de autoestima. Elas preferem não ser identificadas; os nomes usados são fictícios.

“A minha mãe é funcionária pública da área da saúde e não deixou de trabalhar no começo da pandemia. Em julho do ano passado, ela quis visitar a minha avó no interior e fez o exame antes da viagem, só pra viajar com a consciência tranquila. Ela não tinha sintomas, mas deu positivo”, afirma. Cleusa não sabe onde contraiu o vírus. O hospital onde trabalhava não atendia pacientes Covid, mas ela andava de ônibus diariamente para chegar até lá.

“A partir do 9º dia após o teste, começaram a nascer bolhas no peito, nos braços e nas costas dela, foi uma dor insuportável. Chegamos a levá-la várias vezes ao hospital, mas ela não precisou ser internada. Os médicos disseram que o vírus não foi para o pulmão, foi para os nervos.”

Por causa das sequelas, Cleusa ficou afastada do trabalho até janeiro deste ano, quando completou 60 anos e pediu um novo afastamento, agora pela idade. “Ela nunca teve doença nenhuma, não era do grupo de risco, era uma mulher saudável, que come bem, faz exercício, tem uma pele de dar inveja… Pegou Covid e desenvolveu a herpes-zóster e mais 5 CIDs da Psiquiatria, que está tratando até hoje. Ela gastou mais de R$ 2 mil na farmácia. Usava medicamentos, o corpo não reagia e trocava. Virou uma ratinha de laboratório.”

O laudo de Cleusa. Foto: arquivo pessoal

Memória falha 

“A gente estava em isolamento em casa, porque sou hipertensa e estava com muito medo. Mas acabou que, em julho do ano passado, teve alguma comemoração e o pai da minha filha insistiu pra ela ir. Quando ela retornou, dias depois, começou a ter sintomas”, relembra a advogada Graziela Engelhardt, de 40 anos.

“Como ela tem enxaqueca e sinusite, achei que pudesse ser isso, porque era muito forte a dor de cabeça. Foram uns três dias com uma dor insuportável, ela chegou a me pedir para ir ao hospital. Eu não quis levar, mas me arrependo, porque ela chorava de dor… Depois dela, comecei a ter sintomas. Foi quando veio a notícia de que o pai dela tinha sido internado”, fala. Ambas fizeram o teste para Covid e deu positivo.

Graziela teve dor de cabeça, diarreia e perdeu olfato e paladar. Só voltou a sentir cheiros meses depois, em novembro. “Após os 15 dias de isolamento, fiz uma tomografia e deu uma leve pneumonia. Tomei o antibiótico e fui fazer um check-up. Deu uma alteração no coração que não se sabe do quê. Comecei a ter um tipo de arritmia.”

A alteração no coração não foi a única sequela. A advogada diz que sua memória está péssima. “Eu esqueço o horário da psicóloga, que é sempre no mesmo dia da semana. Já jurei que fiz uma coisa, fiquei esperando o resultado e nem tinha feito. Fiz todo o processo e não terminei. Esqueço nomes, palavras… Agora eu uso duas agendas, senão eu esqueço de tudo. Marquei um neurologista, mas precisei desmarcar por causa da segunda onda.”

Sua filha tem 14 anos, mas também ficou marcada pela Covid-19. “Agora ela tem dores nas juntas e crises de ansiedade muito grandes.”

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2 comentários em “Quando a Covid-19 dá lugar a outras doenças”

  1. Eu e meu esposo e tbm minhas duas filhas tbm testamos positivo para covid 19 felizmente tivemos sintomas considerados leves, mas o suficiente para saber o quanto esse vírus é cruel, tivemos momentos de desespero, eu e minha filha de 22 anos que sentimos mais, é tbm ficamos com dificuldade para dormir e nosso psicológico foi bastante afetado, durmo muito pouco acho que umas 3 horas por noite, estou me sentindo péssima, espero nunca mais ter que passar por isso, esse vírus é maldito.

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